Redação Publicado em 28/08/2024, às 14h00
Quando meninos e meninas chegam à adolescência, eles são bombardeados com mensagens que associam atração à violência. Elas vêm de colegas, séries de TV, filmes, músicas, redes sociais e assim por diante.
Muitas dessas mensagens retratam meninos com atitudes agressivas e desrespeitosas em relação às meninas como atraentes, enquanto aqueles que as tratam bem são mostrados como "sem graça".
Mensagens que ligam atração a agressividade e desprezo podem ocorrer em diferentes contextos e de várias maneiras, e essa associação é conhecida como “discurso dominante coercitivo”.
A exposição prolongada a esse discurso leva meninas a considerarem meninos violentos como atraentes, eventualmente empurrando-as para relacionamentos emocionais e sexuais tóxicos.
Em um estudo recente, pesquisadores analisaram as formas pelas quais esse discurso se manifesta dentro de um grupo de colegas, levando algumas meninas a ficar com meninos que não as tratam bem e demonstram atitudes e comportamentos violentos.
Para fazer isso, eles entrevistaram 59 meninos e 71 meninas de 3 diferentes escolas secundárias de Barcelona, na Espanha, todos com idades entre 15 e 16 anos. Eles contaram sobre suas interações em com grupos de colegas dentro e fora da escola.
O estudo foi publicado no Journal of Urban Health e divulgado no site The Conversation.
O grupo de colegas é um dos contextos mais importantes para a socialização e aprendizagem dos adolescentes, e a pressão dos colegas pode levar algumas meninas a se envolverem com meninos violentos, mesmo que elas não queiram.
Os colegas também exercem pressão sobre as meninas, dizendo repetidamente que elas deveriam gostar de meninos com atitudes e comportamentos violentos, o que faz com que muitas delas acabem gostando – ou acreditando que gostam – desse tipo de menino.
Essa pressão leva ao comportamento violento ser normalizado e aceito, e até mesmo as meninas a confundirem isso com amor, empurrando-as para relacionamentos tóxicos.
A pressão dos colegas também está enraizada nas mensagens da mídia às quais os jovens são expostos.
Por sua vez, os meninos são pressionados a seguir padrões de masculinidade violenta e desdenhosa se quiserem ser atraentes e bem-sucedidos com as meninas.
Para meninas que já estão em um relacionamento estável com um menino que não é violento, o discurso dominante coercitivo no grupo as rotula como “chatas” e as pressiona a trair seus namorados com meninos que demonstram atitudes e comportamentos mais violentos.
Isso ocorre porque, como explicaram as meninas que participaram da pesquisa ao contar sua experiência, “essa é a parte divertida”.
Os comportamentos violentos incluem se gabar de ter ficado com alguém e depois menosprezar a garota, tratá-la mal na frente dos outros e também quando estão sozinhos.
Há meninas que acabam cedendo a essas pressões, ficando com pessoas que não querem e traindo pessoas de quem gostam, porque não querem ser consideradas chatas em seu grupo e têm medo de perder seus amigos. E o papel de seus colegas nem sempre para por aí.
O assédio pode continuar quando os “amigos”, por exemplo, tiram fotos de uma menina com um menino e enviam a foto para o namorado da garota, quando não as publicam nas redes sociais, prejudicando o relacionamento dela.
Pesquisas científicas demonstraram que a violência de gênero tem consequências negativas para a saúde, incluindo dor crônica e um risco aumentado de doenças sexualmente transmissíveis, depressão e tendências suicidas.
Cerca de 27% das mulheres e meninas de 15 a 49 anos já sofreram alguma forma de violência física ou sexual, por isso é necessário identificar os fatores que aumentam o risco de violência de gênero, especialmente entre meninas mais jovens que estão em seus primeiros relacionamentos.
A pesquisa mostra que essas “ficadas” com caras agressivos são um desses fatores que aumentam o risco de violência de gênero entre adolescentes, pois fazem as meninas normalizarem e sentirem atração pela agressividade.
Além disso, quando essas ficadas são compartilhadas entre muitas pessoas ou online, aquilo fica ligado à garota para sempre, com consequências potencialmente graves para sua saúde. Como uma delas disse: “A foto vai te seguir até o túmulo. Algumas pessoas acabam cometendo suicídio porque dói demais.”
Colocar pressão sobre as meninas para que entrem em relacionamentos abusivos ou desprezíveis aumenta a probabilidade de que elas sejam vítimas de violência de gênero.
Mas, assim como o grupo de colegas de uma menina pode pressioná-la a entrar nesses relacionamentos, ele também pode ajudar a evitá-los.
Na pesquisa, as meninas falaram sobre a pressão dos colegas ou “medo de perder seus amigos”, mas também mencionaram “amigos falsos” que as pressionam a se relacionar com alguém com quem não queriam estar.
Para os pesquisadores, trabalhar a qualidade das amizades desde cedo pode ser uma parte importante para prevenir e proteger contra a violência de gênero.