Quando lapsos de memória devem preocupar? Médico responde

Neurologista explica algumas possíveis causas para esquecimentos frequentes

Tatiana Pronin Publicado em 22/06/2021, às 19h34

Pequenos lapsos são comuns, mas há casos em que é preciso buscar um especialista - iStock

Esquecer onde deixou a chave ou do aniversário de um amigo é algo que todos nós, mortais, já vivenciamos ou iremos vivenciar. Mas lapsos de memória frequentes podem atrapalhar bastante a nossa vida e, para quem passou dos 50 anos, há sempre a preocupação de que esse seja o sintoma de algo mais sério. Afinal de contas, quando é preciso consultar um médico?

Antes de mais nada, é bom ter uma noção de como funciona o processo de armazenamento de informações no nosso cérebro. Segundo o neurologista Tarso Adoni, coordenador da residência médica nessa especialidade do Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo, existem diferentes tipos de memória, mas, didaticamente, é possível dividi-los em três tipos:

  1. Memória de trabalho: é a que usamos para, por exemplo, repetir (em voz alta ou mentalmente) um número de telefone que nos foi recentemente informado e, que, logo após digitado, cai no esquecimento. Esse tipo de memória depende das regiões mais anteriores do cérebro, chamadas em conjunto de "circuitaria córtico-subcortical frontal".
  2. Memória de curto prazo: é aquela relacionada a fatos recém-aprendidos e situações recém-vividas. Por exemplo, quando você é apresentado a alguém, dependendo de sua relevância (se é seu chefe, ou um futuro amor), essa informação será armazenada em uma área chamada hipocampo, localizada no lobo temporal. Depois de três ou seis meses, em média, aquela informação relevante sairá do hipocampo e será consolidada em áreas dispersas da substância cinzenta nos vários lobos do cérebro (frontal, temporal, parietal ou occipital). Assim, ela se converterá numa memória de longo prazo.
  3. Memória de longo prazo: é aquele que se relaciona a eventos da nossa vida (chamada também de "memória episódica"), como onde passamos as férias do ano passado, o endereço de casa, a recordação de ter quebrado a perna aos 14 anos jogando bola na rua ou andando de bicicleta etc. Esse tipo de memória também se relaciona a fatos conhecidos (chamada também de "memória semântica"), tais como a data da queda da Bastilha ou do descobrimento do Brasil.

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Falhas aumentam com o tempo?

Pequenos esquecimentos são comuns. “A analogia que mais se presta a explicar esses pequenos lapsos de memória, embora algo rudimentar, é comparar o nosso cérebro à memória de um computador. Todos nós sabemos que, conforme o computador vai sendo usado e seu disco rígido é ocupado por informações que são lá armazenadas, ele vai ficando cada mais lento, a velocidade de processamento de informações diminui”, conta Adoni, que também é membro do conselho editorial da Trevoo, plataforma gratuita de busca de casas de repousos e residenciais para idosos.

“Imagine a quantidade de situações que já foram vivenciadas por um indivíduo de 60 anos: pessoas que conheceu (e que segue conhecendo, claro), lugares que visitou, ocasiões festivas e outras não tão festivas assim, viagens, empregos, endereços e assim por diante? Agora, por outro lado, compare com o disco rígido relativamente “vazio” de um jovem de 20 anos: é fácil entender a diferença no desempenho da memória entre os dois”, diz. Para ele, uma certa lentidão é o preço a ser pago por um cérebro, ou seja, uma vida, rica em experiências.

Quando se preocupar?

No entanto, há, de fato, algumas situações que passam do esquecimento por “HD cheio” para um problema mais sério que deverá ser melhor esmiuçado. Qual o limite entre um esquecimento trivial e aquele que preocupa? O especialista dá algumas dicas: “Por exemplo, quando os esquecimentos passam a prejudicar ou colocar em risco a pessoa: esquecer o fogão aceso reiteradamente, perder-se em trajeto habitual, tomar o remédio prescrito em dose dobrada ou não tomá-lo”, descreve.

Outra queixa bastante frequente por parte dos familiares que merece cuidado, de acordo com o médico, é quando o indivíduo se torna “muito repetitivo” e, aqui vem o detalhe mais importante do sintoma, não percebe: “A pessoa repete várias vezes a mesma coisa (uma história ou uma pergunta), mas tem a convicção de que sempre é a primeira vez”.

Como evitar problemas de memória?

Quem quer manter uma memória afiada por mais tempo deve cuidar da saúde como um todo: “Podemos, simplificadamente, lembrar da seguinte regra: tudo o que é ruim para o coração é ruim para o cérebro também”, ensina o médico.

Em outras palavras, pressão alta, diabetes, colesterol alto, obesidade, sedentarismo, tabagismo, etilismo e estresse podem ter impacto na memória, assim como na saúde cardiovascular. Outros possíveis fatores de risco conhecidos, segundo Adoni, são traumatismo craniano grave ou de repetição (lutadores de MMA ou boxe, por exemplo), baixa escolaridade, pouco convívio social, problemas auditivos e, mais recentemente, poluição

Dicas importantes

Idosos que vivem sozinhos e começam ter esquecimentos frequentes devem procurar um especialista assim que possível. “Estima-se que até 30% de todas as queixas de dificuldade com a memória sejam provocadas por situações potencialmente reversíveis, tais como distúrbios de humor (depressão, por exemplo), disfunção da tireoide, déficits vitamínicos específicos e efeito colateral de medicamentos, para citar apenas algumas”, informa o especialista.

Para aqueles que querem minimizar o risco de problemas de memória, a melhor atitude é ter um estilo de vida saudável e tratar daquelas doenças que podem colocar o cérebro em risco, como hipertensão, colesterol alto, níveis elevados de açúcar no sangue altos, excesso de peso etc. Fazer exercícios regularmente, não fumar e não abusar do álcool também fazem parte do pacote.

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