Jairo Bouer Publicado em 08/01/2021, às 12h57
Você já teve a sensação que sempre ou, quase sempre, erra na escolha dos seus “ficantes” e namorados? Que jogue a primeira pedra quem nunca achou que tinha o “dedo podre” quando o assunto é o coração! Mas será que existe uma explicação para esse padrão de repetição de escolhas equivocadas? Muitas vezes, pelas experiências anteriores a gente sabe ou intui que não vai dar certo, mesmo assim insiste e segue adiante!
No final do ano um artigo do jornal espanhol El País analisou esse fenômeno e a gente vai, aqui, tentar esmiuçar um pouco mais esse processo.
A grande questão é que repetir um padrão que não funcionou anteriormente é quase como uma aposta em outro “fracasso” no campo emocional. Mas, ao mesmo tempo, é um passo que pode parecer menos arriscado, já que a gente acha que tem a noção de onde a história pode chegar.
A repetição de um mesmo padrão de namorado ou até de parceiro estável pode ter a ver com um receio de se lançar ao desconhecido no campo afetivo, de se permitir experimentar o diferente. Insistir no mesmo modelo funciona quase como uma forma de se assegurar, mesmo de maneira inconsciente, que nós conhecemos as “bordas da piscina”, sabemos os limites de até onde podemos ou queremos chegar.
Não é incomum que essas apostas no conhecido sejam não apenas nas características físicas da pessoa (estatura, aparência etc.), mas também nos traços de personalidade. É uma busca, no outro, de determinados elementos que a gente julga não ter, e que acredita serem importantes para a nossa vida. No fundo não são essenciais, já que a gente vive muito bem sem eles, mas insistimos em preencher esses vazios existenciais com as características do outro. A questão é que esse jeito de funcionar do nosso parceiro, muitas vezes, fere questões emocionais que são centrais para nós mesmos.
O perigo dessa situação é que muita gente que já passou por relacionamentos abusivos, mesmo sabendo o quanto eles são pesados e prejudicais para nossa existência emocional, corre o risco de reviver uma nova relação com as mesmas características, com grande risco de sofrer novamente. Se a vida fosse uma novela, é quase como se, no processo de “edição”, a gente insistisse sempre no mesmo roteiro e personagens, só mudando o ator ou a atriz que vai desempenhar aquele papel.
Essa história toda fica ainda mais comum no momento em que vivemos a “febre” dos aplicativos e sites de encontro. Na verdade, usamos quase que invariavelmente alguns filtros para escolher nossos pretendentes: físicos, sociais e psíquicos. Intuímos como é o outro por um par de fotos, alguns interesses, gostos pessoais e comentários e, acabamos criando uma espécie de tela de expectativas, projeções, que muitas vezes falam muito mais a respeito de nós mesmos do que do outro em questão!
Mas será que tem jeito de sair dessa armadilha do “dedo podre”? Tem sim! Primeiro, por mais doloroso que seja, é importante que a gente olhe para dentro, mergulhe na gente mesmo e entenda o que está fazendo de errado (e até perceba os porquês das escolhas equivocadas). Algumas pessoas conseguem fazer isso sozinhas, outras podem contar com a ajuda de amigos (aqueles que são sinceros e que realmente nos apontam nossos defeitos) e, em algumas situações, um processo de terapia pode acelerar essas percepções e rota de mudanças.
Arriscar, apostar no diferente, ousar quebrar “modelos” de relacionamento previamente vividos (e que a gente já sabe que vão dar errado), olhar com atenção para quem está ao lado e que, muitas vezes, a gente nem consegue perceber direito, são alguns desses caminhos. Isso tudo sem abrir mão dos valores e princípios éticos que nos são tão caros, e que, sem os quais, é inviável construir uma vida a dois.
O momento de reciclagens e de reavaliações de projetos de vida, impulsionadas tanto pela virada do ano como pela perspectiva dos próximos meses de isolamento e pandemia, pode ser uma boa oportunidade para quebrar a maldição do “dedo podre” e inaugurar uma nova trajetória afetiva. Lembre-se que apontar o dedo para outro lado depende basicamente de você.
(Texto extraído da Coluna do Dr. Jairo Bouer no UOL VivaBem)