Uso de álcool e drogas, abuso da tecnologia, "fake news" e estigmas são problemas com os quais a gente convive há algum tempo, mas este ano alguns fatos
Jairo Bouer Publicado em 18/12/2019, às 15h12 - Atualizado em 07/01/2020, às 17h23
Uso de álcool e drogas, abuso da tecnologia, “fake news” e estigmas são problemas com os quais a gente convive há algum tempo, mas este ano alguns fatos chamaram a atenção de quem trabalha com saúde. Fazer retrospectivas é sempre uma forma de fazer reflexões importantes, por isso destaco, aqui, algumas notícias importantes de 2019 que têm impacto para todo mundo:
Adolescentes e tecnologia
Um quarto dos jovens já praticou alguma forma de automutilação, quatro em cada 10 já pensaram em suicídio e cerca de um em cada 10 adolescentes afirma já ter tentado tirar a própria vida. É muita gente em sofrimento. Esses foram os resultados da pesquisa que eu realizei em parceria com a Positivo Tecnologia, o Portal Educacional e a Katru Assessoria em Informação. Mais de 3.300 alunos de 53 escolas (a maioria privadas) em diversas regiões do país foram entrevistados. Ficou claro para gente que a vida na rede tem uma relação forte com as emoções: quem fica conectado mais de nove horas por dia tem um risco 2,4 vezes maior de relatar angústia, tristeza e estresse, em relação a quem fica menos de duas horas. Se você se indentifica com esses adolescentes, vale a pena refletir se não tem passado tempo demais nas redes sociais ou nos jogos online.
Volta do sarampo
Você provavelmente ouviu falar de alguém que teve sarampo este ano. Depois de ter comemorado a eliminação da doença, o país enfrentou surtos em diversas regiões ao longo deste ano. Entre setembro e novembro, o Ministério da Saúde contabilizou mais de 3.560 casos confirmados e 15 mortes, sendo oito de crianças com até 1 anos de idade. Embora a vacina faça parte do calendário oficial, muita gente relaxou, ou foi influenciada por notícias falsas sobre a imunização. O problema afeta o mundo todo. A Organização Mundial de Saúde (OMS) informou que, só no primeiro semestre, foram registrados mais casos de sarampo que em qualquer ano desde 2006. Uma pesquisa publicada também este ano por pesquisadores da Universidade de Harvard, nos EUA, revelou que o vírus do sarampo gera uma espécie de amnésia no sistema imunológico, e isso deixa o organismo mais vulnerável para diversas doenças. É triste que a internet tenha trazido uma consequência tão séria para a saúde pública. A mensagem que fica é: tome muito cuidado com o que você recebe por meios eletrônicos. Se você tem alguma dúvida sobre qualquer vacina ou doença, consulte o médico antes de acreditar no que lê por aí.
Bebida demais
Uma pesquisa divulgada pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) mostrou que cerca de 2,3 milhões de brasileiros apresentam sintomas de dependência de álcool. O levantamento, que contou com 17 mil pessoas de 12 a 65 anos, é considerado um dos mais completos em termos de abrangência. Mais de 30% dos entrevistados informaram ter consumido pelo menos uma dose nos 30 dias anteriores à pesquisa, o que equivaleria a 46 milhões de brasileiros. Houve polêmica na divulgação dos resultados, aparentemente porque o trabalho contesta a tese de parlamentares de que há uma epidemia de uso de drogas no país. Em relação ao crack, as entrevistas mostram que 0,3% da população havia feito uso no ano anterior, e 0,1%, no mês anterior à pesquisa. Nesse período, também, a maconha foi usada por 1,5%, e a cocaína, por 0,3% dos brasileiros. É bom a gente prestar atenção nesses números.
Masculinidade “tóxica”
O tema tem sido abordado por especialistas em saúde mental há algum tempo, mas ganhou repercussão, este ano, por causa de um documento divulgado pela Opas (Organização Pan Americana de Saúde). Segundo ele, a expectativa de vida dos homens na Região das Américas é 5,8 anos menor que o das mulheres, em parte porque as expectativas da sociedade contribuem para comportamentos de busca de riscos. Ser “ousado”, aventureiro, sexualmente dominante e evitar discutir emoções ou procurar ajuda são algumas atitudes ligadas à “masculinidade tóxica”. Essa visão de que os homens devem ser “durões” tem contribuído para índices alarmantes de suicídio, homicídio, vício e acidentes de trânsito, bem como de doenças crônicas entre os homens.
HIV e preconceito
Oito em cada dez pessoas com HIV têm dificuldades de revelar sobre o vírus por causa do estigma da doença. A descoberta foi revelada por uma pesquisa feita pela primeira vez no Brasil, este ano, pela Unaids, o programa das Nações Unidas voltado para à Aids. O levantamento foi feito em sete capitais e mostra que mais de 64% das pessoas que convivem com HIV ou Aids no país já sofreram alguma forma de discriminação. O resultado é um impacto enorme na saúde mental dessas pessoas. E mais: o medo de passar por essa situação leva muita gente a evitar o teste de HIV, que deveria ser rotina para quem tem vida sexual ativa. O Boletim Epidemiológico divulgado pelo Ministério da Saúde em dezembro mostra que cerca de 135 mil brasileiros têm o vírus e não sabem.