Conforme as convenções de gênero se tornam menos rígidas, a beleza se torna mais “democratizada”, e os homens, cada vez mais, ganham liberdade para mergulhar no consumo desse mercado. E isso inclui até o Oriente – basta observar os “beauty boys”, no Japão, e os K-poppers, na Coreia, que apostam em pele macia e lábios carnudos.
A tendência foi apontada por uma grande pesquisa encomendada pela Allergan Aesthetics à Wunderman Thompson Intelligence, e que contou com escuta social, análise de mídias e entrevistas com 15 especialistas considerados líderes em estética em 13 países.
A dermatologista Ligia Colucci, integrante da Sociedade Brasileira de Dermatologia e única brasileira que colaborou com o relatório, explica que hoje não se pode mais focar em apenas mulheres, e nem mesmo na antiga divisão "só para homem" ou "só para mulher", já que existem pessoas não binárias. “Também há grupos que não se sentem pertencentes a nenhum sexo específico e também temos que estar abertos a eles”, acrescenta.
Ela conta que os consultórios estão cada vez mais cheios de homens em busca dos mesmos tratamentos solicitados pelas mulheres. “Em primeiro lugar, eles vêm para fazer botox, para ver se gostam”, comenta, apontando o procedimento estético mais buscado por esse “novo homem”. Eles também querem aliviar as rugas na testa, acabar com o suor excessivo nas axilas (especialmente os que trabalham de terno) e também preencher os pés de galinha (com ácido hialurônico).
“Após a pandemia, houve uma procura maior pelo bioestimulador de colágeno também, porque os homens perceberam nas reuniões online que é necessário se cuidar”, relata. Outros procedimentos bastante buscados por eles, segundo a médica, são a depilação a laser (principalmente para evitar pelos encravados no rosto e pescoço) e os tratamentos para reduzir gordura localizada sem cirurgia (como o CoolSculpting). Esses também são os tratamentos mais buscados pelos brasileiros, em geral.
A idade também determina muito o que cada homem busca. Aqueles com mais de 50 anos buscam os tratamentos porque precisam se manter competitivos no mercado de trabalho. Já os na faixa dos 40, porque algo na aparência incomoda. E os mais jovens estão mais atentos ao fato de que, ao começar a se cuidar mais cedo, será mais fácil adiar o envelhecimento mais adiante.
A pesquisa da Allergan mostra que, embora os homens representem apenas 14,3% do mercado global de procedimentos não invasivos, os profissionais entrevistados estão prontos para uma expansão. No Brasil, no Reino Unido e nos Emirados Árabes, eles já representam cerca de 30% da base de clientes.
O relatório também destaca que a beleza "sem gênero" não é algo novo. Até o século 18, os homens não se importavam em aplicar cores e pós em seus rostos e perfumar seus corpos. Mas agora, a tendência tem a ver com a crescente aceitação da noção de que gênero não é algo fixo no nascimento.
Cerca de 1% dos adultos em todo o mundo não se identifica como homem ou como mulher, segundo pesquisa de 2021 feita pela Ipsos com 19 mil pessoas em 27 países e citada pelo relatório. Entre a Geração Z, essa proporção sobe para 4%. Assim, para os jovens, gênero é um conceito cada vez mais mutável, que eles esperam que permaneça fluido ao longo de suas vidas.
O Brasil é um dos principais países que mais realiza procedimentos estéticos no mundo. De acordo com outro estudo, o Além dos Filtros, que embasou a campanha Assuma Sua Imagem, da Allergan Aesthetics, 89% dos brasileiros acreditam que cuidar da aparência é o terceiro hábito mais importante para o bem-estar, atrás apenas de alimentação saudável e prática de atividade física.
A pesquisa, de 2022, contou com 650 pessoas (24% homens e 76% mulheres), entre 18 e 50 anos, de oito capitais brasileiras. Os procedimentos mais realizados no último ano foram: depilação a laser, clareamento dental, botox, preenchedores faciais à base de ácido hialurônico e laser.
Tatiana Pronin
Jornalista e editora do site Doutor Jairo, cobre ciência e saúde há mais de 20 anos, com forte interesse em saúde mental e ciências do comportamento. Vive em NY e é membro da Association of Health Care Journalists. Twitter: @tatianapronin