Muitos ainda pensam na palavra cuckold como “corno”, mas trata-se de algo bem mais complexo e sofisticado
Cármen Guaresemin Publicado em 22/07/2023, às 17h00
A expressão cuckold vem da ave cuco, cuja fêmea busca outros ninhos para colocar os ovos. Este comportamento batizou o nome de um dos fetiches mais comuns no mundo todo e que não para de crescer no Brasil: o cuckolding. Muitos ainda pensam na palavra cuckold como “corno”, mas trata-se de algo bem mais complexo e sofisticado. Trata-se de uma atividade sexual na qual o homem fica excitado vendo a parceira fazendo sexo com outro homem ou narrando a experiência. Bem diferente de ser uma traição ou ato secreto. É algo consentindo, transparente e que agrada a todos os envolvidos.
Pesquisa realizada pelo Gleeden - plataforma para encontros extraconjugais projetados por e para mulheres - em dezembro de 2022, com 9.380 usuários brasileiros, apontou que a maioria dos entrevistados aceitaria ver o(a) parceiro(a) com outra pessoa: 36% “topariam, sem problemas”; 20% “topariam para experimentar”; e 44% “não topariam”. Quando questionados se ficariam com outra pessoa enquanto o(a) parceiro(a) assiste, 60% dizem que “sim, ficariam”; 12% “fariam para experimentar”; e os outros 28% “não ficariam”.
Outra pesquisa, realizada pelo site Sexlog – rede social adulta de origem brasileira voltada para swing, encontros sexuais, sexo virtual e exibicionismo - que reúne 19 milhões de inscritos, considerado a maior rede social de sexo e swing do Brasil, incríveis 90% dos usuários do sexo masculino da plataforma reconheceram já ter desejado ver a parceira tendo relações sexuais com outra pessoa.
A pesquisa aponta ainda que mulheres também são adeptas do fetiche, sentindo prazer ao ver o parceiro fazendo sexo com outra. Nesse caso, a prática é conhecida como “cuckquean” (a mulher que gosta de ser traída) e “hothusband” (homem que é visto traindo). Segundo a plataforma, ao contrário do que muitos podem pensar, em 50% dos casos, o interesse partiu delas. Já no Google, nos últimos 15 anos, a pesquisa pelo termo “cuckold” cresceu cerca de 800%.
Alex Mazoka, tem 40 anos, é ilustrador, artista plástico e escreve contos eróticos com esta temática. Ele conta que pratica há cerca de 12 anos. E que no início era algo pouco conhecido, mas agora está se tornando uma febre. Ele explica um pouco a dinâmica: “O cuckolding mantém um relacionamento fiel e monogâmico, mas há uma relação livre, ou seja, a parceira pode sair com outros homens que ela escolhe e, às vezes, deixa o companheiro assistir. Não deixar é como aplicar um castigo. Em alguns relacionamentos, inclusive, ela fica longos períodos sem fazer sexo com o namorado, só se relacionando com os amantes. Isso faz parte da fantasia: o sofrimento do homem ter de falar que precisa transar, que precisa dela, e ela dizendo: ‘Agora, não. Daqui a um mês te dou uma chance’".
Para ele, é um modelo de poliamor, já que o homem não vai ter outras parceiras. “Há casais que saem junto com o ‘comedor’, o alfa. Gostamos dessas terminologias, a ideia é brincar que o alfa é o macho superior. Ele vai ‘comer’ a mulher, enquanto o beta assiste. O comedor e o corno, nos EUA são bull e cuckold. Há casais que vão, com o amante, para o bar, cinema e tal, mas na hora da cama, é o amante que transa com a mulher”, esclarece.
A programadora Adriana, de 30 anos, já namorou alguns rapazes que tinham este fetiche, e o considera até previsível. Mas esclarece que não são todos os cuckolds que gostam da humilhação. “Alguns só se excitam com a safadeza da parceira, com a liberdade, querem saber que estão com uma mulher ‘insaciável’. Um cuckold com quem saí gostava mais disso, ele não era muito fã de humilhação”.
Adriana conta que existem outras ramificações do cuckolding, que, para ela, já começam a ser bastante problemáticas e das quais não participa, como as “hotwifes” brancas que só se relacionam com “bulls BBC” (big black cock, grandes paus pretos). “Bull é como se chama o cara que transa com uma hotwife. Dá para perceber como o racismo é o principal elemento desta fantasia”, relata.
A psicóloga e voluntária no Ambulatório Transdisciplinar de Identidade de Gênero e Orientação Sexual (Amtigos), Desirèe Monteiro Cordeiro, conta que em qualquer fetiche, tudo é conversado e as regras são claras, para que não haja outras interferências e não gere desconforto.
“Quem faz são pessoas que gostam de se sentir nesse lugar, pois é uma relação de poder. A partir do momento em que você consente que a pessoa vá para outra relação, é você que está permitindo e quer saber detalhes, ou de estar junto. Tem mais a ver com dominação do que com submissão, pois há toda uma orquestra regida por uma pessoa que libera o comportamento, claro que com os dois permitindo e a terceira pessoa aceitando, especialmente se for filmada ou fotografada”, explica Desirée.
Se você está pensando em experimentar um relacionamento estilo cuckolding, a psicóloga recomenda que um dos passos principais é estabelecer limites. Outro importante é que haja muita comunicação entre o casal. Além disso, é indispensável se certificar de que todos os envolvidos conheçam seu papel no ato sexual e o aceitem. Se alguém não se sentir confortável ou quiser parar, é preciso que os demais respeitem isso imediatamente.
Afinal, como qualquer outro fetiche, cuckolding não é para todos os gostos, mas, para quem quiser praticar de verdade, pode ser uma experiência muito gratificante e prazerosa.
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