Jairo Bouer Publicado em 13/01/2020, às 20h37 - Atualizado em 16/01/2020, às 20h12
O que faz uma pessoa fumar, apesar de anos e mais anos de campanhas contra o tabaco? De acordo com pesquisadores das universidades de Harvard e de Boston, a tristeza é o que está por trás disso.
Pesquisadores de diferentes áreas de atuação realizaram quatro diferentes estudos para verificar qual o peso das emoções negativas no hábito de fumar. De acordo com relatos de fumantes, qualquer sensação negativa pode deflagrar o desejo de dar uma boa tragada. Mas os pesquisadores descobriram que a tristeza exerce um papel muito mais importante, como gatilho, do que outras emoções, como medo, nojo, estresse e raiva.
Para chegar à conclusão, a equipe contou com estudiosos de diferentes áreas de atuação, e realizou quatro diferentes pesquisas com, ao todo, quase 12 mil pessoas com mais de 20 anos de idade.
Em primeiro lugar, os pesquisadores analisaram dados de 10.685 pessoas, e viram que relatos de tristeza foram associados não só ao tabagismo, em geral, como também à tendência a voltar a fumar, mesmo depois de duas décadas de abstinência. Quanto mais triste era a pessoa, maior era a probabilidade de usar tabaco, ou de retomar o vício depois de ter conseguido parar. Outras emoções negativas não apresentaram o mesmo impacto para os participantes, de acordo com a análise.
Com os dados em mãos, a equipe desenhou um experimento para testar se a tristeza pode mesmo ser considerada uma causa por trás do fumo. Foram recrutados 425 tabagistas, divididos em três grupos: o primeiro assistiu a um vídeo triste, sobre a perda de um companheiro de vida. O vídeo do segundo grupo tinha conteúdo neutro e o do terceiro despertava o nojo dos participantes. No fim, todos tinham que escrever sobre o que tinham visto. Conclusão? Os fumantes que viram a história triste e escreveram sobre perdas que eles próprios tinham enfrentado apresentaram maior desejo de fumar após o teste.
O terceiro experimento foi parecido com o segundo, mas contou com 700 outros participantes. De novo, os grupos assistiram aos filmes e escreveram sobre seu conteúdo. Mas, desta vez, ainda foram submetidos a um teste adicional para verificar o nível de impaciência para fumar depois do teste. O grupo da tristeza foi, de novo, o vencedor.
O quarto e último teste contou com 158 fumantes, que tiveram que ficar oito horas sem dar um trago (o que foi comprovado com testes de monóxido de carbono). Uma parte dos voluntários assistiu ao vídeo triste, e a outra parte, a um vídeo neutro sobre trabalho. Depois, ambos tiveram o fumo monitorado, e o grupo da tristeza foi o que deu tragadas mais profundas após o experimento.
Os resultados, descritos no Proceedings of the National Academy of Sciences, podem ser úteis para a elaboração de campanhas mais eficazes contra o tabagismo. Os autores ponderam que imagens que deflagram tristeza, muitas vezes utilizadas para coibir o fumo, podem, sem querer, estímular o desejo de fumar.
Cerca de 14% da população norte-americana fuma cigarro, uma proporção um pouco maior que a de 10,2% verificada no Brasil. Os números diminuíram bastante nos últimos anos; mesmo assim, o tabagismo continua gerando um custo altíssimo para a sociedade, com doenças e mortes prematuras. Ainda falta muito para esse vício ser considerado um problema do passado.