Redação Publicado em 07/04/2022, às 16h00
O “oi” que introduz uma conversa, normalmente, vem acompanhado de um “tudo bem?”. Essa é uma situação muito comum nos nossos diálogos cotidianos, mas será que a gente sempre tem de estar bem mesmo?
Essa foi a pergunta que iniciou a live sobre ansiedade, depressão e cansaço da Pós-PUCPR Digital, que contou com a participação de Jairo Bouer. Para o psiquiatra o questionamento está incorporado muito mais na prática dos povos latinos do que em outras partes do mundo:
É uma tentativa de aproximação mais afetiva. Não vejo problema em perguntar, acho que faz parte. Mas não estamos bem sempre e, às vezes, falamos que sim só para evitar aquela pergunta ‘mas você não está bem por quê?’. Eu gostaria que as pessoas pudessem falar com mais tranquilidade sobre esse assunto e responder ‘ah, hoje eu não estou muito legal’. Temos que aprender a lidar com isso e abrir um espaço para esse diálogo”.
Segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), o Brasil é o país mais ansioso do mundo e ocupa o quinto lugar no ranking da depressão. Porém, existe explicação para sermos donos dessa posição?
Jairo contou que os números são reflexos de questões sociais e culturais enfrentadas pela população brasileira:
O Brasil é um país que tem uma questão social muito impactada e com um grande abismo social. É muita gente vivendo próximo à linha da miséria, sem certeza se vai trazer comida para casa, se vai conseguir manter o emprego, o salário e as condições de vida da família. Tudo isso é um peso para a questão da nossa saúde mental”, comentou.
Além disso, temos o costume de perguntar “você está bem?” ao início de uma conversa mas, de acordo com o psiquiatra, durante muito tempo o brasileiro “inventou” uma fantasia de que todo brasileiro precisa ser sempre gentil e aberto.
Temos assistido nos últimos anos – não é algo que aconteceu só agora, mas ficou mais evidente – uma polarização muito grande de tudo. O Brasil ainda é um país muito preconceituoso, machista e homofóbico, criando situações de exclusão, violências sociais e culturais que têm um peso importante nessa equação da saúde mental”.
Confira:
Outra pergunta que surgiu durante o bate-papo foi: “estamos mesmo vivendo uma epidemia de ansiedade?”. Para Jairo, a ansiedade não é algo novo, apenas começou a ser discutida com mais intensidade nos últimos anos.
Muita gente começou a falar muito mais de saúde mental nesses últimos dois anos e isso tem uma ligação direta com a pandemia. Mas um erro comum é assumir que foi a pandemia que fez com que a gente vivesse essa epidemia de problemas de saúde mental; não é bem assim. Falamos de um aumento significativo dessas questões, pelo menos, desde o começo deste século, há cerca de duas décadas”.
No início dos anos 2000 foi observada uma piora mais aguda e o tema “saúde mental” parece ter ficado mais em evidência. Existem alguns estudos que correlacionam essa piora com o aumento do engajamento das pessoas nas redes sociais, as expectativas que se criam com essas plataformas e todos os impactos que elas podem provocar do ponto de vista emocional.
Jairo enfatiza, porém, que falar sobre saúde mental já era algo importante, mesmo antes da chegada da pandemia e, ao pensar historicamente, a ansiedade e a depressão sempre fizeram parte da humanidade.
De acordo com o psiquiatra, os modos de produção e a forma que o capitalismo se organizou tem um peso significativo na questão da saúde mental. Como resultado, é possível observar a crescente tendência da medicação das emoções e do não entendimento da origem dessas dificuldades emocionais.
Se perguntássemos: “por que temos tantos problemas de saúde mental?”, Jairo acredita que a resposta seria:
Porque, talvez, o nosso modo de existir, produzir e de exigir de nós o tempo inteiro acabou criando uma relação complicada. Isso faz com que a gente viva em uma sociedade que, muitas vezes, gera cansaço, sintomas e, obviamente, impacta a nossa saúde mental”, finalizou.