Wellington Lourenço Oliveira e Thais Bento Lima da Silva Publicado em 01/09/2022, às 10h00
O Declínio Cognitivo Subjetivo (DCS) trata-se de uma mudança subjetivamente relatada no desempenho (como memória, linguagem e orientação), não detectado objetivamente por meio de testes. Além de ausência de comprometimento nas atividades de vida diária.
Todavia, vários termos e definições são utilizadas na literatura científica. Algumas terminologias mais comuns, além de DCS, são “comprometimento cognitivo subjetivo”, “declínio de memória subjetiva”, “prejuízo da memória subjetiva”, "queixas de memória”, entre outras.
A adoção do termo DCS tem como pressuposto que a palavra “declínio” se refere à ideia de deterioração progressiva ou uma mudança em relação ao nível anterior de funcionamento e não apenas a uma reclamação isolada. “Cognitivo” porque os sintomas não se restringem apenas à memória. Já “subjetivo” por se referir a autopercepção do desempenho cognitivo.
Diferentemente, o Comprometimento Cognitivo Leve (CCL) é uma condição sindrômica de transição entre a cognição normal e demência, detectado por meio de testes. É uma fase sintomática, porém pré-demencial de várias condições neurológicas como a doença de Alzheimer (DA). Assim, a DCS apresenta um estágio anterior em uma trajetória de declínio cognitivo.
Vários estudos têm demonstrado que a prevalência de DCS é relativamente alta e comum na população idosa. Essa prevalência aumenta conforme se elevam as faixas etárias. O DCS é um sintoma inespecífico e pode estar relacionado à inúmeras condições como envelhecimento normal, traços de personalidade, condições psiquiátricas, distúrbios neurológicos e médicos, uso medicamentos e outras substâncias. Também pode ser afetada pelo histórico cultural individual.
Foi consolidado na literatura que o CCL precede as demências de diferentes etiologias (como a DA). No entanto, algumas pessoas antes de ter um desempenho menor em avaliações cognitivas já possuem uma queixa de memória subjetiva (DCS). Inclusive, alguns estudos têm demonstrado que os pacientes com a doença têm risco aumentado de progressão para CCL e DA. Embora muitos indivíduos possam permanecer estáveis ou, mesmo em alguns casos, pode ocorrer reversão desse declínio subjetivo.
Não há um instrumento padrão-ouro usado para caracterizar e mensurar o DCS. A variabilidade do método de avaliação é muito ampla entre os estudos e isso torna muitas vezes difícil a comparação entre eles. No Brasil, existem pouco questionários DCS traduzidos e adaptados para nossa língua e cultura.
Paciente com DCS não deveriam ser negligenciados, pois isso se relaciona com os sintomas angustiantes que eles experimentam. A autopercepção das dificuldades cognitivas pode levar à raiva, aumento do estresse e medo da demência. Observa-se também que há evidências crescentes de que características de ansiedade e depressão são comuns em pacientes com DCS. Portanto, pessoas com DCS, independentemente da etiologia, se beneficiam de intervenções que melhorem o bem-estar psicológico.
Dada a falta de tratamentos baseados em evidências para oferecer aos pacientes na clínica, é preciso buscar soluções alternativas. A metacognição, a visão que um indivíduo tem sobre seu próprio funcionamento cognitivo, pode ser de relevância como alvo terapêutico. A superestimação do comprometimento pode estar associada a dificuldades na avaliação do desempenho (ou seja, dificuldades metacognitivas). Melhorar esta capacidade pode reduzir o comprometimento cognitivo subjetivo experimentado por essas pessoas.
Outra possibilidade são as intervenções psicoeducativas em grupo, pois estudos apontam para melhoria eficaz do bem-estar psicológico, relevante e importante, para pessoas com DCS.Por exemplo, a psicoeducação sobre o envelhecimento cognitivo e a ligação entre dificuldades e estresse ou ansiedade, juntamente com o gerenciamento de metas e estratégias para melhorar o treinamento de metacognição e o relaxamento. Já as intervenções cognitivas, descritas em algumas literaturas, têm efeitos moderados na melhoria do desempenho objetivo, com pouca relevância clínica para grande maioria dos pacientes com DCS.
Referências:
Bhome R, et al. Interventions for subjective cognitive decline: systematic review and meta-analysis. BMJ Open,vol. 8, 7 (2018):e021610.
Jessen F, et al. “A conceptual framework for research on subjective cognitive decline in preclinical Alzheimer’s disease.” Alzheimer’s & dementia:the journal of the Alzheimer’s Association, vol. 10,6 (2014): 844-52.
Studart AN,Nitrini R. Subjective cognitive decline: The first clinical manifestation of Alzheimer’s disease?.Dementia &Neuropsychologia, vol. 10,3 (2016): 170-177.
*Sobre os autores:
Wellington Lourenço Oliveira
Psicólogo. Mestrando em Gerontologia pela Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo (EACH-USP). Especialista em Psicologia da Saúde pelo Conselho Federal de Psicologia (CFP). Experiências em Centro Dia para Idosos (CDI), Núcleo de Convivência para Idosos (NCI), e Núcleo de Proteção Jurídico-Social e Apoio Psicológico (NPJ). Articulista do Portal Trevoo.
Profa. Dra. Thais Bento Lima da Silva
Docente do curso de Graduação em Gerontologia da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo (EACH-USP), Coordenadora do curso de pós-graduação em Gerontologia da Faculdade Paulista de Serviço Social (FAPSS). Pesquisadora do Grupo de Neurologia Cognitiva e do Comportamento da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo e diretora científica da Associação Brasileira de Gerontologia (ABG). Membro da diretoria da Associação Brasileira de Alzheimer- Regional São Paulo. É assessora científica e consultora do Método SUPERA. Articulista do Portal Trevoo.