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Faltam políticas específicas para saúde mental dos jovens

Sentimento de incerteza sobre o futuro faz com que os jovens não consigam elaborar planos de longo prazo - iStock
Sentimento de incerteza sobre o futuro faz com que os jovens não consigam elaborar planos de longo prazo - iStock

Uma pesquisa mostra que a probabilidade de suicídio entre adolescentes, no Brasil, tem crescido de forma mais intensa do que em outras faixas etárias.

A análise, feita por uma equipe da Escola Nacional de Saúde Pública (Ensp/Fiocruz), revela que, entre 2000 e 2022, houve alta na proporção de suicídios em relação ao total de mortes, mas essa elevação é mais acelerada entre jovens de 10 a 19 anos.

Um dos pontos destacados pelos pesquisadores é a urgência em se desenvoler políticas mais específicas para os adolescentes, uma vez que hoje as políticas para eles também incluem as crianças, que possuem necessidades diferentes.

Proporção de suicídios

O relatório, chamado “Adolescência e suicídio, um problema de saúde pública”, conta com dados do Sistema de Informações sobre Mortalidade do Brasil (SIM/SUS). Foram analisadas a proporção de suicídios entre as mortes em diferentes grupos etários: adolescentes (10 a 19 anos), jovens adultos (20 a 29 anos), jovens (10 a 29 anos), adultos incluindo jovens (20 anos ou mais), e adultos excluindo jovens (30 anos ou mais).

Veja as proporções de suicídios em relação ao total de mortes para o período entre 2000 e 2022:

  • entre pessoas de 10 a 29 anos, a proporção foi de 4%;
  • no grupo de 30 anos ou mais, a proporção foi de 0,6%;
  • entre adolescentes, a proporção foi de 3,6%;
  • entre jovens adultos, a proporção foi de 4,2%.

Tendências identificadas

Apesar de, historicamente, a contribuição dos suicídios entre as mortes de adolescentes ser menor do que entre jovens adultos, essa diferença diminuiu ao longo do tempo, pois o aumento entre adolescentes cresceu.

A probabilidade de suicídio nos dois grupos se igualou em 2019 e, desde então, tornou-se mais desfavorável para os adolescentes. Em 2022, a tendência se reverteu de forma significativa, e a chance indivíduos de 10 a 19 anos provocarem a própria morte foi 21% maior do que entre jovens adultos. Tal mudança ocorreu durante a pandemia de Covid-19.

Incertezas sobre o futuro

Para os pesquisadores, os dados geram uma hipótese importante de que o suicídio avança de forma mais acelerada entre os jovens. Veja o que afirma um dos autores do estudo, Raphael Guimarães: 

De alguma forma, isso sugere que as questões contemporâneas penalizam mais os jovens, seja pela incerteza no futuro, seja pela menor resiliência da geração Z”.

O pesquisador da Ensp/Fiocruz avalia ainda que a saúde mental de adolescentes e jovens é influenciada pelo cenário econômico e pela crise climática. “Estes fatores criam um sentimento de incerteza sobre o futuro, que em muitos casos paralisam os jovens a elaborar planos de longo prazo”. 

Aumento mais intenso entre os mais novos

Na população geral, em 2022, houve uma taxa de crescimento de suicídios equivalente a 4 vezes a do primeiro do período analisado. Na mesma comparação entre o fim e o início da série histórica, os grupos etários de 10 a 29 anos apresentam taxa semelhante, de 4,47 vezes de alta.

No entanto, ao dividir esse grupo, a taxa dos jovens de 20 a 29 anos sobe para 6,83 vezes. Já no recorte entre os 10 e 19 anos, o aumento dos suicídios em 2022 na comparação com o ano 2000 foi alarmante, de 53,6 vezes. Ou seja: o crescimento de suicídios entre os jovens é maior do que nas outras faixas etárias, com uma tendência muito mais intensa entre os mais novos. 

Mudança de perfil demográfico

Embora os indicadores de suicídio no Brasil sejam historicamente mais baixos do que em outros países, eles vêm crescendo, especialmente entre jovens adultos do sexo masculino em áreas urbanas.

Outro alerta feito pelo estudo é sobre a relação dos dados com a mudança do perfil demográfico do país, caracterizado pela redução da população jovem e aumento da população idosa.

Necessidade de abordagem específica

“O grupo de adolescentes começa a demandar maior atenção da linha de cuidados infantis, o que representa um desafio para os gestores. Como a população de 10 a 19 anos possui suas demandas, enfatizamos a necessidade de uma abordagem diferenciada para esse grupo”, afirmam os autores. 

Eles mencionam uma iniciativa em curso do Ministério da Saúde, que criou um Termo de Execução Descentralizado que visa criar subsídios para a construção dessa agenda política mais específica.

Onde buscar ajuda

Existem alguns serviços muito bacanas com os quais você pode contar caso precise de ajuda. Um deles é o CVV (Centro de Valorização à Vida), que você pode acessar ligando no 188 ou pelo site (cvv.org.br). Inclusive há um chat que pode ser usado para se conectar com alguém.

Tatiana Pronin

Tatiana Pronin

Jornalista e editora do site Doutor Jairo, cobre ciência e saúde há mais de 20 anos, com forte interesse em saúde mental e ciências do comportamento. Vive em NY e é membro da Association of Health Care Journalists. Twitter: @tatianapronin