Médica ajuda a esclarecer dúvidas sobre a doença comuns a mulheres e profissionais de saúde
Anderson José Publicado em 12/04/2022, às 10h00
Anualmente, o Brasil registra cerca de 16 mil novos casos de câncer de colo de útero por ano e o estado do Amazonas, no norte do país, tem uma taxa estimada de 40,18 casos para cada 100 mil mulheres, ou seja, bem acima da média nacional que é de 15,38 de acordo com os dados do Instituto Nacional do Câncer (Inca).
Apesar da difusão de informações, algumas dúvidas ainda pairam sobre o câncer de colo de útero, principalmente quando se fala em fatores de risco e prevenção. A ginecologista Claudia Barbosa Salomão, vice-presidente da Associação Brasileira de Obstetrícia e Ginecologia da Infância e Adolescência (SOGIA-BR), tirou algumas dúvidas que são recorrentes entre mulheres e até profissionais da área da saúde.
Além do HPV, existem outras Infecções Sexualmente Transmissíveis (ISTs) que são fatores de risco para o desenvolvimento de câncer de colo uterino?
"A única IST capaz de causar câncer diretamente é a infecção pelo Papilomavírus Humano, o HPV. Porém, existem outras infecções sexualmente transmissíveis que diminuem a imunidade desse colo e fazem com que o órgão fique mais propício à infecção pelo HPV e também ao desenvolvimento dessas lesões precursoras de câncer. A clamídia, por exemplo, além de outros agentes bacterianos e virais, alteram a imunidade local – também sistêmica – da mulher e, consequentemente, do colo uterino.
É importante ressaltar que grande parte das mulheres, quando inicia sua vida sexual, pode ter o HPV no colo uterino. No entanto, essa infecção primária, geralmente, é transitória e através do próprio sistema imune da mulher essa infecção desaparece. Por isso não é indicado a coleta de material/PCCU imediatamente após a paciente ter relações sexuais porque pode haver um diagnóstico equivocado com tratamento desnecessário, já que essa paciente muito jovem e imunocompetente seria capaz de “erradicar” o HPV de seu organismo. Isso não incorre em negligência no rastreio de câncer de colo uterino devido à idade da paciente, tendo em vista a epidemiologia da doença", responde a médica.
Pela definição do dicionário a palavra rastrear significa, entre outras coisas, acompanhar ou perseguir pistas ou rastros; investigar ou inquirir; fazer investigações. De certa forma, isso se aplica aos exames de rastreamento realizados na atenção primária. Então, rastreamento, no contexto de saúde, significa prever – ou diagnosticar precocemente – a existência de doenças em pacientes assintomáticos. No caso do rastreio de câncer uterino, o exame realizado é o preventivo também chamado de papanicolau ou PCCU e é bastante importante que mulheres que já iniciaram a vida sexual consultem um ginecologista para prevenir possíveis lesões e antever diagnósticos.
O rastreamento para câncer de colo de útero começa a partir de qual idade? Em quais situações ele está indicado?
“O Papanicolau detecta lesões pré-cancerígenas e, por isso, é um exame de prevenção. Esse exame é realizado, segundo os critérios do Inca, em mulheres entre 25 e 64 anos, mas o Colégio Americano de Obstetras e Ginecologistas indica-o a partir dos 21 anos após o início da vida sexual.
Porém, essas indicações são feitas de modo geral à população, mas orientar a realização do exame também parte do bom senso do profissional médico. Imagine uma situação em que uma paciente adolescente de 16 anos, por exemplo, iniciou a vida sexual aos 12 anos de idade, não usa camisinha e tem múltiplos parceiros. O médico não precisa esperar que ela entre na idade de recomendação das diretrizes, mas sim deve ter bom senso de individualizar o atendimento a essa menina, dado o histórico dela. Então, pode-se antecipar o Papanicolau em certas situações. No entanto, a priori, seguem-se os critérios do Inca”, responde Claudia.
Algumas mulheres se queixam de dor durante o ato sexual e algumas até relatam que têm a impressão de que esse incomodo seja causado pelo contato do pênis com a entrada do útero. Esse contato mecânico (trauma) pode aumentar o risco de desenvolvimento de lesões cancerígenas?
"A dor durante o ato sexual chama-se 'dispareunia' e pode ser causada por inúmeras variáveis desde infecções a fatores de ordem emocional. O trauma da relação sexual não é um fator colaborador da gênese do câncer de colo uterino, além do que o pênis toca o colo, mas não penetra o útero. É muito mais considerável um trauma crônico no colo uterino devido a uma IST que pode alterar a imunidade daquele colo por uma lesão/ferida e torná-lo mais propício a qualquer outra infecção, inclusive o HPV. Mas o trauma, ou melhor, o contato peniano com o colo uterino, por si só, não é um fator que aumenta o risco de aparecimento de lesões neoplásicas. Não é a relação sexual a causa do câncer de colo uterino, mas sim agentes infecciosos e isso você previne utilizando preservativo", esclarece a médica.
- HPV;
- Múltiplas ISTs, por alterarem a imunidade do útero;
- Relação com múltiplos parceiros sem o uso de camisinha;
- Início da vida sexual de maneira precoce;
- Tabagismo.
O tabaco possui mais de 60 substâncias consideradas cancerígenas. Entre elas está um composto chamado de nitrosamina que é altamente cancerígeno, além da nicotina. Em alguns estudos sobre o desenvolvimento de neoplasias, os pesquisadores chegaram à conclusão de que a nicotina – presente no cigarro – possui propriedades de angiogênese (formação de vasos sanguíneos) e isso favorece a proliferação de células cancerosas. Então, no caso do câncer de colo uterino, a nicotina do cigarro somada a presença do HPV encontra o ambiente ideal para o crescimento desordenado de células instalando uma neoplasia na região.
No Brasil, desde março de 2014 o Ministério da Saúde oferece gratuitamente a vacinação contra o HPV.
A vacina é liberada para meninas e mulheres entre 9 e 45 anos e meninos entre 11 e 14 anos e tem como principal objetivo prevenir a infecção contra o HPV. Esse vírus, como dito anteriormente, está associado ao desenvolvimento de câncer de colo do útero, vagina e vulva em mulheres, do pênis em homens e câncer de canal anal em ambos os sexos.
Porque eles funcionam como vetores transmissores da doença para as meninas já que, na grande maioria dos casos, homens infectados com HPV são assintomáticos. Além disso, essa vacina também protege os meninos contra câncer de orofaringe, ânus e pênis.
De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), um país que consiga até 80% de cobertura vacinal consegue erradicar o câncer de colo uterino em seu território. No Brasil, menos de 50% do público-alvo foi vacinado até hoje e isso é um risco não apenas para a saúde individual de cada um, mas também um problema de saúde pública.
Há dois tipos de vacina contra HPV no Brasil:
HPV4: Contém partículas semelhantes aos vírus dos tipos 6, 11, 16 e 18 e é aplicada em mulheres de 9 a 45 anos e homens de 9 a 26 anos.
HPV2: Contém partículas semelhantes aos tipos 16 e 18 e pode ser aplicada em todas as mulheres com mais de 9 anos.
À luz do conhecimento atual, a vacina do HPV é oferecida no SUS em duas doses, e o intervalo entre elas é de 6 meses. Esse esquema pode ser usado para pacientes menores de 15 anos por conta de seu sistema imune, mas para aquelas acima de 15 anos são indicadas 2 ou 3 doses de vacina.
* Texto atualizado às 17h50
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