Jairo Bouer Publicado em 28/10/2019, às 16h23 - Atualizado em 01/11/2019, às 15h29
Diversos estudos já mostraram que o uso frequente de substâncias como álcool e maconha pode ter repercussão na saúde física e mental dos filhos de usuários. Mas uma pesquisa que acaba de ser publicada pela Universidade de Washington, nos EUA, sugere que não é só o abuso ao longo da vida que conta – consumir cannabis apenas durante a adolescência também pode ter impacto para os descendentes.
O trabalho, publicado no periódico Psychology of Addictive Behaviors, analisou duas gerações consecutivas. Os pais eram homens e mulheres de 426 famílias norte-americanas que foram entrevistados a partir de 1980. Em 2002, quando os participantes tinham cerca de 27 anos de idade, aqueles que tiveram filhos foram recrutados novamente, e as crianças foram acompanhadas até a adolescência.
A primeira geração analisada foi dividida em quatro diferentes grupos: 1) não usuários; 2) pessoas que usaram maconha somente na adolescência; 3) indivíduos que iniciaram o uso só por volta dos 20 anos de idade; e 4) usuários crônicos ou frequentes. Os pesquisadores avaliaram uma série de marcadores de saúde e qualidade de vida, como uso de outras substâncias (como cigarro e álcool), nível de atenção, notas na escola ou na faculdade, comportamentos de risco, envolvimento em crime e situação financeira.
Usuários crônicos apresentaram piores condições de saúde e qualidade de vida em relação a não usuários, segundo a primeira análise. E aqueles que limitaram o uso de maconha à adolescência ficaram no meio do caminho, com desempenho acadêmico e situação financeira pior que a de não usuários.
Então a equipe foi examinar a geração seguinte, ou seja, os filhos e filhas desses participantes do primeiro estudo. Ao todo, 380 famílias foram incluídas na segunda leva. Como esperado pelos pesquisadores, crianças e adolescentes cujos pais eram usuários crônicos apresentaram uma tendência maior a usar álcool e maconha.
Mas o que surpreendeu a equipe foi o comportamento dos filhos de quem usou maconha apenas na adolescência: eles foram 2,5 vezes mais propensos a usar maconha e 1,8 mais propensos a consumir álcool em relação aos filhos de não usuários.
Filhos de indivíduos que começaram a usar maconha mais tarde, por volta dos 20 anos, não apresentaram a mesma tendência a usar substâncias psicoativas. Porém, o estudo indica que essas crianças e adolescentes apresentaram problemas de atenção e notas mais baixas na escola.
Ainda são necessárias mais pesquisas para confirmar esses resultados e entender essa conexão. É possível, por exemplo, que o impacto de uma geração para outra tenha a ver com atitudes em relação à maconha – muitos pais não veem grandes problemas em flagrar o filho adolescente com a droga porque eles próprios tiveram suas aventuras na juventude e depois pararam.
Nos EUA, 33 Estados já legalizaram o uso medicinal e/ou recreativo da maconha, por isso é fundamental que esse impacto futuro seja bem investigado. No Brasil, a droga ainda é proibida, mas as opiniões sobre ela têm sido mais moderadas, o que pode aumentar o acesso dos adolescentes à substância. Seja você contra ou a favor da liberação, a maconha (assim como álcool) deve ser evitada pelos mais jovens.