Você, provavelmente, já ouviu falar nas expressões endemia, epidemia e pandemia, certo? E sindemia? Sabe o que significa? Imagine a ocorrência de duas epidemias acontecendo ao mesmo tempo e no mesmo espaço... Pronto, isso é sindemia. Com as chuvas e o calor do verão, uma doença indesejada volta a preocupar as autoridades sanitárias e a sociedade: é a dengue que, neste exato momento, ressurge em meio a Covid-19. Aedes aegypti e Sars-Cov-2 ocasionam, então, a sindemia brasileira entre duas infecções virais, uma já antiga da população e agora uma nova, que já ceifou a vida de mais de 227 mil brasileiros.
Em 2019, foram notificados 1.544.987 casos de dengue no país, com destaque para os estados do Acre, Roraima e Tocantins a partir do final do segundo semestre daquele ano. O número de mortes em decorrência da dengue, no período analisado, foi de 782 casos, sendo mais letal aos idosos acima de 60 anos.
Em um momento de pandemia de Covid-19, o crescimento dos casos de dengue preocupa tanto pelo desafio aos sistemas de saúde para se estruturarem e atenderem a demanda de pacientes, como pela população que fica exposta às picadas do Aedes se aquele ou aquela vizinha não toma as medidas corretas de eliminação dos focos de proliferação dos mosquitos como: não deixar água parada, colocar areia nos pratinhos das plantas, limpar calhas e por aí vai.
Pensando bem, o bom senso e a união de todos é que pode diminuir o tamanho dessa sindemia, né? Usar máscara equivale a derramar água parada, neste momento.
Estudos interessantes sobre Covid-19 e dengue
Com a pandemia da Covid-19, diversas pesquisas são realizadas em diferentes locais do mundo no anseio de entender melhor o vírus que desafia o sistema de saúde e, como no caso do Brasil, deixa claro o despreparo de autoridades diante do tamanho do desafio de conter os casos e vacinar toda a população.
É natural, em momentos difíceis, ficarmos ansiosos por respostas rápidas que consigam sanar as questões complexas que nos impedem de seguir a vida normal como no caso do novo coronavírus. No entanto, para um grande desafio, é necessário trabalho conjunto de diversos setores da sociedade e é aí que entram os cientistas, o empenho dos profissionais de saúde e de tantos outros trabalhadores essenciais.
Pesquisas de qualidade têm metodologia bem empregada e clara, resultados significantes e uma equipe comprometida em contribuir com o desenvolvimento técnico-científico do país tudo isso sustentado em bases sólidas de ética e profissionalismo.
Dengue pode ser fator de proteção para a Covid-19?
Parece haver uma associação, de acordo com um estudo publicado no final de 2020 na revista Clinical Infectious Diseases da Universidade de Oxford. O estudo intitulado “Previous dengue infection and mortality in COVID-19” foi realizado por alunos do curso de medicina da Universidade Federal do Acre (Ufac) em parceria com pesquisadores da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e também com participação da Harvard Medical School, dos Estados Unidos.
A pesquisa ocorreu na cidade de Rio Branco, capital do Acre, em 2020, onde os pacientes diagnosticados com a Covid-19 foram telemonitorados pelos pesquisadores. Dos 2351 participantes do estudo com Covid, 1177 relataram ter história prévia de dengue anterior a pandemia. O principal achado do estudo foi que, entre as pessoas que tiveram dengue prévia, houve menos risco de morte em 60 dias de acompanhamento. Assim, a infecção pelo vírus da dengue, sobretudo em uma região endêmica de arboviroses como o estado do Acre que compõe a região amazônica, parece induzir algum tipo de imunidade contra a Sars-Cov-2.
Mas o pesquisador responsável, o médico cardiologista Odilson Marcos Silvestre, adverte que apesar dessa associação e um possível fator de proteção, não se pode afirmar de forma categórica que é fato provado. “Na ciência o nosso caminho é longo e nós precisamos de mais dados, mas esse resultado é bastante promissor”, afirma o médico.
Outro estudo publicado também em 2020 e feito pelo médico e cientista brasileiro Miguel Nicolelis também encontrou relações entre a dengue e a Covid-19. O pesquisador constatou que locais com muitos casos de dengue tiveram menos casos de infecção e a mortalidade também foi menor. No entanto, ambos os estudos não analisaram testes sorológicos dos pacientes participantes, sendo, dessa forma, estudos epidemiológicos e que carecem de maior tempo de investigação e análise.
Até agora os únicos métodos eficazes e comprovados de prevenção à infecção pelo novo coronavírus são o uso de máscara tapando o nariz e a boca (vale ressaltar), a higiene das mãos, distanciamento social e, mais recentemente, a vacinação ampla aprovada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). No entanto, não basta ter máscara e não utilizá-la, assim como ter a vacina disponível e não tomar. Protejam-se!
Anderson José
Estudante de medicina na Ufac (Universidade Federal do Acre), autor do podcast Farofa Médica e da página de Instagram @oiandersao