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Vocalização copulatória: as fêmeas de primatas e seus gemidos no sexo

Chamadas de cópula: as estratégias reprodutivas de fêmeas de primatas - iStock
Chamadas de cópula: as estratégias reprodutivas de fêmeas de primatas - iStock

José Roberto Miney Publicado em 05/05/2021, às 19h18

Christopher Ryan, psicólogo e coautor de um livro de sucesso nos EUA, Sex at Dawn (Sexo ao amanhecer, em tradução livre), conversou com diversos primatologistas sobre o tema e publicou o resultado no periódico Psychology Today.

Trilha sonora da competição espermática

Segundo o primatologista britânico Stuart Semple, as fêmeas de uma grande variedade de espécies têm o costume de vocalizar antes, durante ou imediatamente após o acasalamento. As evidências indicam que parece se tratar de uma “chamada de cópula” por parte da fêmea aos machos de seu grupo.

O pesquisador gravou mais de 550 chamadas de cópula de sete fêmeas diferentes de babuínos, a fim de estudar a estrutura acústica desses registros. Ele descobriu que essas vocalizações complexas continham informações relacionadas ao estado reprodutivo das fêmeas (as vocalizações eram mais complexas quando elas estavam mais perto da ovulação), e também relacionadas ao macho e, sobretudo, a seu status.

Em outras palavras, as chamadas de cópula eram mais longas e continham mais unidades sonoras distintas durante o acasalamento com machos por elas classificados como superiores. 

Nesse sentido, no caso desses babuínos, os machos ouvintes poderiam em tese obter informações sobre sua probabilidade de engravidar uma fêmea chamativa, bem como ter alguma noção da posição do macho que encontrariam com ela, se por acaso se aproximassem.

Outra primatologista, Meredith Small, concorda que os chamados de cópula de fêmeas de primatas são facilmente identificáveis: "Mesmo os [machos] não-iniciados podem identificar um orgasmo feminino de primata não-humano, ou prazer sexual", diz ela. "As fêmeas produzem sons somente escutados no contexto de acasalamento”. Macacos com cauda de leão fêmeas usam chamadas de cópula para chamar a atenção dos machos, mesmo quando não estão ovulando. Ela explica que, entre esses primatas, “as fêmeas ovulando, na maioria das vezes, direcionavam seus convites para machos fora de seu próprio grupo, trazendo assim sangue novo para  o acasalamento”.

Chamados de cópula e promiscuidade

Ao que tudo indica, a vocalização copulatória feminina está altamente associada ao acasalamento promíscuo, mas não à monogamia. Alan Dixson notou que as fêmeas de espécies promíscuas de primatas emitem chamados de acasalamento mais complexos do que as fêmeas de espécies monogâmicas e mesmo as polígamas. 

Complexidade à parte, Gauri Pradhan e seus colegas conduziram uma pesquisa de chamadas de cópula em uma variedade de primatas e descobriram que “a variação na promiscuidade das fêmeas prevê sua tendência de usar chamadas de cópula em conjunto com o acasalamento”. Seus dados mostram que níveis mais altos de promiscuidade predizem chamadas de cópula mais frequentes.

Por outro lado, outros pesquisadores, William J. Hamilton e Patricia C. Arrowood, analisaram as vocalizações copulatórias de vários primatas, incluindo três casais humanos. Eles notaram que "os sons femininos se intensificaram gradualmente conforme o orgasmo se aproximava e assumia um ritmo rápido e regular (comprimento de notas e intervalos entre elas), ausente nas vocalizações masculinas durante o orgasmo". 

Curiosamente, os autores não esconderam seu desapontamento quando observaram: "Nenhum dos sexos [humanos] mostrou a complexidade da estrutura sonora característica das vocalizações copulatórias dos babuínos", que são claramente audíveis até mesmo para ouvidos humanos a 300 metros de distância.

Essa característica coloca a questão do risco. Chimpanzés e bonobos podem estar fora de alcance dos predadores nos galhos, mas os babuínos (como nossos ancestrais que vivem no solo), transitam entre leopardos e outros predadores, muito interessados ​​em caçar dois primatas de uma vez, distraídos que estão em sua atividade copulatória.

Tanto barulho por nada?

Hamilton e Arrowood, escrevendo na Science, se perguntam: Qual o valor adaptativo dessas chamadas de cópula, apesar dos riscos? Eles levantaram várias hipóteses, incluindo a noção de que pode ser um estratagema para ajudar a ativar o reflexo ejaculatório do macho.

Ryan complementa, muito jocosamente, que muitas profissionais do sexo provavelmente concordariam com esse raciocínio. Ao mesmo tempo, ele considera que talvez haja um ponta de verdade nessa ideia, mas por outro lado afirma que primatas machos não são conhecidos por precisar de muita ajuda para ativar seu reflexo ejaculatório. 

No caso do reflexo ejaculatório masculino humano, segundo ele, tende a ser ativado com muita facilidade. ”Dadas todas as outras evidências convergentes, parece muito mais provável que, em humanos, a vocalização copulatória feminina serviria para atrair os homens para  a mulher sexualmente receptiva por estar ovulando, promovendo assim a competição espermática, com todos os seus benefícios – reprodutivos e sociais.

Por outro lado, não se pode deixar de lado o fato de que nós, humanos, há muito rompemos com o ciclo comportamental dos primatas em estado selvagem e nos aventuramos para construir nossa própria História, com seus altos e baixos, mas nossa. Sendo assim, o que cada um de nós fazemos na intimidade com o parceiro, a parceira, os parceiros, dependendo de cada caso, pode ter múltiplas influências, sociais, familiares, de trajeto pessoal, de impulso inconsciente, mas, talvez, e acima de tudo, dos desejos individuais de cada um.

*Esta coluna não reflete, necessariamente, a opinião do Site Doutor Jairo.

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