Novos hábitos saudáveis de consumo e aumento da preocupação com a saúde têm impacto negativo nos resultados da maior marca de refrigerantes do mundo.
Jairo Bouer Publicado em 14/10/2019, às 16h13 - Atualizado às 23h57
Um interessante artigo publicado na seção de economia do jornal The New York Times na semana passada revelou que a marca Coca-Cola pode estar enfrentando o maior desafio de sua história de 127 anos. Relatório recente da empresa mostrou que as vendas caíram no mercado americano e houve um decepcionante crescimento global. As ações despencaram 4% (maior queda em sete meses), totalizando uma perda de 7% em 2014.
Os resultados podem refletir uma mudança de atitude dos consumidores (principalmente os mais jovens) em relação aos refrigerantes. Hoje, o combate à obesidade e as campanhas por uma alimentação mais saudável são pautas frequentes dos órgãos reguladores e da mídia. Excesso de açúcar já é visto por boa parte da população como um risco à saúde.
Alguns dias antes da divulgação dos resultados da Coca-Cola, o FDA (órgão regulador de alimentos e medicamentos dos Estados Unidos) havia anunciado a primeira grande mudança em duas décadas na rotulação dos alimentos industrializados. A ideia é que as embalagens passem a trazer em destaque a quantidade de calorias e de açúcares adicionados e ajustem o número de porções de cada produto ao que hoje é a realidade do consumo no país (em média, porções 17% maiores). A tentativa é facilitar o acesso às informações que são consideradas essenciais para a saúde.
A proposta do FDA ficará aberta para debate público por três meses e as indústrias terão dois anos para se adaptar às novas mudanças. Na nova rotulação, as gorduras perdem importância como “vilões da saúde” e o açúcar passa a ocupar o foco central. Pesquisas recentes mostram que 70% dos americanos consomem mais açúcar do que o recomendado. E o açúcar livre (adicionado aos alimentos) é o que traz mais riscos, por diminuir a quantidade de outros nutrientes essenciais, como vitaminas, fibras e sais minerais.
E por recomendação, também semana passada, a Organização Mundial de Saúde (OMS) anunciou que vai propor uma redução de 10% para 5% do total das calorias diárias provenientes de açúcares, tanto os livres, como os naturais (xaropes, mel, concentrados de frutas etc). A medida visa a reduzir problemas como obesidade e perda dentária, em escala global.
Na nova recomendação da OMS, o máximo de açúcar ingerido deveria ficar em torno de 25 gramas diárias (seis colheres de chá). Só para se ter uma ideia, isso representa menos açúcar do que o existente em uma latinha de refrigerante (cerca de 40 gramas).
Outra boa notícia nesse campo, além das novas mudanças recomendadas pelo FDA e pela OMS, vem de um estudo realizado pelo Centro de Controle de Doenças (CDC), de Atlanta, divulgado no fim do mês passado pela AFP. A taxa de obesidade caiu 43% em crianças de 2 a 5 anos (de 14% para 8% dessa população infantil) nos Estados Unidos em oito anos. O resultado pode revelar um melhor nível de informação e uma nova postura dos pais frente à alimentação de seus filhos.
Mas o problema ainda está longe de ser resolvido. Os Estados Unidos enfrentam hoje uma verdadeira “epidemia” de obesidade (mais de um terço dos adultos), o que tem causado, por tabela, aumento nas taxas de diabetes, enfarte, AVC, e diversos tipos de câncer. Além dos adultos, 17% das crianças maiores de 5 anos e de adolescentes americanos estão obesos.
Os dados da pesquisa do CDC também mostram uma queda no consumo de bebidas com açúcar entre os jovens. Esses números podem explicar, em parte, a queda do consumo dos refrigerantes no país. A maior percepção do risco trazido pelo excesso de açúcar e as campanhas frequentes por um estilo de vida mais saudável podem ajudar a completar esse quadro. Além disso, entre os mais jovens, as principais marcas de refrigerantes podem estar “encaretando”. Assim, eles prefeririam hoje bebidas mais naturais, menos gaseificadas e, também, um pouco mais amargas. Refrigerantes: será que não é hora de mudar a composição, o sabor e o apelo?
via Estadão