Giulia Poltronieri e Tatiana Pronin Publicado em 04/06/2021, às 16h11
Cerca de 40 bebês nascem prematuros a cada hora no Brasil, ou seja, antes do prazo esperado de 37 a 42 semanas de gestação. Com uma taxa estimada em torno de 12%, segundo dados da Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz) e do Ministério da Saúde dos últimos anos, essa proporção é o dobro da registrada em alguns países europeus. Por outro lado, não está tão diferente da média mundial: mais de um em cada 10 bebês nascem antes do tempo.
Um parto antes da hora é sempre motivo de preocupação, ainda mais para os chamados prematuros extremos, que nascem com menos de 28 semanas de gestação. É que nesse estágio muitos órgãos ainda não estão completamente formados, o que gera maior risco de vida ou de sequelas. Os recém-nascidos prematuros são classificados de acordo com a idade gestacional ao nascer, de acordo com a Sociedade Brasileira de Pediatria:
- Pré-termo extremo (<28 semanas)
- Muito pré-termo (28 a <32 semanas)
- Pré-termo moderado (32 a <37 semanas)
- Pré-termo tardio: (34 a <37 semanas)
Graças aos avanços da medicina neonatal, as chances de sobrevivência são muito mais altas hoje em dia. E até estratégias que nada têm a ver com tecnologia, como o Método Mãe Canguru, têm ajudado a salvar vidas, como ressaltou a OMS (Organização Mundial da Saúde) em posicionamento recente a favor da manutenção da prática durante a pandemia (você confere mais informações sobre a prática abaixo).
Estudos e autoridades médicas chamaram atenção para o risco aumentado de prematuridade para gestantes avançadas que testam positivo para a Covid-19. Mas, ainda que a infecção seja um fator complicador para as grávidas, o receio de pegar a doença – e consequente redução nas idas ao médico e às consultas pré-natais – pode ser um problema ainda maior, como observa o coordenador de obstetrícia do Grupo Santa Joana, em São Paulo, Mário Kondo.
Existem diversos fatores de risco para a prematuridade, que, algumas vezes, podem ser controlados com um bom acompanhamento pré-natal. Mas também há situações em que o parto é antecipado por decisão médica, quando há indícios de sofrimento fetal, restrição de crescimento ou perigo para a mãe. “Em cerca de 70% dos casos, os partos prematuros ocorrem espontaneamente; e em 30% são eletivos”, estima Kondo.
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Veja, a seguir, algumas causas comuns de prematuridade:
Hipertensão materna – casos em que a mulher já apresentava ou tinha tendência a pressão alta crônica antes de engravidar.
Pré-eclâmpsia – quando a hipertensão ocorre especificamente na gestação, em geral a partir da 20ª semana de gravidez. Além da pressão alta, pode haver edema e perda de proteína pela urina. A condição pode evoluir para a eclâmpsia, quando a mulher sofre convulsão e há risco de vida tanto para ela quanto para o bebê.
Descolamento prematuro da placenta – pode ocorrer em função de condições de saúde da mãe e tem como principal sintoma o sangramento.
Placenta prévia – quando a placenta passa a se localizar na frente do bebê, ou seja, cobrindo a abertura do colo do útero. As causas são desconhecidas, mas é mais comum em mulheres com mais de 35 anos ou que passaram por cirurgias uterinas.
Malformações uterinas ou fetais – no primeiro caso, o chamado “colo curto” ou a presença de miomas uterinos volumosos podem interferir no risco.
Infecções e outras doenças durante a gestação – como infecções no trato urinário, ISTs (infecções sexualmente transmissíveis), diabetes gestacional ou outras.
Gestação gemelar – a gravidez de gêmeos sempre envolve maior risco de complicações, e a probabilidade de parto prematura aumenta ainda mais em casos de trigêmeos.
Ruptura prematura da bolsa amniótica – vale mencionar que quando isso acontece e a gestante não entra em trabalho de parto, é possível adiar o parto com repouso absoluto e outras medidas.
Como há muitas causas possíveis para um parto de prematuro, a prevenção depende da identificação precoce dos fatores de risco, e pode incluir, além de repouso e observação, o uso de progesterona, antibióticos e outros medicamentos.
As principais manteiras de se evitar um parto prematuro é, antes de tudo, consultar o médico antes de tentar engravidar, não só para identificar possíveis infecções, como também para iniciar o uso de suplementos como o ácido fólico, fundamental para o desenvolvimento fetal.
Depois que a gravidez é confirmada, é fundamental que a gestante vá a todas as consultas e exames do pré-natal, siga todas as orientações médicas, se cuide (o que inclui não fumar, não usar álcool ou drogas e ter uma dieta adequada) e procure atendimento sempre que houver algum sintoma estranho, como secreções ou sangramentos.
Mas é importante lembrar que nem todos os partos prematuros têm causa conhecida. Quando isso acontece, porém, há risco maior de uma nova ocorrência nas gestações seguintes.
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Um estudo recente coordenado pela Organização Mundial de Saúde (OMS) e com iniciativa do Instituto Karolinska (Suécia) revelou que o contato contínuo pele a pele começando imediatamente após o parto – mesmo antes de o recém-nascido ser estabilizado – pode reduzir a mortalidade em 25% em bebês prematuros e abaixo do peso.
O toque constante pele a pele entre mãe/pai e recém-nascido, conhecido como Método Mãe Canguru, é uma das formas mais eficazes de prevenir a mortalidade infantil globalmente. A recomendação atual da OMS é que esse contato comece assim que um bebê abaixo do peso esteja suficientemente estável, o que, para aqueles que pesam menos de dois quilos ao nascer, pode levar vários dias.
Segundo os pesquisadores, a ideia do toque imediato após o parto para recém-nascidos muito pequenos e instáveis encontrou forte resistência, porém cerca de 75% das mortes ocorrem antes mesmo que o bebê fosse considerado suficientemente estável.
A pesquisa analisou se o atendimento utilizando a prática logo depois do nascimento leva a taxas de sobrevida ainda melhores para bebês com peso de 1 a 1,8 kg em países de baixa e média renda. Para isso, as análises foram realizadas em cinco hospitais universitários de Gana, Índia, Malawi, Nigéria e Tanzânia, onde a mortalidade de recém-nascidos variou entre 20% e 30% (antes do estudo).
Com objetivo de melhorar e alinhar o cuidado o máximo possível entre os hospitais participantes, antes do início do estudo foi fornecido um treinamento na atenção neonatal básica e equipamentos básicos para medir os níveis de oxigênio dos bebês e fornecer ventilação assistida. As instituições também foram treinadas para realizar o contato seguro pele a pele com bebês instáveis.
No estudo, 3.211 bebês foram aleatoriamente divididos em dois grupos: um que recebeu o método e manteve um contato contínuo pele a pele na unidade neonatal – onde as mães também receberam os devidos cuidados médicos –, e o grupo controle que obteve os cuidados padrão, sendo mãe e filho atendidos em unidades separadas, reunindo-se apenas no momento da amamentação.
Assim que os recém-nascidos se estabilizaram o suficiente, mães e bebês de ambos os grupos foram transferidos para a unidade regular onde era realizado o Mãe Canguru. Durante as primeiras 72 horas, os bebês do grupo do toque contínuo receberam aproximadamente 17 horas de contato pele a pele por dia, em comparação com 1,5 horas no grupo controle.
A mortalidade nos primeiros 28 dias foi de 12% no grupo que seguiu o método, em comparação com 15,7% no grupo controle, o que corresponde a uma redução de 25%. Além disso, também houve uma queda significativa do número de bebês com baixa temperatura corporal ou intoxicação sanguínea bacteriana.
Para os pesquisadores, a principal mensagem da pesquisa é que recém-nascidos abaixo do peso devem receber o contato pele a pele imediatamente após o nascimento e, posteriormente, mãe e bebê devem ganhar os cuidados necessários juntos. Os resultados sugerem ainda que esse modelo, que por si só não exige recursos, pode ter efeitos significativos na saúde.
Segundo a equipe, estima-se que o método tenha o potencial de salvar mais de 150.000 bebês pequenos a cada ano. A OMS está em processo de revisão de suas recomendações atuais sobre cuidados maternos do tipo “canguru”, publicadas em 2015, à luz de novas evidências. O órgão recomenda o método para todos os bebês, mas o novo estudo fornece indícios importantes sobre a capacidade da aplicação imediata dessa metodologia para salvar vidas de bebês prematuros instáveis.