Redação Publicado em 15/04/2021, às 18h30
Nos últimos dias, o Brasil acompanha o “Caso Henry”, um menino de 4 anos que morreu após sofrer uma série de agressões físicas. A perícia realizada apontou que Henry havia sido vítima de ações violentas já que seu corpo apresentava múltiplos sinais de trauma e 23 lesões externas. O caso ainda está sendo apurado, mas não há mais dúvidas de que a criança vivenciava uma rotina de agressões e violência.
Casos desse tipo causam enorme comoção, mas é importante lembrar que mesmo punições corporais menos graves, como palmadas, podem causar muitos danos à criança. Um estudo recém-publicado pela Universidade de Harvard, nos EUA, revela que bater em uma criança pode afetar seu desenvolvimento cerebral de maneiras semelhantes a formas mais graves de violência.
Publicada na revista médica Child Development, a pesquisa foi baseada em estudos anteriores - com crianças que sofrem abuso - e demonstram uma maior atividade em certas regiões do cérebro como forma de resposta a sinais de ameaça.
A equipe constatou que meninos e meninas que haviam experenciado situações de agressão apresentaram maior resposta neural em várias regiões do córtex pré-frontal, inclusive em locais que fazem parte da rede de saliência. Todas essas áreas do cérebro respondem a indícios do ambiente que tendem a trazer consequências - como uma ameaça- e que podem afetar a tomada de decisão e o processamento de situações.
Segundo os pesquisadores, as crianças cuja família utiliza a punição corporal como forma de educar são mais propensas a desenvolver ansiedade, depressão, problemas de comportamento e muitos outras questões relacionadas à saúde mental. Entretanto, muitas pessoas não pensam no ato de bater como uma forma de violência.
O principal objetivo do estudo era analisar se existe algum impacto desse tipo de conduta em um nível neurobiológico, ou seja, se ela afeta a maneira com que o cérebro está se desenvolvendo.
De acordo com os autores, a punição corporal tem sido associada ao desenvolvimento de problemas de saúde mental como a ansiedade, depressão, questões comportamentais e transtornos ligados ao uso de substâncias. Além disso, estudos recentes mostraram que aproximadamente metade dos pais norte-americanos relataram bater em seus filhos no último ano e um terço na semana passada. Porém, a relação entre o bater e a atividade cerebral ainda não tinha sido estudada.
Para a pesquisa, foram analisados dados de um grande estudo com crianças entre três e 11 anos. Os pesquisadores se concentraram em 147 crianças de 10 a 11 anos que tinham sofrido punições corporais, excluindo aquelas que também haviam experimentado formas mais graves de violência.
Todas foram colocadas em uma máquina de ressonância magnética enquanto assistiam imagens de diferentes atores fazendo caretas “assustadoras” e “neutras”. O scanner capturou a atividade cerebral de cada uma em resposta a cada expressão.
Posteriormente, essas imagens foram analisadas para determinar se as expressões desencadearam padrões diferentes de atividade cerebral em crianças que foram agredidas em comparação àquelas que não vivenciaram situações desse tipo.
Em geral, os rostos assustadores provocaram maior ativação do que os rostros neutros em muitas regiões do cérebro. As crianças que sofreram punições corporais demonstraram ativação mais intensa em várias áreas do córtex quando expostas a rostos assustadores do que aos neutros, em comparação com aquelas que nunca sofreram com ações violentas.
Em contrapartida, não havia áreas do cérebro onde a ativação ao medo dos rostos neutros fosse diferente entre os dois grupos de crianças estudados.
Os achados estão de acordo com resultados de pesquisas semelhantes realizadas com crianças que sofreram violência grave. Eles sugerem que mesmo que o ato de bater nos filhos não seja considerado uma forma de violência, para o cérebro da criança, isso não é tão diferente de sofrer um abuso. Ou seja, é mais uma diferença de intensidade do que de tipo de violência sofrida.
Para os pesquisadores, as descobertas são um primeiro passo. Ao identificar certas vias neurais que explicam as consequências da punição corporal no cérebro, é possível mostrar que esse tipo de conduta pode ser prejudicial para as crianças.
Ainda segundo os autores, vale lembrar que a punição corporal não afeta todas de uma mesma maneira. Algumas crianças podem ser resilientes quando expostas a potenciais adversidades.
Porém, a principal mensagem é que utilizar da punição corporal como forma de educar é algo que pode aumentar problemas de desenvolvimento nas crianças. Por isso, pais e autoridades devem trabalhar para combater esse tipo de violência.
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