Entenda como é o tratamento para essa sequela do coronavírus que tem afetado muita gente
Milena Alvarez Publicado em 07/04/2021, às 20h14
Dias, semanas, ou até mesmo meses com a capacidade de sentir cheiros comprometida. Isso é o que tem enfrentado muita gente que está com Covid-19 ou já se recuperou da doença. O fenômeno, conhecido como "anosmia", é um dos sintomas mais característicos da infecção, mas sua duração ainda parece incerta e varia de pessoa para pessoa.
Uma das alternativas para combater esse tipo de sequela é a “fisioterapia de cheiros”, ou seja, uma sequência de exercícios com o objetivo de reeducar o olfato e, consequentemente, recuperar sua função.
“A fisioterapia dos cheiros tem o mesmo papel da convencional. Sabe aquela pessoa que machucou a perna, ficou algum tempo imobilizada e, depois de retirar a imobilização, terá que fazer uma fisioterapia para que essa perna recupere a sua performance ideal? Então, o mesmo acontece com o olfato”, explica o otorrinolaringologista Paulo Mendes Junior.
Por ser um quadro viral, ou seja, uma infecção causada por um vírus que acomete o aparelho respiratório, a Covid-19 pode apresentar como sintomas a alteração do olfato e do paladar. Como ainda é uma doença muito recente e estudos acontecem em paralelo à disseminação de casos, ainda não há respostas definitivas para os mecanismos que levam à anosmia. Mas existem três possíveis explicações para a perda da capacidade de sentir cheiro provocada pelo Sars-Cov-2.
A razão mais provável é o inchaço - ou edema - nas terminações nervosas do nervo olfatório, algo que também acontece em outras doenças respiratórias como sinusite, gripes e resfriados. Uma segunda hipótese que vem sendo estudada é a de que o coronavírus lesiona diretamente esse nervo. Outros estudos apontam, ainda, para a possibilidade de o causador da Covid-19 agir no tronco cerebral, por onde sai o nervo olfatório.
Mendes Junior explica que a rinite é uma condição que também provoca essa alteração e, muitas vezes, acaba sendo confundida com a Covid-19: “A rinite também altera o olfato e, consequentemente, o paladar. Normalmente, sentimos o gosto da comida com ajuda do olfato, o que aumenta o prazer. Por isso, quando estamos resfriados, parece que o alimento não tem sabor.”
Normalmente, a necessidade e a importância do olfato só são notadas quando ele é perdido. No dia a dia, o olfato acaba passando despercebido, mas é um sentido essencial para muitas atividades cotidianas e também para as emoções.
Segundo Mendes Junior, quando perdemos a capacidade de sentir cheiros podemos deixar de experimentar uma série de sensações positivas: “Sentir o cheiro do bebê para uma mãe é fundamental, por exemplo. Além disso, cheirar o odor de uma comida já nos causa prazer antes mesmo de começar a comer de fato.”
A perda do olfato também por trazer constrangimentos ou situações de perigo – não perceber o cheiro do gás de cozinha em caso de vazamento pode ser fatal, assim como ingerir algum alimento estragado.
“É por isso que o nosso nariz é um pouco mais avantajado em relação à boca. Na hora em que levamos o alimento a ela, o primeiro obstáculo já é o nariz e o olfato vai te avisar se aquela comida está adequada ou não”, comenta o médico.
Para ajudar o olfato a reaprender sua função, o paciente deve realizar uma série de exercícios diários com diferentes tipos de cheiros marcantes, como rosas, cravo, eucalipto, menta, baunilha e café.
Todos os dias, o indivíduo realiza uma sequência de seis aromas. Cada um precisa ser sentido por dez segundos, com um intervalo de 15 segundos entre eles. Essa série deve ser feita duas vezes por dia, de manhã e à noite. É importante que a respiração ocorra somente pelo nariz e que o recipiente esteja bem próximo a ele durante o exercício.
Mendes Junior acrescenta que recebemos o odor pelo nariz, e ele segue pelas vias nervosas até o cérebro, onde é decodoficado e retorna com a identificação daquele cheiro. Sendo assim, com a fisioterapia, todas essas vias são estimuladas, reaprendem a função e o treinamento impede que elas fiquem atrofiadas.
De acordo com o especialista, a fisioterapia de cheiros é o tratamento "padrão ouro" para recuperação do olfato, mas é um processo que exige paciência. Muitos pacientes não veem uma melhora de imediato e acabam desanimados, ou esquecem de fazer os exercícios.
“É um tratamento a longo prazo, não vai melhorar em uma ou duas semanas. Infelizmente, recebo muitos pacientes com sintomas emocionais por essa alteração; eles ficam angustiados, depressivos e ansiosos ”, conta.
Não existe tempo limite para fazer a fisioterapia de cheiro, tudo depende da evolução do quadro de cada um. Geralmente, é indicado realizá-lo por até três meses e, após esse período, o ideal é retornar ao otorrinolaringologista e fazer uma reavaliação.
Os aromas que fazem parte da sequência já foram bastante estudados e os ingredientes são fáceis de ser encontrados. O café é algo comum no cotidiano do brasileiro e o paciente pode pegar o próprio produto que ele usa em casa. O cravo e a canela também são especiarias acessíveis.
Já o cheiro de menta pode ser encontrado na pasta de dente ou em óleos essenciais, assim como as fragrâncias de baunilha. Além disso, podem ser utilizados sucos em pó saborizados de tangerina e laranja.
A fisioterapia de cheiros pode ser combinada com outros tipos de terapias, mas não é obrigatório. Em alguns casos, os médicos optam por utilizar uma medicação associada para potencializar o tratamento, como os medicamentos anti-iflamatórios e alguns remédios manipulados, que ainda estão em estudo.
O otorrino ressalta também a importância de realizar a lavagem nasal com soro fisiológico diariamente: “O ideal é realizá-la de manhã ao acordar, à tarde - se houver necessidade - e à noite, antes de dormir. Ela vai hidratar o nariz, tirar qualquer impureza que inalamos e que possa desencadear um quadro de rinite, e tirar as secreções que produzimos normalmente”.
Ainda não se sabe se o olfato é recuperado 100%, já que a Covid-19 é uma doença nova em fase de estudos. Para o especialista, o grande problema está na demora dos pacientes em procurar ajuda.
“A maioria está deixando a situação da perda do olfato permanecer por muitos meses e, apenas quando o quadro emocional já está muito angustiante, procura um especialista. Então, possivelmente não teremos aquela melhora satisfatória que imaginaríamos se o tratamento fosse aplicado logo no início dos sintomas”.
Além disso, existem diversas outras questões que podem provocar alterações no olfato, como traumas ou tumores (benignos ou malignos) na região do cérebro e do nariz. Sendo assim, a qualquer sinal de mudança, é importante consultar um otorrinolaringologista e fazer uma avaliação.
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