Novas modalidades de convivência íntima estão surgindo a partir da virada do século
Redação Publicado em 04/05/2021, às 12h20
Phillip Hammack, professor de psicologia da Universidade da Califórnia, em Santa Cruz, discute, em um artigo no The Journal of Sex Research, que os relacionamentos heterossexuais e monogâmicas estão passando por grandes transformações, adotando novos arranjos — relações assexuadas, poliamorosas, transgêneras, de gênero não binário, pansexuais, dentre outras —, constituindo o que ele chama de “revolução silenciosa”.
Segundo Hammack, que estuda diversidade sexual e identidade de gênero, a internet e as mídias sociais permitiram o encontro de pessoas com identidades e tipos de relacionamento diversos, aumentando a conscientização sobre o significado de intimidade que põe em xeque as ideias tradicionais de heterossexualidade e monogamia.
Isso permitiu uma maior liberdade para adoção de novas abordagens de relacionamentos íntimos, incluindo um amplo leque de possibilidades, como relações assexuadas, poliamorosas, transgêneras, de gênero não binário, pansexuais, “kink”, práticas de fetiches, dentre outras.
O que é uma prática “kink”? Em um contexto repleto de tabus, preconceitos e repressão, qualquer coisa que fuja da norma em termos de sexo pode ser considerada “kink”: troca de casais, pompoarismo, exibicionismo e até mesmo o “sexting” (sexo por mensagens de texto). Há inclusive uma derivação japonesa, o ”kokigami”, em que o homem embrulha o pênis para oferecê-lo como um apreciado presente à parceira.
Hammack resolveu adotar o termo “revolução silenciosa” pelo fato de ela ser “muito diferente das revoluções sexuais dos anos 1960 e 70, que eram tão visíveis".
Para o psicólogo, o marco inicial desse movimento foi a legalização do casamento entre pessoas do mesmo sexo em 2015. Ela funcionou como o pano de fundo para a “explosão da diversidade de relacionamento que ocorreu desde o início dos anos 2000”.
Hammack critica o fato de se considerar um mito “que as pessoas assexuadas não se relacionem apenas porque experimentam pouco ou nenhum desejo sexual”. Prossegue ele: "Presume-se que elas estão sofrendo, sozinhas e sem parceiros, mas isso não é verdade. Elas têm relacionamentos íntimos, mas não sabemos muito sobre eles".
De fato, esse mito parece se fundamentar no pressuposto de que relacionamentos íntimos são fundamentalmente caracterizados pelo sexo. Contudo, pessoas autoproclamadas assexuais começaram a se organizar no início dos anos 2000 por meio da internet, e a assexualidade foi removida da última edição do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-5), publicado pela American Psychiatric Association em 2013.
De forma análoga, os relacionamentos poliamorosos também vão contra as convenções de monogamia ao permitir que os parceiros amem mais de uma pessoa. De toda forma, ao menos “poliamor” já tem registro no Oxford English Dictionary. Ainda segundo Hammack, as demais modalidades de relacionamentos carecem de mais estudos
Diante dessas mudanças, surge a necessidade de explorar todas as novas questões postas pela “revolução silenciosa”, como o surgimento da "heterossexualidade queer" e das "famílias escolhidas".
Por "queer", Hammack entende todo e qualquer relacionamento íntimo que desafie as normas. "É um uso de 'queer' que se originou na UC Santa Cruz com a frase 'teoria queer' em 1990", explica ele.
"Uma das coisas mais interessantes que estamos vendo é que a heterossexualidade está se abrindo como nunca antes. Mais pessoas que se identificam como heterossexuais terão alguma experiência com o mesmo sexo – elas até se referem a 'heteroflexibilidade', não se opondo a encontros com pessoas do mesmo sexo", destaca Hammack.
Já o fenômeno das famílias escolhidas, distintas das famílias biológicas, tem sido historicamente associado a gays e lésbicas que "criam suas próprias famílias" após serem rejeitados por parentes biológicos, mas sua prevalência permanece um mistério, ou seja, se sabe muito pouco a respeito.
Hammack está lançando uma nova pesquisa com foco na diversidade nos relacionamentos íntimos, e convida seus colegas de estudos de relacionamento e sexualidade para ampliar o escopo de suas próprias pesquisas.
"Temos que começar documentando a diversidade do que está acontecendo lá fora", afirma ele. "Não temos dados bons. O que temos não é muito."
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