Jairo Bouer Publicado em 08/04/2021, às 14h03
O BBB21 entra na reta final e os dez participantes que restaram na casa revelam uma demografia interessante das movimentações e aspirações sociais da nossa sociedade: cinco mulheres, dois homens gays, um hétero que se sente mais confortável entre esses gays e essas mulheres do que entre os outros homens da casa, e apenas dois brothers que se enquadram no que os demais participantes chamam de “Macholândia”.
Por que foram estes os poupados pelo público até agora? Estratégias e alianças à parte, os jogadores escolhidos revelam alguns anseios importantes de uma sociedade que muda e avança a despeito de um ranço conservador que tomou conta de alguns setores dos poderes políticos do país.
A eliminação de Rodolffo, espécie de líder da turma das brincadeiras inadequadas e de uma certa truculência na tentativa de impor seus pontos de vista, põe na mira da eliminação dos paredões nas próximas semanas os dois outros membros desse clã.
Tá certo que Big Brother é um jogo e que ele distorce a realidade, ainda mais em um momento de uma quase profissionalização do trabalho com a imagem dos participantes. Mas mesmo levando-se em consideração as situações extremas impostas pelo confinamento não parece casual que os espectadores se identificaram com a composição atual da casa. Da mesma forma não é à toa que Juliette e Gil, segundo as enquetes do UOL, despontam como os favoritos ao título.
Ela, mulher nordestina, advogada, maquiadora, antes desconhecida, que sofreu uma série de exclusões e rejeições por parte dos demais participantes, vista pela casa como alguém que fala demais, tensiona e tenta impor seu ponto de vista o tempo todo, mas detentora de uma capacidade única de acolhimento e empatia. Ju é a amiga que todos gostaríamos de ter.
Gil é homem gay nordestino, de origem humilde, em fase de concluir um doutorado em economia e uma “bomba humana” de emoções, prestes a explodir a qualquer momento. Antagonista de diversos participantes da casa, ele traz nos seus excessos emocionais (nas brigas e nas festas) uma verdade que talvez a gente busque no mundo aqui fora. Ju e Gil geram uma forte identificação com a audiência e encarnam muitas das aspirações desse momento atual do mundo.
Por fora correm o outro participante gay, o professor João, e a garota “descolada” e rainha das redes sociais Viih Tube, que apesar de serem os dois que talvez melhor leiam todas as movimentações do jogo, não tem o mesmo carisma e a empatia dos dois anteriores.
Quase todos esses favoritos refeltem em alguma medida algumas bandeiras importantes do mundo real. Enquanto as mulheres aqui fora assumem um discurso muito mais empoderado, feminista, antimachista, sem perder afeto e acolhimento, homens na casa atribuem, a essa altura do campeonato, atitudes misóginas ao fato de serem chucros, pouco informados, do interior, “criados na rua”, não cola mais para segmentos significativos de um Brasil em transformação.
Da mesma forma, falas de cunho homofóbico e racista são cada vez menos toleradas, em um momento em que negros e gays lutam por seu lugar de direito no mundo e assumem um discurso permeado por um importante ativismo político e social.
A saída de Rodolffo, por exemplo, foi selada após João expor sua dor e sofrimento por uma brincadeira racista do cantor sertanejo sobre seu cabelo. O público enxergou claramente essa ferida e não deixou passar barato! É lógico que a eliminação não foi apenas por conta dessa situação específica, mas em contraste com os outros emparedados pode ter sido o “tiro de misericórdia”.
E os outros dois aliados de Rodolffo estão na mira? As reações de Arthur que, em sucessivos arroubos de impulsividade vem destratando Juliette e Fiuk (outro participante querido pelo público por expor suas fragilidades emocionais e sua visão mais aberta desse mundo em mudanças), devem também fazer com que ele seja despachado em breve para sua casa. Assim como Caio, que sem seu “bastião” de plantão (talvez a relação mais intensa entre dois participantes da casa desde o início dessa edição), e com sua visão mais estreita do jogo e das atuais aspirações sociais do país, também deve deixar a casa em um futuro bem próximo.
Claro que, como em qualquer jogo, a qualquer momento, tudo pode mudar. Mas qualquer que seja o resultado, ele deve apontar para um desejo do público de ver retratada na sua telinha aquilo que ele acredita ser um mundo mais justo e melhor para todos, principalmente para mulheres, negros e gays, que tantas exclusões e discriminações sofreram historicamente no Brasil. Para os demais, o BBB21 pode ter sido um exercício de intenso aprendizado. Assim a gente espera!
(Texto extraído da Coluna do Jairo Bouer no UOL VivaBem)