Redação Publicado em 05/09/2021, às 11h00
Profissionais de saúde que atuam na “linha de frente” sofreram um estresse sem precedentes na pandemia de Covid-19. Isso teve forte impacto na vida sexual desses indivíduos, como era de se esperar, e como comprova um estudo com funcionários do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP). De um universo de 1.300 profissionais de saúde, cerca de 45% relataram uma piora na qualidade de vida sexual durante a pandemia.
Se a população como um todo foi afetada pela ansiedade relacionada à chegada de uma doença grave e desconhecida, bem como pelas medidas de isolamento, médicos e enfermeiros tiveram que lidar com isso e muito mais. Além de presenciarem situações dramáticas de vida e morte todos os dias e uma sobrecarga acentuada de trabalho, experimentaram uma enorme sensação de impotência diante da falta de tratamentos eficazes. Tudo isso somado à preocupação de infectar seus familiares, por conviverem diretamente com pacientes infectados.
“Os profissionais de saúde do Brasil e do mundo são os verdadeiros heróis da pandemia. Muitos de nós nos voluntariamos para dar plantão nas enfermarias de Covid, e muitas pessoas largaram a família nos fins de semana para isso”, comentou o professor Jorge Hallak, do departamento de patologia da faculdade e do Grupo de Estudo em Saúde Masculina do Instituto de Estudos Avançados da USP, em entrevista à Rádio USP. Apesar de estarem mais acostumados a ver o sofrimento humano, é impossível não se deixar abalar.
Hallak e outros pesquisadores da universidade já publicaram diversos estudos que demonstraram os impactos da Covid-19 em estruturas do testículo, que resultam em prejuízos na função reprodutiva. Por isso, era natural que decidissem investigar como isso também interferiu na função sexual dos homens, e também das mulheres.
Confira:
O impacto foi surpreendente, ainda mais porque a amostra era jovem, com idade média de 37 anos. Também é importante destacar que a maioria dos participantes não havia adoecido (o que poderia justificar os efeitos sobre a vida sexual). A redução nos níveis de satisfação sexual foi influenciada principalmente por fatores como a queda na libido, e pela falta de uma vida noturna que possibilitasse um “arejamento” de todo o processo, como conta Thiago Teixeira, doutor em urologia pela FMUSP e um dos responsáveis pelo estudo.
“Outras situações ligadas à piora foram aumento da frequência masturbatória (tanto entre homens quanto entre mulheres) e isolamento do parceiro”, completou o médico. Em paralelo, houve uma busca maior por pornografia on-line. Mas, curiosamente, ter se masturbado mais e consumido mais conteúdo explícito não melhoraram a satisfação sexual dos participantes; pelo contrário.
A piora da satisfação sexual foi sentida por ambos os sexos. Mas parece que as mulheres sofreram mais: 45,7% delas sentiram o baque, contra 41,7% deles. Isso pode se dever ao fato de que as mulheres tendem a acumular mais funções dentro de casa e no cuidado com a família.
No quesito queda de libido, a variação foi mais expressiva: 42% dos participantes do sexo masculino relataram reduções no desejo, enquanto só 25% das profissionais reportaram a mesma queixa.
Para Hallak, o estudo pode ser extrapolado para a população em geral, tanto masculina quanto feminina. Ele contou ter atendido muito mais pacientes com piora da função sexual, e outras especialidades têm relatado o mesmo.
Casos de insônia aumentaram muito, os índices de consumo de álcool aumentaram de 35 a 50%, e o consumo de antidepressivos aumentou 36% no Brasil nos últimos dois anos, segundo o médico. “Quando se associa antidepressivo, com álcool e insônia, não tem como a parte sexual não pagar o preço”, justificou.
Por isso, ele acredita que é preciso tomar cuidado e não tentar solucionar o estresse e a ansiedade apenas com aumento na medicação, até porque esses fármacos podem ter impacto na função hormonal e, eventualmente, atrapalhar ainda mais o sexo.
Ouça a reportagem completa da Rádio USP aqui.
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