Guilherme Ravache Publicado em 30/12/2020, às 08h00
Elvis Presley deu aos americanos um presente além de sua música em 1956. Durante um período em que a poliomielite assolava os Estados Unidos, o Rei recebeu uma vacina contra a poliomielite ao vivo no “The Ed Sullivan Show”. Na época, a maioria das crianças estava sendo vacinada, mas muitos adolescentes e jovens adultos não achavam que corriam o risco de contrair poliomielite e estavam relutantes em tomar a vacina.
A decisão de Elvis de tomar a vacina publicamente - especialmente sendo uma celebridade jovem e saudável - pode ter fornecido um grande impulso para adolescentes e jovens adultos se vacinarem. Pode ter sido um catalisador para que os adultos mais jovens entendessem a importância da injeção, como lembrou a CNN em artigo recente.
Elvis ajudou a desacelerar a propagação da doença altamente contagiosa, que acabou sendo erradicada depois que Dr. Jonas Salk desenvolveu a vacina em 1955. Em 1962, o número médio de casos de pólio caiu significativamente; os Estados Unidos estão livres da pólio desde 1979, de acordo com o CDC.
Então, por que não recrutar famosos, como estrelas do pop, atores e esportistas para usar sua influência em favor da vacinação? No momento em que milhões de brasileiros expressam relutância ou mesmo se recusam a tomar a vacina contra o coronavírus, será necessário um grande esforço para que essas pessoas mudem de ideia quando a vacina estiver disponível.
Neste momento, em que muitas celebridades estão se tornando mais conhecidas por frustrarem os esforços de controle da pandemia do que apoiar seu controle, pode parecer estranho pensar nos famosos. Mas a história prova que celebridades têm papel chave na propagação das ideias. As imagens são poderosas e o poder de influência das estrelas é notório.
E se me perguntassem qual celebridade imagino encabeçando este movimento no Brasil, rapidamente responderei: Anitta.
A cantora é notória por suas posições (e opiniões). Não foge de polêmicas e quando fala, é ouvida. Mais importante, é admirada por milhares de jovens país afora e é uma comunicadora genial. Neymar seria outro nome de peso para apoiar a campanha, mas ele não tem a mesma desenvoltura de comunicador de Anitta.
Certamente, esta não é uma batalha de um só. Roberto Carlos, Ivete Sangalo… quanto mais famosos, melhor. Porém, Roberto teria mais apelo entre o público mais velho, que já tem maior disposição à vacinação. Ivete é a Rainha do Brasil, mas possivelmente teria menor influência no público que Anitta conversa. De todo modo, quanto mais nomes de peso apoiarem a vacinação, melhor.
Mas ninguém deve se iludir imaginando que apenas o esforço publicitário será suficiente para que as pessoas se vacinem. Elvis apareceu diante das câmeras para ser vacinado, mas o trabalho foi muito além. E o fato é que a contribuição de Elvis foi somente o primeiro passo.
A March of Dimes, uma ONG que lutava pela erradicação da pólio nos anos 50, recrutou os próprios jovens para ajudar a promover a vacina (o que os marketeiros de hoje provavelmente chamariam de uma campanha com micro-influenciadores). Era o “Teens Against Polio” - em tradução livre, jovens contra pólio.
O grupo pedia a jovens “populares” nas escolas para tomarem a vacina diante de outros jovens. Algo que hoje poderia ser facilmente amplificado pelas redes sociais como Facebook e Instagram. E mais, os materiais impressos sobre vacinação eram escritos por jovens, para jovens e com linguagem jovem. E aqui não consigo esquecer das tantas vezes que li que Anitta, quando entra em uma campanha, participa de todo o processo de desenvolvimento, inclusive influenciando na linguagem usada. Imagino que seria um grande trunfo tê-la em uma empreitada como essa.
A vacina a cada dia se prova mais segura e os riscos de não tomá-la indicam ser bem maiores do que eventuais alergias ou complicações resultantes da vacinação. Além disso, é senso comum entre especialistas que a Covid-19 deverá conviver conosco por muitos anos.
O número de mortes irá diminuir com o tempo, seja pela vacinação em massa ou por uma possível imunidade de rebanho - quando tivermos tantos infectados que a maior parte da população terá adquirido resistência ao novo coronavírus - mas quanto mais rápida e bem-sucedida for a campanha de vacinação, menor o custo de vidas.
Alguns podem achar precipitado pensar em vacinação de jovens quando não há nem mesmo uma data definida para o início da vacinação no Brasil. Mas quanto antes começarmos a planejar, maiores as chances de sucesso (e a agenda da Anitta não é fácil). Idosos serão vacinados, mas são os jovens que circulam com maior frequência, seja para trabalhar ou encontrar grupos de amigos.
Uma das razões do caos de países como Brasil e Estados Unidos está justamente na falta de planejamento e comunicação falha com a população. Os motivos são diversos e certamente passam pela politização da pandemia. Trump e Bolsonaro tiveram papel crucial ao assumirem uma postura negacionista. Trump perdeu a eleição, Bolsonaro descobriremos. Mas sem dúvida, seria de grande ajuda se todas as lideranças políticas também se vacinassem publicamente.
Para Anitta, ao aderir à campanha de vacinação, seria ainda uma oportunidade de usar seu “Modo Turbo” para uma causa essencial. E quem sabe, entrar para a história como a popstar que ajudou a salvar milhares de vidas.