Entrevista com Dr. Bactéria: “Higiene virou moda, achei fantástico!”

Roberto Figueiredo apresentou um quadro no Fantástico, na Rede Globo, e é autor de vários livros

Cármen Guaresemin Publicado em 21/04/2022, às 12h00

"Teremos uma constância, a preocupação com a higiene vai ficar" - Reprodução Vídeo

Roberto Martins Figueiredo é formado em Biomedicina, com especialização em Saúde Pública e Marketing, e em Engenharia da Qualidade, Controle de Processos e Auditorias da Qualidade. Porém, você deve conhecê-lo como Dr. Bactéria, nome que batizou um quadro  apresentado por ele, entre 2006 a 2009, no programa Fantástico da TV Globo. Ele também é autor de livros como Xô, Bactéria! Tire suas dúvidas com Dr. Bactéria e tem uma assessoria em higiene ambiental e análises laboratoriais.

A seguir, ele nos concedeu esta entrevista na qual fala sobre a chegada do Sars-Cov-2, a consequente pandemia mundial e sobre a mudança no comportamento das pessoas, que passaram a dar muito mais importância à higiene. Confira:

O brasileiro ficou mais preocupado com germes, bactérias e vírus em virtude da pandemia?
O ser humano é muito imediatista e tivemos uma avalanche de informações, dúvidas, receios e medos. Todos esses medos geraram reações voltadas a formas de higiene, especialmente porque não havia vacina e nem conhecimento sobre a importância de locais que poderiam gerar contaminação. As pessoas ficaram mais preocupadas com produtos de limpeza. Nunca esses foram tão vendidos como na época do começo da pandemia. Houve um aumento de 30% de queimados por causa do álcool. Tivemos um recorde de pessoas intoxicadas com produtos de limpeza e crianças com álcool em gel.

O que vai ficar disso? Teremos uma constância, a preocupação com a higiene vai ficar. As pessoas estão mais atentas, lendo mais e isso levará a termos prevenção de doenças no futuro. Embora, acredito, estamos colhendo frutos da não vacinação, do não controle de doenças e de vetores, como mosquitos. Acredito que, em longo ou em médio prazo, teremos um controle melhor desses problemas.

Acha que os hábitos da população mudaram – para melhor – neste período?
As pessoas estão mais abertas. Se tempos atrás um prestador de serviços batesse na sua porta e você pedisse para ele tirar os sapatos antes de entrar, usar máscara e lavar as mãos, ele acharia um tremendo exagero de sua parte. Atualmente, é encarado como normal. Esses hábitos viraram rotina.

Acredita que vão permanecer mais atentos agora que a pandemia está arrefecendo?
A pandemia está mudando para endemia e a preocupação vai ser constante. As preocupações com a higiene devem permanecer. Creio que teremos esquemas de vacinação anual como os da gripe. E devemos nos vacinar nas campanhas ou fora delas, especialmente crianças e bebês. Seguir todos os esquemas de vacinação. Precisamos atingir 95% contra o sarampo, por exemplo, e chegamos a isso no passado. Tem muita coisa a ser feita ainda.

Quais vieram para ficar? Lavar as mãos sempre que chegar em casa; deixar os sapatos usados no dia fora; usar máscara ou álcool gel?
Essas preocupações não deviam fazer parte só do agora, época de pandemia, as pessoas tinham de ter isso desde sempre. Há muitos anos havia matérias nas escolas falando de higiene, mas foram eliminadas. Deveriam voltar para informar sobre higiene. Quanto mais a população for informada, terá mais razões para praticar isso.

"Creio que teremos esquemas de vacinação anual [contra a Covid] como os da gripe"  -  Foto: Gabriela Rossa Drewes

As pessoas tinham motivos para ficarem neuróticas com a limpeza?
A pessoa não tem de ficar neurótica com nada. Se ficar neurótica, será levada ao excesso, que leva a algo como o TOC (transtorno obsessivo-compulsivo), e que traz coisas ruins. Lavar as mãos oito vezes ao dia elimina bactérias, mas se as lavar 25 vezes, elas voltam a aumentar, pois você reduz a resistência da pele, eliminando o microbioma da pele. O que vale também para o banho, que é importante tomar um completo por dia. Se você passar a tomar dois por dia, vai eliminar bactérias que fazem parte do microbioma. E isso não é bom para a epiderme nem para a cultura da infecção. Nada que é extremo faz bem. Esse comportamento é causado pelo desconhecimento, o que cria processos que não levam a nada. Pessoas gastam valores altos que poderiam ser voltados para coisas necessárias e que teriam resultado.

O que foi mais preocupante em tudo isso que vivemos?
A função do Dr. Bactéria é atuar para que as pessoas não precisem ir ao hospital. De 65% a 75% das pessoas acabam se hospitalizando por causa de problemas hídricos, especialmente, falta de saneamento. Temos de voltar nossos olhos para saneamento e prevenção de doenças. Há nos postos de saúde frascos de hipoclorito (substância usada para desinfetar superfícies), duas gotas dele em um litro de água evitam diarreia infantil. Assim, os pais não precisam faltar ao trabalho para cuidar das crianças doentes em casa.

Ou seja, o país precisa investir em saneamento básico, isso é fundamental. Para cada um real investido, vai haver um retorno de cinco reais em medicina curativa, são dados do SUS, não meus. Temos pessoas para levar informações à população, como estudantes de medicina, por exemplo. Falta boa vontade, algo que tem de vir de todos que comandam a nação. Qualquer político pode erguer a bandeira da informação, da cultura e da prevenção de doenças.

O que mais o assustou e o que mais o deixou alegre no comportamento das pessoas durante a pandemia?
O que me deixou alegre foi a higiene virar moda, achei fantástico. O que mais me assustou foram muitas pessoas baixarem a guarda em relação à Covid. E também as muitas fake news que surgiram. Muitas causavam pavor e outras levavam as pessoas a terem cuidados sem função alguma.

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