Em alguns países, o doxyPEP tem sido usado como forma de evitar a contaminação em grupos de risco
Fausto Fagioli Fonseca Publicado em 06/11/2023, às 09h00
Segundo o Ministério da Saúde, os casos de sífilis aumentaram no Brasil em todas as faixas etárias e sexos após a pandemia. Em 2021, foram 167.523 casos, recorde histórico, enquanto no primeiro semestre de 2022 (última atualização) mais de 122 mil novos casos foram registrados, de acordo com o boletim epidemiológico.
A sífilis é uma Infecção Sexualmente Transmissível (IST) causada pela bactéria Treponema pallidum. Ela pode apresentar várias manifestações clínicas e diferentes estágios, sendo transmitida principalmente por relação sexual sem camisinha com uma pessoa infectada ou para a criança durante a gestação ou parto.
Ela também é transmitida por sangue e o compartilhamento de agulhas também passa sífilis, além de poder ser congênita. Mulheres grávidas que têm sífilis podem passar para o bebê, inclusive com complicações bem graves, incluindo morte", fala Danilo Galante, urologista e sexólogo.
A sífilis congênita é quando a doença é transmitida da mãe com sífilis não tratada ou tratada de forma não adequada para a criança durante a gestação. E como prevenir a transmissão da sífilis congênita?
"Basta fazer pré-natal. Fazendo o pré-natal, a gestante tem o diagnóstico da sífilis e pode tratá-la, reduzindo o risco de transmissão para o bebê. É igual na sífilis adquirida: o jeito de você resolver a sífilis congênita é melhorar a cobertura, a testagem e o tratamento", fala Rico Vasconcelos, médico infectologista e pesquisador da FMUSP.
Nos estágios iniciais, conhecidos como sífilis primária, segundo o Ministério da Saúde, a sífilis apresenta:
Na sífilis secundária, os indícios são:
Pode haver uma fase assintomática, conhecida como sífilis latente. Nesse caso não aparecem sinais ou sintomas, sendo dividida em latente recente (até um ano de infecção) e latente tardia (mais de um ano de infecção). "A duração dessa fase é variável, podendo ser interrompida pelo surgimento de sinais e sintomas da forma secundária ou terciária", diz o site do Ministério da Saúde.
Já a fase terciária:
A ferida que surge no estágio primário dura um tempo e depois some, o que pode fazer muitas pessoas não recorrerem ao tratamento adequado. "Ela some e o paciente sente que foi curado, mas na verdade essa é só a sífilis primária, que vai evoluir para a secundária, que é uma doença da sífilis no sangue. Isso ainda pode levar a dores articulares, febre, prostração, cefaleia e dores no corpo", destaca Danilo.
Segundo ele, nesses casos a sífilis imita muito uma virose, uma dengue e, se não tratada, pode evoluir a sífilis terciária, que é quando ela tem acometimento do sistema nervoso central, da parte neurológica, que podem gerar complicações graves e permanentes.
Se a infecção não é diagnosticada e tratada, pode causar complicações graves, afetando o coração, o cérebro, os olhos, os ossos e alguns outros órgãos internos. Por isso a importância de conscientização sobre o tema e do diagnóstico precoce, que é feito através de exame físico e testes laboratoriais.
Sobre o tratamento da sífilis, quando diagnosticada, principalmente, na fase inicial, é bem simples. "O tratamento é feito com antibióticos, com a penicilina. Aqui no Brasil fazemos com benzetacil", explica a médica Maria Carolina Dalboni, ginecologia endócrina, obstetra e especialista em reposição hormonal.
Sim, a sífilis tem cura. Após o tratamento com antibióticos a pessoa fica totalmente curada e deve acompanhar através de exames laboratoriais periódicos. Quando está curada, a pessoa não transmite mais a sífilis.
Sim, uma pessoa pode pegar sífilis mais de uma vez. Uma pessoa pode contrair sífilis sempre que tiver contato com a bactéria. Por isso, é importante o uso do preservativo em todas as relações sexuais para prevenção. Ou seja, já ter pego sífilis uma vez não promove imunidade.
Nos últimos tempos, a doxiciclina, um medicamento usado para tratar IST's bacterianas, tem sido testada como forma de evitar uma infecção como a sífilis. Esse tratamento recebe o nome de doxyPEP.
Nos EUA, por exemplo, alguns estados já orietam o doxyPEP a homens que fazem sexo com homens ou a mulheres trans com pelo menos uma IST bacteriana nos últimos 12 meses. Segundo estudos, o método preventivo é cerca de 65% eficaz contra uma nova contaminação de IST's, como gonorreia, clamídia e sífilis.
Percebeu-se que alguns pacientes que tomam em até 72 horas da exposição sem preservativo evitaram contrair a sífilis em cerca de 50% a 70% dos casos (os resultados variam). Não é uma vacina, é um antibiótico que já existe, uma forma de evitar contrair a doença", fala Danilo.
Vale pontuar que doxyPEP não é só usado para sífilis. "É uma estratégia de prevenção contra IST's bacterianas, como sífilis, gonorreia e clamídia, que consiste na tomada, depois de uma relação sexual, de uma dose única do antibiótico doxiciclina, o mesmo que pode ser usado pra tratar a sífilis", explica Rico.
Segundo ele, estudos mostram que a proteção é maior para a sífilis e clamídia e menor para gonorreia. "Neste momento o mundo científico está determinando quem é a pessoa que deve tomar doxyPEP, principalmente se existe ou não o risco de haver seleção de bactérias multirresistentes pelo fato do uso desse antibiótico".
Ele explica que os Estados Unidos são o único lugar do mundo que já está recomendando de maneira oficial e que aqui no Brasil ainda se está no começo da discussão. "Mas sim, ajuda muito. Tem trabalho que mostra que reduz em quase 90% a transmissão da sífilis", conclui.
Outro exemplo similar a esse preventivo é a PEP no caso do HIV. Trata-se de um medicamento de urgência, ou seja, caso a pessoa tenha se exposto ao risco de ter contraído o HIV, ela deve se dirigir a um serviço de saúde especializado e solicitar os medicamentos da profilaxia pós-exposição. O paciente tem até 72 horas após a exposição para iniciar o tratamento, que é feito também com medicamentos e dura 28 dias. Este tratamento está disponível no SUS.
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