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Químicos em alimentos aumentam riscos de câncer de mama, aponta estudo

É preciso observar a procedência e optar pelos alimentos orgânicos, se possível, para promover mudanças positivas na saúde - iStock
É preciso observar a procedência e optar pelos alimentos orgânicos, se possível, para promover mudanças positivas na saúde - iStock

Há muitos anos, cientistas vêm alertando para o perigo de várias substâncias não só ao ser humano como ao próprio planeta. Agora, uma nova pesquisa, publicada pelo jornal científico Environmental Health Perspectives, apontou mais de 900 químicos presentes em alimentos e bebidas, como agrotóxicos, que podem levar ao aumento de risco para câncer de mama. Entre outras consequências, esses elementos afetam o sistema endócrino e podem gerar desequilíbrio hormonal nas mulheres.

A pesquisa foi composta pela análise de resultados de diversos químicos, principalmente aqueles que afetam os alimentos, como os agrotóxicos, em roedores, fazendo um paralelo entre o animal e humanos. O objetivo era evidenciar que muitos desses produtos químicos geram efeitos similares no desenvolvimento da glândula mamária, incluindo a alteração da lactação, desenvolvimento alterado na puberdade, aumento da densidade do tecido mamário e aumento do risco de câncer em roedores, frequentemente por afetar a regulação hormonal.

De acordo com Carolina Martins Vieira, oncologista clínica e pesquisadora do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais e do grupo Oncoclínicas, o câncer de mama é, na maioria das vezes, uma doença hormonal, ou seja, é decorrente do desequilíbrio de hormônios nas glândulas mamárias. Portanto, ao identificar e compreender o papel dessas substâncias químicas na saúde da mama é possível diminuir o risco desse câncer especificamente.

Identificação difícil

Realizado por pesquisadores do Instituto Silent Spring, Universidade de Massachusetts Amhers, Universidade de Medicina Tufts, Instituto Nacional de Alimento, Instituto Nacional de Saúde dos Estados Unidos, o estudo Chemical Effects on Breast Development, Function, and Cancer Risk: Existing Knowledge and New Opportunities indica que as abordagens toxicológicas atuais muitas vezes são insuficientes para detectar esses efeitos, dificultando a identificação de exposições prejudiciais e limitando as oportunidades de prevenção.

Carolina também destaca a necessidade de uma abordagem mais rigorosa por parte da comunidade médica e dos órgãos de vigilância sanitária em relação às avaliações de produtos químicos, especialmente aqueles adicionados aos alimentos. Ela lembra que é imperativo que, diante das evidências crescentes sobre os riscos associados a determinadas substâncias, seja implementada uma abordagem mais proativa para garantir a segurança dos consumidores. A prevenção começa com a identificação e regulamentação eficaz dessas substâncias, visando mais saúde para todos.

Outra recomendação da especialista é com a conscientização sobre a qualidade dos alimentos consumidos, como observar a procedência e optar pelos orgânicos, se possível, para promover mudanças positivas na saúde.

Brasil: maior consumidor

A médica nutróloga Marcella Garcez lembra que nos dias atuais, o Brasil é o maior consumidor de agrotóxicos do mundo e essas substâncias, criadas para reduzir a quantidade de pragas e facilitar a vida do agricultor, podem também ser responsáveis por consequências indesejáveis para a saúde do produtor, do consumidor e do meio ambiente.

Ela alerta que os impactos deletérios do uso de agrotóxicos sobre o ambiente e a saúde humana são ainda mais graves em virtude do precário monitoramento da exposição aos agrotóxicos. Isto porque há uma importante lacuna no que diz respeito à clareza de informações sobre os processos particulares e estruturais na determinação da saúde e de doenças ligadas ao uso desses pesticidas.

E acrescenta que os danos diretos e indiretos dos agrotóxicos na saúde, imediatos, de médio ou a longo prazo, são grandes preocupações da comunidade científica e da sociedade em geral, há décadas. A toxicidade é uma característica intrínseca dos agrotóxicos e seus efeitos são condicionados pelo contexto e modo de produção, pelas relações de trabalho e consumo, caracterizados pela precariedade dos mecanismos de vigilância em saúde.

Marcella ainda enfatiza que a população consumidora, exposta cronicamente a quantidades excessivas de defensivos agrícolas, pode apresentar danos no tecido hematopoiético [que dá origem às células sanguíneas] e no fígado, além de alterações hormonais e nos sistemas reprodutores masculinos e femininos.

Muito além do câncer

Os agrotóxicos podem estar relacionados a inúmeras consequências indesejáveis na saúde humana que incluem alergias, alterações nos sistemas hematopoiético, imunológico, nervoso, gastrintestinal, respiratório, circulatório, endócrino, reprodutivo, de pele e do tecido subcutâneo, podendo causar diretamente um conjunto de doenças, como neoplasias, ou favorecer a manifestação de outras enfermidades, sofrimento físico e mental, mortes acidentais e suicídios. Muitas das doenças referidas em estudos e documentos representam efeitos crônicos, ou seja, quando há exposição ao princípio ativo em doses baixas por longos períodos.

Segundo a nutróloga, mais informações a todos os envolvidos, desde a fabricação até o consumo desses produtos, e mais pesquisas acerca da ingestão de alimentos contaminados e sua exposição em longo prazo são necessários para garantir uma proteção adequada aos agravos potencialmente advindos da exposição a tais venenos. Pois, entre os principais problemas relativos ao tema, está a falta de informações sobre o consumo de agrotóxicos e a insuficiência dos dados sobre intoxicações.

Em 2015, o INCA (Insituto Nacional do Câncer) publicou o seu primeiro posicionamento acerca dos agrotóxicos, ressaltando os impactos nocivos à saúde humana e ambiental decorrentes da exposição a esse contaminante químico. Na ocasião, recomendou a redução gradativa do seu uso até a sua eliminação por completo, bem como apoiou e incentivou a agricultura agroecológica, para a promoção da saúde e prevenção do câncer na população do campo e da cidade. Porém, o projeto de Lei 1.459, de 2022, (conhecido como "PL do Veneno") que reduz as competências de órgãos fiscalizadores e flexibiliza o registro de produtos (agrotóxicos) mutagênicos, cancerígenos, teratogênicos e tóxicos para o sistema reprodutivo, foi aprovado pelo Senado em dezembro passado e seguiu para sanção presidente Lula da Silva. A aprovação pelo Senado ignorou consulta pública na qual 80% dos respondentes votaram contra o PL.

Biomedicamentos no tratamento

Já Carolina lembra que, além da prevenção, as opções terapêuticas para o tratamento do câncer de mama, por exemplo, vêm apresentando avanços significativos. O uso de biomedicamentos em terapias conjugadas, por exemplo, tem revolucionado o combate ao câncer de mama, tanto no estágio inicial quanto nos metastáticos.

Para ela, medicamentos biológicos são muito seguros e eficazes para o tratamento desta doença, com qualidade rigorosamente atestada por meio de extensivos estudos de comparação. Por apresentar custo menor do que os fármacos tradicionais, conhecidos como referência, contribuem para ampliar o acesso aos tratamentos oncológicos avançados no Brasil.

Fontes:
Carolina Martins Vieira é oncologista clínica e pesquisadora do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais e do grupo Oncoclínicas.
Marcella Garcez é médica nutróloga, mestre em Ciências da Saúde pela Escola de Medicina da PUCPR, Diretora da Associação Brasileira de Nutrologia e Docente do Curso Nacional de Nutrologia da Abran.

Cármen Guaresemin

Cármen Guaresemin

Filha da PUC de SP. Há anos faz matérias sobre saúde, beleza, bem-estar e alimentação. Adora música, cinema e a natureza. Tem o blog Se Meu Pet Falasse, no qual escreve sobre animais, outra grande paixão.  @Carmen_Gua