Um estudo global sobre a prevalência da extorsão sexual entre adultos concluiu que o problema é mais difundido do que se pensava inicialmente.
A extorsão sexual, ou “sextorsão”, é uma forma de abuso sexual baseada em imagens, que inclui a ameaça de fotos ou vídeos íntimos compartilhados, a menos que a vítima cumpra as exigências comportamentais ou financeiras do perpetrador.
A pesquisa, liderada pela Universidade RMIT, na Austrália, em parceria com o Google, entrevistou mais de 16 mil adultos na Austrália, América do Norte e Central, Europa e Ásia, e descobriu que 14,5% dos entrevistados relataram ter sido vítimas de sextorsão, enquanto 4,8% admitiram ser os perpetradores.
Pessoas LGBTQIA+, homens e entrevistados mais jovens eram mais propensos a denunciar tanto a vitimização como a perpetração.
O tipo mais comum de perpetrador foi um antigo ou atual parceiro, mas os homens eram mais propensos do que as mulheres a relatar terem sido vítimas de um colega ou cuidador.
A vitimização foi mais comum nos EUA, Austrália, México e Coreia do Sul, e menos comum nos países europeus.
A perpetração foi mais comum na Coreia do Sul, seguida pela Austrália e pelos EUA. Foi menos comum na Bélgica, Holanda, Polónia e Espanha.
Apesar de os homens serem mais propensos a serem perpetradores, o estudo descobriu que eles também corriam um risco ligeiramente maior de serem vítimas de sextorsão.
A pesquisadora principal e professora do RMIT, Nicola Henry, disse que uma possível explicação para o motivo pelo qual os homens são mais propensos a denunciar a vitimização pode ser porque os golpes de sextorsão tendem a afetar mais homens jovens.
“Para formas financeiras de sextorsão, os golpistas enganam as pessoas para que compartilhem suas imagens íntimas ou as levam a acreditar que têm evidências de que a vítima visitou sites pornográficos”, disse. “Eles, então, usam essas evidências para ameaçar compartilhar imagens íntimas se não cumprirem suas exigências, como pagar ou enviar imagens mais íntimas”.
Apesar da prevalência da sextorção ocorrer na forma de fraudes financeiras, a pesquisa mostra que a sextorsão costuma ser mais perpetrada por parceiros íntimos.
“Isso é particularmente comum no abuso de parceiro íntimo, onde um parceiro ou ex ameaça compartilhar imagens íntimas para coagir a vítima a fazer ou não fazer algo, como permanecer no relacionamento, buscar uma ordem de intervenção, recusar a custódia dos filhos ou envolver-se em um ato sexual indesejado”, disse ela.
As pessoas LGBTQIA+ também corriam um risco maior de serem vítimas de sextorsão, onde o conteúdo íntimo pode ser usado como uma ameaça para as “revelar” devido ao estigma que rodeia a sexualidade e a liberdade de expressão sexual.
A coautora e pesquisadora de experiência do usuário do Google, Rebecca Umbach, disse que havia poucas pesquisas sobre sextorsão entre adultos, com a maioria focada em menores ou locais específicos.
“A falta de dados padronizados em grande escala pode prejudicar a nossa capacidade de resolver eficazmente o problema”, disse ela.
“Mesmo assumindo alguma subnotificação, as nossas descobertas indicam que a sextorsão entre adultos é, na verdade, relativamente comum e merece mais investigação e recursos.”
O estudo descobriu que 85,2% dos perpetradores também relataram ter sido vitimados em algum momento. “Uma explicação possível para isto é que as imagens íntimas podem ser usadas em retaliação ou em situações de ‘olho por olho’, em que um indivíduo que ameaçou partilhar as imagens íntimas de outra pessoa experimenta então uma ameaça desse indivíduo ou de outra pessoa”, comentou Nicola.
Surpreendentemente, as mulheres sul-coreanas tiveram a maior sobreposição vítima-agressor, com 15,2% das mulheres relatando experiências tanto de vítimas como de perpetradores.
Embora fossem necessárias mais pesquisas para compreender as razões para isto, uma explicação possível era simplesmente a elevada prevalência de abuso sexual baseado em imagens na Coreia do Sul.
Somente neste estudo, 19,1% das mulheres sul-coreanas relataram ter sido vítimas de sextorsão. “Só podemos supor que ser ameaçado com a divulgação de imagens íntimas poderia levar algumas pessoas a retaliar na mesma moeda, ameaçando partilhar também as imagens dessa pessoa”, afirmou.
Dada a prevalência global da sextorsão, as autoras ressaltam que uma série de medidas são necessárias para ajudar a prevenir e responder à sextorção.
Em primeiro lugar, a educação preventiva em escolas, universidades e comunidades precisam ser adaptadas especificamente aos grupos de risco, especialmente rapazes e homens jovens, segundo as pesquisadoras.
Também são necessários mais financiamento e recursos para apoiar as vítimas-sobreviventes de sextorção, incluindo aconselhamento, aconselhamento jurídico e apoio em crises de saúde mental.
“Os trabalhadores da linha da frente também precisam de ser formados para reconhecer os sinais de sextorsão e responder às revelações de uma forma informada sobre o trauma e culturalmente apropriada, além de fornecer apoios e encaminhamentos apropriados”, acrescentou a principal autora.
Além disso, é preciso que a sextorsão faça parte das conversas sobre violência entre parceiros íntimos e abuso no namoro, não apenas no contexto de fraudes financeiras.
Com a tecnologia sendo cada vez mais usada para facilitar a sextorsão, estudos como este são importantes para informar a sociedade como um todo e para permitir que as empresas de tecnologia e os reguladores exerçam a responsabilidade compartilhada de aplicar políticas e práticas para detectar, prevenir e responder à sextorsão.
O artigo, publicado em Computers in Human Behavior, foi o resultado da primeira de duas bolsas do Google, sendo que uma delas foi focada especificamente em imagens íntimas geradas por IA.
Tatiana Pronin
Jornalista e editora do site Doutor Jairo, cobre ciência e saúde há mais de 20 anos, com forte interesse em saúde mental e ciências do comportamento. Vive em NY e é membro da Association of Health Care Journalists. Twitter: @tatianapronin