Redação Publicado em 30/09/2022, às 12h00
Novo estudo mostra que cães detectaram amostras de respiração e suor retiradas de um indivíduo com estresse psicológico com uma precisão de 93,75%. Os resultados indicam que os processos fisiológicos associados ao estresse produzem alterações nos compostos que fluem da respiração, suor ou ambos, e que os cães podem detectar essas alterações. Segundo os pesquisadores, quatro cães foram treinados por cerca de uma hora por semana ao longo de cerca de dez meses.
Os humanos desenvolveram várias maneiras de colocar o sistema olfativo canino para funcionar. Treinando cães de alerta diabético para avisar os tutores quando sentirem o cheiro de mudanças no açúcar no sangue. Pesquisadores ensinaram cães a detectar pessoas com parasitas da malária pelo seu odor. Os cães podem até ser treinados para distinguir entre amostras de respiração absorvidas de indivíduos com câncer de pulmão. Aqui, no Brasil, cães estão sendo treinados para detectar câncer de mama e Covid-19.
Quando sob estresse, os humanos podem experimentar mudanças fisiológicas, incluindo epinefrina e cortisol sendo liberados na corrente sanguínea, bem como aumento da frequência cardíaca, pressão arterial e respiração. Recentemente, pesquisadores da Queen's University Belfast e da Newcastle University, no Reino Unido, procuraram descobrir se essas mudanças fisiológicas fariam com que o odor do suor e da respiração de um indivíduo estressado fosse diferente do cheiro usual de seu suor e respiração. Se fossem diferentes, os pesquisadores se perguntavam se isso seria detectável por cães.
Para este estudo de prova de conceito, publicado na Plos One, os pesquisadores relataram que os caninos podem de fato coletar amostras de respiração e suor de um indivíduo passando por estresse psicológico com uma precisão de 93,7%. Para a principal autora do estudo, que estuda olfato e comportamento canino na Queen's University Clara Wilson, foi fascinante ver como os cães foram capazes de discriminar entre esses odores quando a única diferença era que uma resposta psicológica ao estresse havia ocorrido.
Os pesquisadores recrutaram cães de estimação da área de Belfast, na Irlanda, para o estudo. Selecionaram 20 deles para consideração. Depois que alguns foram eliminados do estudo por vários motivos, incluindo a perda de interesse à medida que o treinamento progredia, quatro concluíram o processo de treinamento. Os selecionados incluíam um cocker spaniel macho, uma fêmea (mistura de poodle e cocker spaniel) e dois cães mestiços, um macho e uma fêmea, com idades entre 11 e 36 meses.
Pesquisadores treinaram os cachorros usando condicionamento operante (quando os animais repetem comportamentos que têm consequências desejadas) e reforço positivo. O estudo começou em dezembro de 2019. Segundo Clara, o adestramento dos cães teve que parar por cerca de um ano durante a pandemia. Ela disse que, no total, os cães treinaram uma hora por semana por cerca de dez meses.
O treinamento foi muito extenso, pois a premissa era que os cães precisavam ser consistentemente capazes de discriminar entre dois odores humanos muito semelhantes com diferenças conhecidas acima de 80% corretos para várias sessões. Para o estudo, os pesquisadores usaram uma engenhoca: uma base com três braços de alumínio. Cada braço vinha com uma porta cilíndrica que tinha uma tampa removível.
Primeiramente, os cães foram treinados para ficarem em pé ou sentados em frente ao aparelho com o focinho tocando-o por cinco segundos. Em seguida, os pesquisadores colocaram uma amostra de suor retirada de voluntários em gaze e um pedaço de comida dentro de uma das portas. As outras duas portas estavam cheias de gaze não utilizada.
Quando o cão identificava com sucesso a porta contendo comida, o pesquisador acionava um clicker (uma caixinha com um botão utilizado para emitir sons, que podem ser usados para reforçar o comportamento do animal) e dava uma recompensa de comida. Uma vez que o cão era capaz de identificar a porta de comida corretamente em oito de dez tentativas, a comida era removida.
Mais tarde, os cães passaram a receber três portas, nenhuma das quais com comida. Uma possuía uma amostra de suor e respiração humana, duas outras continham amostras em branco. Quando o cão selecionava a porta que continha a amostra de suor e respiração humana em sete das dez tentativas, ele ia para a fase seguinte.
Nesta etapa de treinamento, os cães receberam uma porta com um pedaço de gaze contendo suor e respiração da mesma pessoa usada no desafio anterior (o alvo), além de uma amostra de uma nova pessoa e uma em branco. Os cães tiveram que escolher a amostra alvo em 16 de 20 tentativas, por duas sessões consecutivas, antes de passar para o próximo estágio de treinamento. Para esta fase, os pesquisadores apresentaram ao cão amostras de respiração retiradas da mesma pessoa em dois horários diferentes do dia. A amostra usada pela manhã era normalmente usada como amostra alvo. Uma vez que os cães foram bem sucedidos com esse desafio, os pesquisadores permitiram que eles passassem para a fase de testes.
Os pesquisadores recrutaram 53 participantes humanos. Desses, 40 concluíram o estudo pessoalmente e 13 o concluíram remotamente devido à pandemia. Os participantes tinham que ser não fumantes e foram solicitados a não comer ou beber bebidas com sabor por uma hora antes de fornecer uma amostra de ar expirado. Eles também não tomaram medicamentos que alteram o humor ou se abstiveram de tomar esses medicamentos por uma hora antes de fornecer uma amostra de ar.
Os participantes ou os pesquisadores limparam um pedaço de gaze na nuca, e esta foi colocada em um frasco. Os participantes sopraram no frasco três vezes antes de fechar a tampa e, então, preencheram um questionário de autorrelato sobre o nível de estresse que estavam experimentando no momento.
Em seguida, os participantes foram solicitados a completar uma tarefa de aritmética mental, sem o uso de caneta ou papel na frente dos pesquisadores. Enquanto contavam, dois pesquisadores assistiam, pessoalmente ou usando um software de reunião online. Durante a tarefa, os pesquisadores diziam coisas como “você deve continuar até que a tarefa seja concluída” de modo severo, para gerar estresse. Se um participante dava a resposta correta, ele não recebia feedback e tinha que continuar.
Após a tarefa, os participantes limparam um pedaço de gaze na nuca e no pescoço e a colocaram num frasco. Novamente, sopraram três vezes antes de fechar a tampa. O mesmo processo foi realizado uma segunda vez com outro frasco. Os participantes, então, preencheram um segundo questionário de autorrelato sobre o nível de estresse que estavam experimentando no momento. Além disso, a frequência cardíaca e a pressão arterial dos participantes foram monitoradas.
Nove participantes que realizaram o estudo pessoalmente e dois que o realizaram remotamente foram excluídos por não demonstrarem uma resposta suficiente ao estresse. Cinco outras amostras de participantes foram excluídas por vários outros motivos. No total, foram testadas amostras de 36 pessoas. Elas foram coletadas de 30 mulheres e seis homens com média de idade de 25,4 anos. Os participantes incluíram 30 pessoas que se identificaram como brancas, três como asiáticas ou britânicas asiáticas, duas como grupos étnicos mistos ou múltiplos e uma como negra, africana, caribenha ou negra britânica. As amostras foram mostradas aos cães três horas após a coleta.
Na primeira fase do teste, os pesquisadores encheram a porta com uma amostra de suor e respiração de um participante estressado e duas amostras em branco. Na fase seguinte, os pesquisadores preencheram uma porta com uma amostra de suor e respiração de um participante estressado, outra porta com uma amostra de suor e respiração colhida antes do participante realizar a tarefa mental e um espaço em branco.
Cada cão completou dez testes de fase um e 20 testes de discriminação de fase dois. Para o estudo, os pesquisadores se concentraram na fase em que os cães tiveram que discriminar entre as amostras estressadas e as da linha de base. No geral, como já dito, os cães detectaram a amostra de estresse em 93,7% dos ensaios.
A maneira como foi feito o teste fornece evidências de que a resposta ao estresse humano altera o perfil de odor emitido e que os cães podem detectar isso. Profissionais que atuam com animais não ficaram surpresos ao saber que os resultados confirmaram que os cachorros podem escolher a amostra de suor e respiração de um humano estressado. Para eles, isso faz parte de uma longa história da literatura que mostra que os cães têm um grande senso de odor.
Fonte: MedicalNewsToday
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