“Me lembro que na época estranhei, paguei caro por um comprimido, o qual nem como utilizar eu sabia (tinha meus 18 para 19 anos). Após alguns minutos, comecei a sentir a ereção, mantive a relação sexual por alguns minutos e logo já tive um orgasmo com ejaculação.”
O relato acima é de um jovem de 24 anos de idade, em boas condições físicas e estudante de graduação na cidade de São Paulo. E, nem ele, tampouco os amigos, estão sozinhos no consumo cada vez mais cedo de Viagra, ou azulzinho, como alguns chamam o produto. O citrato de sildenafila, nome da substância química presente no Viagra, atua nos corpos cavernosos do pênis, favorecendo a vasodilatação das artérias locais ao promover a entrada de sangue; o resultado disso é o enrijecimento do órgão. O mecanismo de vasodilatação periférica age entre 30 e 60 minutos após o consumo e seu efeito pode durar até quatro horas. É um medicamento indicado para homens com disfunção erétil e, por isso, não é para todos que queiram ter desempenho sexual mais duradouro.
Dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) de 2018 mostram que, no Brasil, 30% da população masculina sofre de algum tipo de disfunção sexual o que representa, aproximadamente, 15 milhões de pessoas. É bastante gente! Porém, há diversas razões para isso ocorrer, seja de ordem fisiológica ou psíquica.
Nesse universo de pessoas, nem todos apresentam o perfil indicado para o uso do medicamento. A facilidade de adquirir sem prescrição médica, os preços praticados pelo mercado e, sobretudo, o desejo de impressionar durante o ato sexual são estímulos para o uso. Ter medo de falhar no dia D e hora H é recorrente entre a maior parte dos homens e não é achismo, já que um estudo da própria Sociedade Brasileira de Urologia mostrou que os indivíduos avaliados na pesquisa relataram ter mais medo de ficar com dificuldade de ereção do que serem traídos por suas companheiras.
“Após isso [tomar o Viagra] mantive a ereção por algumas horas, juntamente com um desconforto físico, uma taquicardia moderada e uma inquietação leve. Só fui ficar bem depois de conseguir dormir.”
Os efeitos colaterais mais relatados incluem:
No entanto, o principal efeito colateral do uso recreativo de viagra é psicológico. Utilizar cada vez mais estimulantes sexuais, muitas vezes por influência de terceiros que tiveram uma boa experiência, pode levar a uma dependência psíquica, ou seja, o usuário não se sente mais “apto” a transar quando não usa o medicamento.
“Mas eu sou um cara até conservador perto dos meus amigos. Eles tomavam de 15 em 15 dias para ficar galado (sic) a noite inteira e comer geral depois de beber litros de vodca. Boate e Viagra andavam lado a lado.”
Milhões de pílulas são vendidas dia após dia no mundo todo e, para adquiri-las, não é necessário apresentar receita médica no balcão da farmácia, mas o uso indiscriminado pode causar problemas sérios de saúde.
A disfunção erétil de origem psicológica é a mais prevalente em homens jovens e corresponde a aproximadamente 10% dos casos em pacientes com mais de 50 anos. Complicações emocionais, como o estresse, a depressão, a ansiedade, problemas financeiros, familiares e de relacionamento podem atrapalhar o desempenho sexual.
Até que ponto a influência de terceiros interfere no que fazemos na nossa vida? E na vida sexual? Nesse ponto, a indústria pornográfica pode desempenhar papel importante, porque, em geral, antes de iniciar a vida sexual, quase todo adolescente descobre o Google e busca vídeos pornográficos para se satisfazer, mas também tentar aprender algo como se fosse uma espécie de manual de instruções. Só que nos filmes adultos não há cenas em que o homem brocha, não existe dor, nem ejaculação precoce, muito menos preocupações. Tudo é prazer, por mais artificial que seja; na vida real a gente sabe que é diferente. Querer sempre ter um sexo espetacular, digno de Oscar, não é natural. A gente vive uma vida corrida, porque é boleto para pagar, problemas para resolver e nem sempre falhar na hora H significa falta de tesão, vontade ou problema de saúde.
É preciso relativizar as situações quando as coisas não saem como a gente espera – ou se esforça – para que saiam. É normal não ter libido a todo instante e não estar bem para fazer sexo, às vezes. Conheça seu corpo, porque só assim você vai saber identificar quando, de fato, você precisa de ajuda médica para iniciar algum tipo de tratamento.
Tenha certeza de que, quando a câmera desliga, até o ator do filme pornô faz sexo normal, sem posições bizarras que desafiam a gravidade, porque sexo, para ser bem feito, tem de ser bom e prazeroso para aqueles que o praticam e, caso você precise de ajuda médica, procure-a. É um direito seu. Mas não saia por aí tomando remédios para tentar impressionar outros e, principalmente, você! Seu sangue é vermelho, não azulzinho, então “taókei” falhar, às vezes.
* Esta coluna não reflete, necessariamente, a opinião do Site Doutor Jairo
Anderson José
Estudante de medicina na Ufac (Universidade Federal do Acre), autor do podcast Farofa Médica e da página de Instagram @oiandersao