Redação Publicado em 23/07/2021, às 12h00
Em um estudo publicado esta semana na revista Molecular Psychiatry uma equipe de cientistas das universidades de Cambridge e Leeds, na Inglaterra, mostra que mudanças na matriz extracelular do cérebro – “andaimes” em torno das células nervosas – levam à perda de memória com o envelhecimento, mas que é possível reverter isso usando tratamentos genéticos.
Evidências recentes surgiram sobre o papel das redes perineuronais (PNNs) na neuroplasticidade – a capacidade de o cérebro de aprender e se adaptar – e de fazer memórias. PNNs são estruturas semelhantes à cartilagem que circundam principalmente os neurônios inibitórios no cérebro e cuja principal função é controlar o nível de plasticidade do órgão. Eles aparecem por volta dos cinco anos em humanos e desligam o período de maior plasticidade durante o qual as conexões no cérebro são otimizadas. Em seguida, a plasticidade é parcialmente desligada, tornando o cérebro mais eficiente, mas menos plástico.
PNNs contêm compostos conhecidos como sulfatos de condroitina. Alguns deles, como o 4-sulfato, inibem a ação das redes, dificultando a neuroplasticidade; outros, como a condroitina 6-sulfato, promovem a neuroplasticidade. À medida que envelhecemos, o equilíbrio desses compostos muda e, conforme os níveis de condroitina 6-sulfato diminuem, nossa capacidade de aprender e formar novas memórias muda, levando ao declínio da memória relacionado à idade.
Pesquisadores investigaram se a manipulação da composição do sulfato de condroitina dos PNNs pode restaurar a neuroplasticidade e aliviar os déficits de memória relacionados à idade. Para o estudo, a equipe analisou ratos de 20 meses – considerados muito velhos – e usaram uma série de testes que mostrou que os ratos exibiam déficits na memória em comparação a ratos de seis meses.
Por exemplo, um teste observou se os ratos reconheciam um objeto. Um deles foi colocado no início de um labirinto em forma de Y e deixado para explorar dois objetos idênticos no final dos dois braços. Após um breve momento, ele foi colocado novamente no labirinto, mas dessa vez um braço continha um novo objeto, enquanto o outro continha uma cópia do objeto repetido. Os pesquisadores mediram a quantidade de tempo que o rato gastou explorando cada um para ver se ele se lembrava do objeto da tarefa anterior. Os mais velhos eram muito menos propensos a se lembrar.
A equipe tratou os ratos idosos usando um “vetor viral”, um vírus capaz de reconstituir a quantidade de condroitina 6-sulfato nos PNNs e descobriu que isso restaurou completamente a memória nos mais velhos, a um nível semelhante ao observado no ratos mais jovens.
Jessica Kwok, da Escola de Ciências Biomédicas da Universidade de Leeds, afirmou que a equipe viu resultados notáveis quando tratou os ratos envelhecidos com esse tratamento. A memória e a capacidade de aprender foram restauradas a níveis que não existiam desde que eram muito mais jovens.
Para explorar o papel da condroitina 6-sulfato na perda de memória, os pesquisadores criaram ratos que haviam sido geneticamente manipulados, de forma que só eram capazes de produzir baixos níveis do composto para imitar as mudanças do envelhecimento. Mesmo com 11 semanas, esses ratos mostraram sinais de perda prematura de memória. No entanto, o aumento dos níveis de condroitina 6-sulfato usando o vetor viral restaurou a memória e a plasticidade a níveis semelhantes aos de ratos saudáveis.
Para os pesquisadores, o empolgante nisso é que, embora o estudo fosse apenas em ratos, o mesmo mecanismo deve operar em humanos – as moléculas e estruturas no cérebro humano são iguais às dos roedores. Isso sugere que pode ser possível evitar que os humanos desenvolvam perda de memória na velhice.
A equipe já identificou um medicamento em potencial, licenciado para uso humano, que pode ser tomado por via oral e inibe a formação de PNNs. Quando esse composto é dado a ratos, pode restaurar a memória no envelhecimento e também melhorar a recuperação em lesões da medula espinhal. Os pesquisadores estão investigando se isso pode ajudar a aliviar a perda de memória em modelos animais da doença de Alzheimer.
A abordagem adotada pela equipe usando vetores virais para administrar o tratamento está cada vez mais sendo utilizada para tratar condições neurológicas humanas. Uma segunda equipe havia publicado recentemente uma pesquisa mostrando o uso para reparar danos causados por glaucoma e demência.
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