Jairo Bouer Publicado em 14/10/2019, às 16h50 - Atualizado às 23h53
Relatório apresentado pelo Ministério da Saúde nesta sexta-feira (1°), Dia Mundial de Luta contra a Aids, mostra que o número de mortes pela doença no último ano diminuiu em relação a 2015, graças à ampliação de testagens e do acesso ao tratamento. A notícia, sem dúvida, é boa, mas pode passar uma falsa sensação de segurança para determinados grupos para os quais a transmissão ainda aumenta.
Ao se levar em conta um período maior, os dados mostram que a infecção continua a crescer entre os mais jovens: a taxa de detecção quase triplicou entre garotos de 15 a 19 anos, passando de 2,4 casos por 100 mil habitantes, em 2006, para 6,7 casos, em 2016. Na faixa de 20 a 24 anos, a taxa dobrou (de 16 para 34 casos por 100 mil habitantes). Já entre as garotas, a elevação foi menor, e observada apenas entre as de 15 a 19 anos, de 3,6 para 4,1 casos. São jovens que terão de tomar remédios e adotar certos cuidados com a saúde pelo resto da vida.
Outra tendência de aumento que chama a atenção é a taxa em mulheres com mais de 60 anos: o número passou de 5,6 para 6,4 infecções por 100 mil habitantes. Apesar de discreta, essa elevação, somada àquela observada entre os mais jovens, indica que o uso da camisinha tem sido negligenciado principalmente nos extremos da população.
Como tem sido observado há alguns anos, e não só no Brasil, a forma de transmissão que mais tem crescido é entre homens que fazem sexo com homens. É bom lembrar sempre que esse grupo não envolve apenas homo e bissexuais, por isso as mulheres não podem abrir mão dos cuidados.
Claro que existem resultados a serem celebrados. O Ministério da Saúde escolheu a cidade de Curitiba para a divulgação do boletim porque esse foi o primeiro município brasileiro a ter eliminado a transmissão vertical – de mãe para filho – da Aids, graças aos esforços de ampliação de testagem e oferta de tratamento às gestantes. Vamos torcer para que o mesmo aconteça no resto do país.
De acordo com o levantamento, hoje existem 830 mil pessoas com HIV no país, sendo que 84% já foram diagnosticadas; 72% estão em tratamento antirretroviral; e, destas, 91% já têm carga viral indetectável. Ainda é preciso esforço para que o país alcance as metas estipuladas pelo Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/Aids, que é de 90% para todos os critérios.
A oferta do chamado tratamento pós-exposição ao HIV (PEP) aumentou cinco vezes desde 2009, alcançando um total de 57.714 medicamentos distribuídos em 2016. Mas certamente há um número bem mais alto de pessoas que poderiam se beneficiar dessa possibilidade – muita gente nem sabe que ela está disponível e que pode evitar a infecção após uma exposição acidental ou involuntária ao vírus.
Já a oferta da profilaxia pré-exposição (PrEP), isto é, o tratamento preventivo diário para populações vulneráveis, como casais sorodiscordantes ou profissionais do sexo, por exemplo, ainda aumenta gradativamente. Em 2017, 35 serviços em 22 municípios receberão o medicamento e outros 16 Estados entrarão na lista no ano que vem.
Só na cidade de Nova York, nos Estados Unidos, por exemplo, a PrEP teve um aumento de 1.000% nos últimos dois anos, segundo os Centros para Prevenção e Controle de Doenças (CDC). E, mesmo assim, as autoridades de saúde avaliam que apenas 10% da população que poderia se beneficiar da medida segue o tratamento. Este ano algumas novidades foram anunciadas, como a divulgação de estudos que atestam a segurança da prevenção com antirretrovirais para os adolescentes. E um estudo clínico grande, patrocinado pelos Institutos Nacionais de Saúde, vai testar a eficácia de uma injeção que evitaria o HIV por um período de oito semanas – uma estratégia de tratamento mais simples e discreta. Mas nenhuma dessas medidas diminui a importância da camisinha, uma estratégia de fácil acesso, barata e eficaz para evitar não só a Aids, como outras doenças que têm se tornado muito frequentes, como a sífilis e a gonorreia.