Você já deve ter ouvido falar que, para evitar ou adiar um quadro de demência, é preciso manter a mente ativa e seguir todas aquelas recomendações que valem para a saúde do coração: ter uma dieta equilibrada, evitar o cigarro e o excesso de álcool, e fazer exercício.
Mas uma pesquisa inédita, financiada pela Alzheimer’s Society (sociedade internacional voltada para o estudo da doença), traz uma nova perspectiva para a prevenção desse e de outros tipos de demência.
Pesquisadores da Universidade College London (UCL), no Reino Unido, decidiram avaliar se terapias psicológicas adotadas para tratar a depressão, como a Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC), poderiam ter algum papel na redução do risco de demência.
Diversos estudos têm mostrado que 40% dos casos de demência podem estar relacionados a fatores de risco modificáveis, como dieta insalubre e sedentarismo. De anos para cá, surgiram evidências, também, de que pessoas que têm depressão ao envelhecer têm maior probabilidade de sofrer com a condição. Foi a partir desses dados que a equipe decidiu investigar o valor das terapias.
O trabalho analisou dados de quase 120 mil pessoas com mais de 65 anos com níveis significativos de depressão. Eles haviam sido atendidos em um programa gratuito de aconselhamento, terapia cognitivo-comportamental e autoajuda guiada, no Reino Unido, entre 2012 e 2019. Os sintomas foram medidos com questionários padronizados.
Os pesquisadores, então, relacionaram os resultados dos escores de depressão dos pacientes atendidos no programa e registros hospitalares com diagnóstico de demência. Ambos os conjuntos de dados estavam disponíveis apenas para 106.069 pessoas, e esta foi a amostra definitiva do estudo.
Desse total, 101.452 pessoas não desenvolveram demência no espaço de oito anos, enquanto 4.617 integrantes receberam o diagnóstico.
No grupo que não desenvolveu demência, os pesquisadores descobriram que 65% (ou 66.211pessoas) tiveram melhorias significativas em sua saúde mental após a terapia. Em comparação, daqueles que desenvolveram demência, 60,13% (ou 2.776 pessoas) apresentaram melhora confiável na depressão após a terapia.
Os pesquisadores, então, avaliaram a diferença nas taxas de demência entre as pessoas que relataram melhora na saúde mental após a terapia com aquelas que não tiveram melhora.
No total, 68.987 pessoas da amostra do estudo apresentaram melhorias nos escores de depressão, em comparação com 37.082 que não observaram nenhuma melhora confiável.
Os pesquisadores descobriram que nos grupos que se beneficiaram da terapia e tiveram redução na depressão, 4% (ou 2.776) desenvolveram demência até oito anos depois. Em comparação, no grupo em que a terapia não teve efeito confiável, 5% (1.841) desenvolveram demência até oito anos depois.
Assim, as taxas de diagnóstico de demência foram ligeiramente maiores no grupo que não melhorou de forma confiável com a terapia psicológica.
Confira:
O estudo também descobriu que havia uma ligação entre um número mais alto de sessões de terapia e taxas mais baixas de demência. Os pesquisadores acreditam que isso pode ser devido a uma redução nos sintomas depressivos devido ao envolvimento mais duradouro no tratamento.
A autora principal, Amber John, esclarece que mais estudos são necessários para confirmar a descoberta. Mas ela observa que a depressão é um fator de risco importamente para o desenvolvimento de demência e potencialmente modificável. E a pesquisa sugere que terapias psicológicas podem contribuir para reduzir a incidência futura do quadro.
Estudos anteriores estimaram que 85% dos idosos com sintomas de depressão não recebem tratamento e têm cinco vezes menos probabilidade de acessar terapias psicológicas do que os jovens no Reino Unido.
Atualmente, as pessoas mais velhas estão sub-representadas nos serviços de terapia psicológica. Esses resultados sugerem que aumentar o acesso a esses serviços para pessoas mais velhas e otimizar os resultados da terapia pode ser uma meta importante para pesquisas e políticas [públicas], pois podem contribuir para a redução do risco de demência”, afirmou a pesquisadora.
Isso sem contar, é claro, o benefício que o tratamento da depressão pode trazer para a qualidade de vida dos idosos de uma forma geral. Os resultados, publicados no periódico Psychological Medicine, só reforçam o quão importante é cuidar da saúde mental, seja qual for a idade.
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Tatiana Pronin
Jornalista e editora do site Doutor Jairo, cobre ciência e saúde há mais de 20 anos, com forte interesse em saúde mental e ciências do comportamento. Vive em NY e é membro da Association of Health Care Journalists. Twitter: @tatianapronin