Princípio ativo do Ozempic pode ajudar pacientes com hidradenite supurativa
Tatiana Pronin Publicado em 03/10/2024, às 09h00
Um estudo apresentado recentemente no Congresso da Academia Europeia de Dermatologia e Venereologia (EADV) demonstrou o potencial significativo da semaglutida, princípio ativo de canetas antiobesidade como Ozempic, Wegovy ou Rybelsus, no tratamento da hidradenite supurativa, uma doença de pele comum e debilitante, em pessoas com obesidade.
A hidradenite supurativa é uma doença de pele crônica e inflamatória, com característica hereditária, associada à obesidade, ao tabagismo e aos maus hábitos alimentares. Mais comum em mulheres, a doença se manifesta na pele por meio de lesões dolorosas com nódulos e caroços, que podem abrir e gerar pus. As regiões mais acometidas são axilas, mamas, virilha, área genital e glútea.
“Como é uma doença com resposta inflamatória exagerada que agride a pele e as estruturas associadas, e que tende a persistir e recidivar, com o tempo surgem cicatrizes”, descreve a dermatologista Claudia Marçal, membro da Sociedade Brasileira de Dermatologia. A hidradenite supurativa acomete aproximadamente 1 em cada 100 pessoas.
A médica conta que o estudo apontou melhora da doença com uso da semaglutida, com maior espaçamento entre os episódios de lesão, diminuição de índices bioquímicos de inflamação e melhora da qualidade de vida desses pacientes.
A relação entre obesidade e o agravamento da hidradenite supurativa é bem estabelecida pela ciência. Segundo a dermatologista, existem algumas hipóteses que explicam isso: a maior retenção do suor, a maceração (processo de amolecimento e degradação da pele, que pode ser causado pela exposição prolongada à umidade e resultado do processo inflamatório de uma ferida), a ruptura dos óstios (orifícios) foliculares e glandulares e por alteração do metabolismo hormonal, fatores que predispõem à oclusão dos poros. “Hoje, sabemos que a hidradenite surge da inflamação dos folículos pilosos dessas regiões acometidas”, completa.
A pesquisa foi a primeira a explorar o uso de semaglutida para hidradenite supurativa, o que é um marco crítico na busca por tratamentos eficazes para essa condição, que é dolorosa e debilitante. Até então, os tratamentos eficazes permanecem limitados e podem causar efeitos colaterais sérios, destacando a necessidade de opções de tratamento alternativas e mais bem toleradas.
O trabalho envolveu 30 pacientes obesos (27 mulheres, 3 homens, idade média de 42 anos) com estágios variados de hidradenite supurativa, que receberam semaglutida em uma dose média semanal de 0,8 mg por uma média de 8,2 meses.
“Os resultados mostraram melhorias significativas nos resultados dos pacientes em diversas medidas importantes. Os pacientes apresentaram menos surtos da doença, com a frequência desses episódios reduzindo de uma média de uma vez a cada 8,5 semanas para uma vez a cada 12 semanas. A qualidade de vida autorrelatada também melhorou significativamente”, diz a médica.
O IMC (Índice de Massa Corporal) médio dos pacientes diminuiu de 43,1 para 41,5 e o peso médio caiu significativamente, de 117,7 kg para 111,6 kg, com um terço dos pacientes perdendo 10 kg ou mais durante o período de tratamento.
Outras mudanças positivas foram observadas nos níveis de HbA1c (hemoglobina glicada), que diminuíram de 39,3 para 36,6, indicando melhor controle glicêmico, e redução dos níveis médios de PCR (proteína C reativa) de 7,8 para 6,9, o que significa inflamação reduzida.
As descobertas sugerem que a semaglutida, mesmo em doses modestas, pode oferecer benefícios substanciais no tratamento da doença de pele.
“Embora o papel do medicamento na promoção da perda de peso esteja bem estabelecido, o que é particularmente empolgante é seu potencial para também reduzir a frequência de surtos de doenças associadas à obesidade, como a hidradenite supurativa, contribuindo para as melhorias notáveis observadas na qualidade de vida dos pacientes", explica a médica.
A médica explica que estudos maiores são necessários para validar essas descobertas. “Além disso, pesquisas futuras devem explorar o impacto de doses mais altas de semaglutida e seus efeitos independentemente de medicamentos concomitantes para entender completamente seu potencial", finaliza.
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