Milena Alvarez Publicado em 01/02/2021, às 14h00
Com a chegada da pandemia de Covid-19, a atenção com a higiene pessoal foi intensificada na rotina de grande parte da população por ser considerada a ferramenta mais eficaz de combate à doença. Entretanto, esse aumento do cuidado higiênico pode ter agravado casos de TOC (Transtorno Obsessivo - Compulsivo) ligados à limpeza.
Segundo Kalil Duailibi, professor de Psiquiatria da Universidade Santo Amaro (Unisa) e presidente do Departamento de Psiquiatria da Associação Paulista de Medicina (APM), essa piora está ligada a uma preocupação excessiva com a higiene. “Nós entramos em contato com um vírus de fácil propagação e precisamos tomar mil cuidados higiênicos. Por um lado, é bom, pois as pessoas estão se cuidando mais. Mas, por outro, quem já tinha sintomas leves de TOC, começou a desenvolver quadros mais sérios com receio de contaminação”.
O TOC (Transtorno Obsessivo - Compulsivo) é um transtorno crônico caracterizado pela presença de obsessões e/ou compulsões.
As obsessões são pensamentos, imagens e impulsos considerados indesejáveis, que provocam sentimentos angustiantes e desconfortáveis como o medo, dúvida e nojo. Na maioria dos casos, a pessoa percebe que o pensamento não faz sentido, mas não tem nenhum controle sobre ele, o que acaba consumindo tempo e atrapalhando as atividades do dia a dia.
As compulsões, por sua vez, são atos e comportamentos repetitivos que o indivíduo executa para atenuar as obsessões. Esse alívio permanece por um certo tempo, mas logo retorna e o ciclo recomeça.
Não existe uma classificação definida para os tipos de TOC, a diferenciação é feita baseada na temática dos sintomas, e nada impede que uma pessoa sofra com mais de um tipo.
Entre as principais manifestações de TOC estão:
É importante lembrar que nem todos que têm obsessões ou compulsões são diagnosticados com o transtorno. Para ser considerado TOC, o indivíduo:
Considerado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) uma das dez maiores causas de incapacitação, estima-se que o transtorno atinge cerca de 4 milhões de brasileiros. “O pensamento de quem tem TOC é sempre assim: se eu não fizer isso, algo de ruim acontecerá comigo ou com alguém próximo”, comenta Kalil.
O TOC pode afetar crianças, adolescentes e adultos. Geralmente, os sintomas acompanham o indivíduo desde a infância, mas é na adolescência que acontece um agravamento por ser um período que se adquire mais responsabilidade e independência.
Apesar da causa certa ainda ser desconhecida, acredita-se que entre os principais fatores de risco do transtorno estão a genética, ou seja, ter familiares que tenham TOC ou algum transtorno de ansiedade grave pode aumentar as chances de desenvolver o quadro, e a estrutura e funcionamento do cérebro (estudos mostraram que pessoas com TOC apresentam diferenças em partes específicas do cérebro). Além disso, o transtorno também pode estar relacionado a algum trauma sofrido na infância.
Chegar ao diagnóstico de TOC nem sempre é uma tarefa fácil. Por apresentar sintomas parecidos com os de outros transtornos mentais, é necessário uma avaliação clínica para alcançar um diagnóstico certeiro.
O primeiro passo é procurar um médico para avaliar os sintomas, realizar alguns exames e analisar o histórico familiar. Essa avaliação é fundamental para excluir a possibilidade de um problema físico estar causando os sintomas. Caso o quadro se assemelhe ao de TOC, o médico deve encaminhar o paciente ao psiquiatra para uma opinião adicional ou tratamento.
O tratamento é realizado em diversos níveis, de acordo com a gravidade, através da terapia cognitiva comportamental (TCC) e/ou medicamentos que auxiliam a controlar os sintomas. A TCC é um tipo de psicoterapia que ensina maneiras de pensar, comportar-se e reagir diante das compulsões e obsessões, auxiliando a lidar com a ansiedade que essas situações podem provocar.
Já o tratamento medicamentoso é feito com certos tipos de antidepressivos e, nos quadros mais graves, em que o indivíduo não obtém melhora com remédios, há ainda a possibilidade de realizar uma neurocirurgia.
Kalil enfatiza que o TOC é tratável e o resultado traz grande melhora na qualidade de vida dos pacientes. De acordo com ele, grande parte das pessoas demoram a procurar ajuda e, por ser uma doença crônica, isso acaba provocando um sofrimento prolongado “Existe uma crença de que o transtorno não tem jeito, não tem controle. Então, ela acaba desistindo antes mesmo de procurar ajuda”.
A melhor maneira de auxiliar pessoas diagnosticadas com TOC é incentivando-as a buscarem informações, além de estar sempre atento a alguém próximo que possa apresentar sintomas, orientando-o a procurar associações e ajuda de profissionais.
“Todos nós temos as nossas manias e rituais, isso não é TOC. O TOC é algo que realmente interfere e compromete a vida de uma pessoa, trazendo sofrimento”, finaliza Kalil.
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