Redação Publicado em 01/07/2022, às 14h00
Ser criativo não vem do nada. No entanto, o nascimento de uma ideia criativa em nosso cérebro ainda é um fenômeno desconhecido. Acredita-se que, para alcançar a criatividade, nos baseamos nos nossos conhecimentos anteriores, ou seja, na organização do nosso conhecimento armazenado na memória semântica e na forma como buscamos conceitos nele.
Mas o que realmente acontece quando procuramos uma nova ideia? Essa foi a pergunta chave para uma nova pesquisa idealizada pelo Institut Du Cerveau (Instituto do Cérebro de Paris - França) e publicada na revista Nature.
A memória semântica pode ser estudada como uma rede de associações de objetos e conceitos que estão ligados em maior ou menor grau. Por exemplo, a palavra "maçã" estará fortemente conectada ao conjunto mais amplo de "frutas", mas também pode ser relacionada a outros conceitos, como "doce", "vegetal" ou mesmo a palavras mais distantes, como "conto de fadas" (se você leu Branca de Neve). São todos esses conceitos, armazenados em nossa memória semântica, que nos permitem dar sentido ao mundo.
A criatividade, por sua vez, está intimamente ligada à estrutura dessa rede e à forma como navegamos dentro dela, sendo vinculada a processos de controle executivo: a capacidade de controlar nossas respostas diante das diferentes demandas de nosso organismo e os estímulos ou tentações do ambiente externo.
Se as associações semânticas são organizadas de tal forma que os vínculos entre objetos distantes são facilmente estabelecidos, é mais fácil gerar ideias originais.
Para entender melhor como os seres humanos navegam ao longo desta rede para alcançar pensamentos criativos, os pesquisadores construíram uma tarefa de associação semântica livre que consiste em fornecer uma palavra a um participante e pedir para ele dizer tudo o que vem à mente em relação à palavra proposta.
De acordo com a equipe, devido às diversas possíveis respostas a partir das palavras sugeridas, esse experimento permitiu classificá-las de acordo com o significado relacionado e distinguir dois componentes interagentes do processo de busca de memória: agrupamento e comutação (ou substituição).
Mas o que são esses dois conceitos? Tomando o exemplo de uma tarefa de geração de palavras envolvendo a categoria "Animais", o agrupamento consiste em listar sucessivamente o número de nomes de uma subcategoria de animais, como aves, enquanto a comutação envolveria a mudança de uma subcategoria para outra, de aves para anfíbios ou mamíferos.
Confira:
A tarefa desenvolvida pelo grupo de cientistas continha, por exemplo, a palavra francesa "rayon", que pode ter vários significados: os raios do sol, as prateleiras dos supermercados ou os raios de bicicleta. Assim, se um participante propõe palavras associadas ao "raio" em relação ao clima, ele adota um tipo de pesquisa de memória em agrupamento, enquanto se ele ou ela alterna entre palavras associadas ao clima e ao supermercado, sua pesquisa de memória agora é de um tipo de comutação.
Além disso, o estudo combinou esse experimento com uma série de outros testes que medem a criatividade, como o julgamento de associações semânticas e o controle executivo. A partir de todos esses dados, a equipe foi capaz de reconstruir a estrutura da rede semântica de cada participante e relacionar os dois componentes da busca da memória à criatividade.
Um dos resultados obtido pelos pesquisadores mostram que o agrupamento e a comutação estão de fato relacionados à criatividade, mas de forma diferente: o primeiro está ligado ao pensamento divergente, ou seja, à geração livre de ideias, enquanto o segundo está associado à capacidade de combinar associações distantes entre conceitos.
Assim, e com a ajuda de testes de ressonância magnética, foi possível observar quais áreas cerebrais cada componente atinge. O agrupamento, por exemplo, foi previsto por padrões de conectividade entre redes cerebrais relacionados à atenção e ao controle executivo, sugerindo que persistir em uma categoria semântica – todos os nomes dos mamíferos que vêm à mente, por exemplo – envolve processos de atenção e pode estar envolvido na geração de ideias criativas.
Já a comutação, por outro lado, prevê padrões de conectividade envolvendo principalmente a rede padrão e a rede de controle. Esse padrão de conectividade pode suportar processos de controle executivo interagindo com a memória semântica para explorar e combinar elementos distantes da memória.
Juntos, esses resultados mostram como as alternâncias entre a busca exploratória e a atenção focada apoiam a criatividade, fornecendo novos insights sobre as correlações neurocognitivas da pesquisa de memória relacionadas à cognição criativa.
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