Radiofrequência para tratar mioma pode ser opção à retirada do útero

Procedimento por via vaginal já é aprovado no Brasil, mas ainda é realizado em poucos centros

Tatiana Pronin Publicado em 16/04/2021, às 12h12

Miomas uterinos podem causar dor, sangramentos, anemia e aumento do volume abdominal - iStock

Cerca de metade das mulheres recebe o diagnóstico de mioma uterino em algum momento da vida reprodutiva, de acordo com a Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo). Esses tumores benignos podem ser assintomáticos, mas também podem gerar muita dor, sangramentos, anemia e aumento do volume abdominal, levando à indicação de cirurgia.

Relação com estrogênio

Não se sabe exatamente o que provoca esses tumores benignos, mas seu crescimento é associado ao hormônio estrogênio. A incidência é maior em mulheres com ganho de peso e também em negras ou pardas, embora não seja possível afirmar se essa predisposição étnica é ligada a fatores genéticos ou ambientais. 

O mioma pode ser classificado como:

O diagnóstico ocorre com mais frequência a partir dos 30 anos de idade, e os miomas tendem a "murchar" após a menopausa. Por isso, se o problema não interferir na fertilidade e os sintomas forem bem controlados com medicamentos, é possível apenas acompanhar seu crescimento com exames regulares até o fim do ciclo reprodutivo. Porém, dependendo do tamanho do tumor ou de suas consequências, o tratamento cirúrgico é necessário.

Destruir o mioma, manter o útero

Os miomas são responsáveis por cerca de 300 mil cirurgias para remoção do útero (histerectomia), segundo o Ministério da Saúde. Ainda que não interfira na produção de hormônios ou na vida sexual da mulher, perder o útero representa o fim da possibilidade de engravidar – o que pode ser extremamente doloroso para quem não teve filhos, e também ter impacto psicológico em pacientes mais maduras.

Os miomas são tumores benignos que podem se formar dentro do útero, ou no seu revestimento interno ou externo (Freepik)

É nesse contexto que cirurgias minimamente invasivas para o tratamento de miomas vêm ganhando espaço como alternativa à histerectomia. É o caso da ablação por radiofrequência, procedimento relativamente novo no Brasil, que consiste em destruir o tumor com altas temperaturas. A agulha é acoplada ao aparelho de ultrassonografia transvaginal, o que diminui a necessidade de cortes e permite alta no mesmo dia. 

"O procedimento é realizado em centro cirúrgico, com sedação, e dura 30 minutos, em média", explica o médico Mariano Tamura, coordenador do Instituto de Miomas do Hospital Moriah, em São Paulo. A morte celular induzida pelo calor faz com que o mioma perda cerca de metade do seu volume, o que traz enorme alívio para os sintomas e, como consequência, melhora a qualidade de vida das pacientes. Esse é o foco, aliás, de um estudo que Tamura vem coordenando no hospital, com mulheres de 18 a 45 anos de idade que serão acompanhadas durante três anos após a cirurgia. Na entrevista abaixo, ele traz mais detalhes sobre o tema.

Quais os tipos de miomas ou em quais situações há indicação de cirurgia?

Os miomas que estão voltados para o interior da cavidade uterina, desde os completamente submucosos até os que abaulam a camada interna que reveste o útero (endométrio) são relacionados a sangramento uterino aumentado e, eventualmente, quando há falha do tratamento medicamentoso, necessitam de tratamento cirúrgico ou intervencionista. Além disso, os miomas volumosos que estão na musculatura do útero (intramurais), ou os que são voltados para a parte externa (subserosos), podem causar sintomas compressivos, dor pélvica e cólicas intensas, que, diante da falha do tratamento clínico, também necessitam de tratamentos adicionais. Não existe um tamanho exato que nos direcione a certa conduta. É necessário avaliar cada caso individualmente, a quantidade de miomas, sua localização e os sintomas associados.

Cirurgias para remoção de miomas envolvem algum risco de aderências (cicatrizes) que podem inviabilizar uma gravidez? Procedimentos como a radiofrequência diminuem esse risco?

Qualquer procedimento cirúrgico na cavidade abdominal pode gerar aderências. Quando nos referimos à pelve, existem outras doenças que também provocam aderências e podem distorcer a anatomia dos órgãos reprodutores femininos, possivelmente levando à infertilidade, como, por exemplo, a endometriose, a doença inflamatória pélvica e, inclusive, a própria presença de miomas uterinos. Tratando-os sem cirurgia, corte, sutura e cicatrização, podemos diminuir a probabilidade de formação de aderências.

Poderia explicar em detalhes como é o procedimento com radiofrequência?

O procedimento consiste em aquecer o mioma do centro para a periferia, através de uma agulha de radiofrequência que entrega energia térmica em sua extremidade. Essa agulha é acoplada ao aparelho de ultrassonografia transvaginal, que irá guiar o procedimento em tempo real e será essencial para o posicionamento adequado dessa agulha no interior do mioma. O procedimento é realizado em centro cirúrgico, com sedação e dura 30 minutos em média. A paciente interna e recebe alta no mesmo dia, porém o efeito da radiofrequência é prolongado até seis meses, e tem como objetivo causar a redução de ao redor de 50% do volume do mioma, por meio da morte celular induzida pelo calor (necrose coagulativa), além de melhorar significativamente os sintomas da paciente e sua qualidade de vida, com baixas taxa de reintervenção.

Na ocasião do estudo que estamos conduzindo, o tratamento é indicado para pacientes que possuem até três miomas, de até 5 cm cada um, e que não tenham realizado qualquer procedimento uterino prévio (seja radiofrequência, embolização de artérias uterinas, miomectomia ou histeroscopia cirúrgica).

O procedimento tem sido feito faz tempo no Brasil? São muitos centros que realizam?

O procedimento foi aprovado nos EUA em 2012 e já foi aprovado pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária). No entanto, são poucos centros que se utilizam desse tratamento e, ao mesmo tempo, carecem estudos robustos sobre a radiofrequência em mulheres brasileiras.

É um procedimento muito mais caro que a cirurgia tradicional? Já existe cobertura por planos de saúde ou SUS (Sistema Único de Saúde)?

O procedimento envolve internação rápida, menor uso de medicação, rápido retorno às atividades habituais e baixa taxa de reintervenção e complicações associadas. Ou seja, o custo do procedimento como um todo pode ser menor que de uma cirurgia. No entanto, ainda não há cobertura pelos convênios e não é um tratamento previsto pelo SUS.

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