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Ansiedade pode ser culpa da pandemia, mas também da própria Covid-19

Imagem Ansiedade pode ser culpa da pandemia, mas também da própria Covid-19

Da Redação Publicado em 15/10/2020, às 11h55 - Atualizado às 12h37

Um estudo brasileiro mostra que mesmo pessoas que tiveram a forma leve da Covid-19 podem sofrer alterações no cérebro. E isso pode explicar por que muitos desses pacientes, semanas depois da recuperação, ainda apresentam sintomas como ansiedade, depressão, fadiga e falta de libido, quadros que muita gente tem associado aos impactos da pandemia, mas não à doença em si.

A pesquisa foi conduzida por equipes da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e da Universidade de São Paulo (USP), além de contar com colaboradores do Laboratório Nacional de Biociências (LNBio), do Instituto D’Or de Pesquisa e Ensino (IDOR) e da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

Crédito: Pixabay

Sintomas duradouros

A presença do novo coronavírus no cérebro de pacientes não é uma novidade. Mas os pesquisadores demonstraram que o vírus infecta células do sistema nervoso central chamadas de “astrócitos”. Elas exercem uma série de funções, como regular a concentração de neurotransmissores e outras substâncias envolvidas no funcionamento dos neurônios. Os experimentos foram feitos com amostras de tecido cerebral de pacientes que morreram da doença.

Outro braço da pesquisa avaliou 81 voluntários que tiveram a forma leve da Covid-19 e se recuperaram. Eles passaram por exames de ressonância magnética cerca de dois meses depois do diagnóstico. Um terço dos participantes ainda tinha sintomas como dor de cabeça (40%), fadiga (40%), alteração de memória (30%), ansiedade (28%), perda de olfato (28%), depressão (20%), sonolência diurna (25%), perda de paladar (16%) e de libido (14%).

De acordo com reportagem da Agência Fapesp, a equipe da Unicamp recebeu muito mais voluntários em poucos dias, mas decidiu se concentrar apenas naqueles que não foram hospitalizados e que tiveram diagnóstico confirmado por RT-PCR. Os resultados dos exames foram comparados aos de 145 pessoas saudáveis, que formaram o grupo-controle.

Por trás da ansiedade

O córtex é a região mais rica em neurônios em todo o cérebro, e é responsável por funções complexas, como memória, atenção, linguagem e consciência. A comparação mostrou que alguns pacientes recuperados tinham certas regiões do córtex com espessura menor, enquanto outros apresentavam aumento de tamanho (como se fosse um inchaço, ou edema) em relação ao grupo-controle. Os pesquisadores também observaram atrofias em áreas relacionadas com a ansiedade, um dos sintomas mais relatados pelos pacientes.

Outros experimentos do estudo, feitos em laboratório com astrócitos infectados, ainda indicaram que o vírus afeta a produção de energia para as células. E os cientistas acreditam que essas alterações possam influenciar níveis de neurotransmissores como o glutamato (relacionado à memória e aprendizado) e o GABA (ligado à calma e relaxamento).

Prevalência já é alta

A hipóstese de a infecão pelo vírus Sars-CoV-2  deixar uma sequela como a ansiedade é preocupante, já que a prevalência desse transtorno já é alta no Brasil –  a proporção é de 9% da população, a mais alta do mundo, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). Entre os pacientes do estudo, o número é três vezes mais alto que a média.

É importante dizer que os resultados do estudo, que foi financiado pela Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo), ainda precisam passar pelo processo de revisão. E que os pacientes com sintomas prolongados continuam em acompanhamento. Assim como eles, há relatos no mundo todo de pessoas que se recuperaram da Covid-19 e ainda sofrem com problemas de olfato, memória, ansiedade e depressão.

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