Muitas vezes pensamos na atração como algo que nos aproxima de outra pessoa, mas e se esse impulso não for apenas em direção a um indivíduo, mas em direção à energia que flui entre as pessoas de um relacionamento?
Uma pesquisa recente publicada no periódico Archives of Sexual Behavior identificou um fenômeno chamado "simbiosexualidade", pelo qual indivíduos se sentem atraídos pela dinâmica existente dentro de relacionamentos. As descobertas oferecem uma nova perspectiva sobre o desejo humano, sugerindo que a atração pode ser mais complexa do que imaginávamos.
O conceito de simbiosexualidade surgiu a partir de observações em discursos culturais e acadêmicos de que algumas pessoas são atraídas pelos relacionamentos entre outros, e não apenas pelos indivíduos em si. Apesar disso, o fenômeno permaneceu amplamente inexplorado, com a maioria das discussões sobre atração humana focando em dinâmicas de um para um.
"Como parte da comunidade poliamorosa, eu ouvi pessoas falando abertamente sobre a experiência de atração por casais estabelecidos", explicou a autora do estudo, Sally Johnston, professora adjunta de antropologia e sociologia na Universidade de Seattle, nos EUA.
"Em uma revisão da literatura, fiquei surpresa ao descobrir que este fenômeno tem sido amplamente ignorado nos discursos sociais e acadêmicos. Paradoxalmente, em um estudo anterior, também descobri que relacionamentos sexuais e românticos entre pessoas solteiras e casais (potencialmente motivados por atração simbiosexual) recebem muita atenção negativa em comunidades poliamorosas. Eu queria aprender mais sobre essa atração pouco estudada."
A principal fonte de dados para seu novo estudo foi um projeto maior conhecido como The Pleasure Study, que foi criado para investigar vários aspectos da identidade de gênero e do prazer sexual. A pesquisa contida no projeto consistiu em 65 perguntas que abrangiam uma ampla gama de tópicos, incluindo gênero, orientação sexual, práticas de relacionamento, origem cultural, educação e experiências específicas com casais.
Johnston se concentrou nas respostas de participantes que indicaram ter experimentado atração por um casal — definida como uma atração por duas pessoas e o relacionamento entre elas, em vez de por cada indivíduo separadamente. Dos 373 participantes no The Pleasure Study, 145 relataram esse tipo de atração.
Johnston conduziu entrevistas aprofundadas com um subconjunto desses participantes. Um total de 34 entrevistados, que anteriormente haviam indicado sua atração por casais na pesquisa, forneceram relatos mais ricos e detalhados de suas experiências.
Uma das principais descobertas foi que a atração simbiosexual é experimentada por um grupo diverso de pessoas. Embora a amostra tenha sido tendenciosa em relação a indivíduos queer e não monogâmicos devido aos métodos de recrutamento, a variedade dentro desse grupo foi notável. Os participantes variavam amplamente em idade, raça, etnia, educação e classe social, indicando que a atração simbiosexual não está confinada a nenhum grupo demográfico específico.
"Fiquei mais surpresa com a grande e diversa população de pessoas que relataram experimentar essa atração", disse Johnston ao site PsyPost.
Houve uma representação particularmente alta de indivíduos que se identificaram como queer ou não monogâmicos, sugerindo uma possível correlação entre essas identidades e a experiência de atração simbiosexual.
Por meio das entrevistas, Johnston descobriu descrições ricas do que os participantes consideravam atraente em casais. Muitos descreveram uma fascinação pela energia e dinâmica entre duas pessoas em um relacionamento. Isso incluía a coesão, carisma, multidimensionalidade e poder que os casais projetavam.
Os participantes frequentemente falavam de serem atraídos pela "sinergia" ou pela "terceira força" criada pelo casal, que era percebida como maior do que a soma de suas partes. Essa atração era distinta de ser atraído pelos indivíduos dentro do casal; tratava-se especificamente da dinâmica relacional que eles criavam juntos.
Johnston também identificou vários temas comuns nos tipos de relacionamentos que eram atraentes para aqueles com desejos simbiosexuais. Eles mencionaram serem atraídos por casais que demonstravam forte intimidade, comunicação de alta qualidade e uma dinâmica lúdica ou sexualmente aberta.
Alguns eram especificamente atraídos pela aparência física do casal como uma unidade, enquanto outros eram atraídos pela inerente diversidade queer ou de gênero dentro do relacionamento.
Outra descoberta significativa foi que, para muitos participantes, a atração simbiosexual era uma experiência inesperada e desconhecida. Vários a descreveram como algo que inicialmente não haviam reconhecido ou tiveram dificuldade em articular. Essa falta de linguagem e reconhecimento provavelmente contribuiu para um senso de incerteza ou até hesitação sobre a validade ou "normalidade" de sua atração.
Apesar disso, para alguns, a atração simbiosexual era um aspecto profundo e central de sua identidade sexual, sugerindo que esse fenômeno pode ser um componente importante de um espectro mais amplo do desejo humano.
O estudo de Johnston também destacou o potencial estigma social e os desafios enfrentados por aqueles que experimentam atração simbiosexual, particularmente dentro de comunidades não monogâmicas.
Indivíduos que experimentam essa atração são às vezes chamados de "unicórnios" — um termo que descreve alguém disposto a se envolver em relacionamentos românticos ou sexuais com casais estabelecidos. No entanto, esse rótulo, embora popular, muitas vezes simplifica demais a complexidade da atração simbiosexual.
Para Johnston, é preciso repensar a natureza da atração e do desejo humanos como apenas experiências de um para um. "Também precisamos desafiar o estigma e a discriminação contra essa atração dentro da comunidade poliamorosa", afirmou.
Vale comentar que o rótulo ‘atração simbiosexual’ não foi mencionado para os participantes durante o estudo quando questionados sobre suas experiências de atração por casais. "Não se sabe se o rótulo ressoará para todos os participantes", disse a autora.
Mais pesquisas também são necessárias para explorar a prevalência da simbiosexualidade na população geral e entender como ela se cruza com outros aspectos da identidade, como gênero e orientação sexual.
Também seria benéfico investigar os impactos psicológicos e emocionais da atração simbiosexual. Por exemplo, como essa atração influencia a satisfação no relacionamento ou a saúde mental? Existem experiências de vida particulares ou características pessoais que tornam alguém mais propenso a experimentar atração simbiosexual?
Os pesquisadores também poderiam examinar a relação entre atração simbiosexual e compersão, que se refere às emoções positivas, como alegria, prazer ou contentamento, que algumas pessoas experimentam ao testemunhar ou imaginar seu parceiro se envolvendo em relações íntimas com outra pessoa.
De qualquer forma, a pesquisadora espera que este trabalho reduza o estigma tanto em comunidades monogâmicas quanto não monogâmicas, e expanda as conceitualizações do desejo nos estudos da sexualidade.
Tatiana Pronin
Jornalista e editora do site Doutor Jairo, cobre ciência e saúde há mais de 20 anos, com forte interesse em saúde mental e ciências do comportamento. Vive em NY e é membro da Association of Health Care Journalists. Twitter: @tatianapronin