Cheque seu conhecimento, baseado no que temos confirmado pela ciência até o momento
Elnara Negri e Marcello Barduco* Publicado em 12/10/2021, às 11h00
Como toda doença nova, a pesquisa e o acúmulo de conhecimentos criam oportunidades para informação e desinformação. Tentamos compilar várias “certezas” e dúvidas nesta lista de questões a seguir. Cheque seu conhecimento, baseado no que temos confirmado pela ciência até o momento sobre a infecção pelo Sars-Cov-2, a Covid-19.
Mito. Não existem evidências que comprovem sua origem como produzido em laboratório. Dra. Ester Sabino, médica brasileira que codificou o genoma do vírus, observou tratar-se de um vírus selvagem. Animais como o morcego e o pangolim são reservatórios naturais de coronavírus e a maioria da comunidade científica acredita que a origem da infecção humana pelo Sars-Cov-2 tenha ocorrido por transfecção do vírus dos animais para a espécie humana, sendo portanto uma zoonose. Algumas especulações do surgimento deste vírus em laboratório na China continuam circulando, sem que possam ser comprovadas.
Mito. É reconhecido que a transmissão da Covid-19 ocorre quando existe contato direto entre a pessoa infectada e outra susceptível. A transmissão via objetos manipulados por infectados sem contato direto entre infectado e novo hospedeiro é desprezível.
Mito. Apesar da ansiedade natural que surge numa situação como esta, não há benefício em realizar exames para detectar o vírus – a pesquisa de Sars-Cov-2 por PCR em swab nasal ou saliva (RtPCR COVID) – imediatamente. É adequado observar os sintomas e a opção por um isolamento social mais intenso. Caso surjam sintomas gripais nos próximos dias, vale realizar o PCR COVID. Em caso de ausência de sintomas respiratórios deve-se realizar o Rt PCR COVID após 5 a 6 dias do contato suspeito para se certificar da ausência do vírus e descartar a possibilidade de portador assintomático.
Mito. Não existem evidências científicas de que o uso de algum remédio ou suplemento (ivermectina, zinco, vitamina D) diminua a susceptibilidade de qualquer pessoa, assim como o uso de medicamentos precocemente, como a cloroquina e a hidroxicloroquina. Eles não são capazes de reduzir o risco de uma pessoa infectada apresentar um quadro grave.
Verdade. Pessoas mais sintomáticas que apresentem febre contínua e falta de ar ou queda nas taxas de oxigenação do sangue – facilmente aferida por um aparelho que adquirimos em farmácias ou casa de materiais médicos, o oxímetro – sugerem maior acometimento da infecção. O que determina a necessidade de internação é a necessidade de uso de oxigênio e alterações em exames laboratoriais e tomografia de tórax. Vale lembrar que as estatísticas mostram que apenas 10 a 15% dos infectados necessitarão internação e a mortalidade geral da doença gira em torno dos 3 a 4% do total de infectados.
Verdade. Apesar de não muito frequente, são encontrados eventuais problemas trombóticos, neurológicos, cardíacos, dermatológicos entre outros em pessoas que tiveram a infecção. Vale a pena fazer uma avaliação médica posterior ao quadro infeccioso, para uma pesquisa de novas situações decorrentes da Covid-19.
Mito. Infelizmente pessoas com bons hábitos e imunidade adequada, mesmo jovens, podem desenvolver quadros graves. Cuidados, atenção às medidas de redução de risco – uso de máscaras, distanciamento social e higiene frequente das mãos – valem para todos.
Mito. Apesar de algumas pessoas não desenvolverem qualquer sintoma, elas podem transmitir a doença a outras que permaneçam em seus contatos sociais. Se uma pessoa fez um teste PCR COVID que se mostrou positivo, deve iniciar imediatamente isolamento social e comunicar seu médico.
Verdade. A imunidade contra a infecção não parece definitiva. Infelizmente existe a possibilidade de uma pessoa que tenha apresentado a doença ser novamente infectado e desenvolver o quadro clínico.
Verdade. Como a imunidade induzida pela doença não é definitiva, a vacina contra Covid se faz absolutamente necessária. Idealmente deve-se aguardar pelo menos quatro semanas após o início dos sintomas para recebermos a vacina.
Mito. Quando uma pessoa recusa a vacinação, além de se expor à infecção e poder desenvolver um quadro grave, passa a ser um potencial vetor de transmissão da doença a outras pessoas. Em caso de gravidade, trará consequências para si e para o sistema de saúde, desviando recursos para o tratamento de uma pessoa que desenvolveu uma doença evitável através de medidas preventivas.
Verdade. Países que avançaram fortemente no processo de vacinação já estão voltando a suas atividades normais, retirando medidas restritivas e fazendo a economia reaquecer.
Mito. E um mito bizarro. Não há como os componentes da vacina possam alterar códigos genéticos ou serem veículos para implante de componentes eletrônicos microscópicos. Elas simplesmente estimulam o sistema imunológico a produzir defesas contra o coronavírus.
Mito. Não existem evidências de que se uma pessoa com Covid, mesmo assintomática, tenha complicações clínicas pela vacina. O que talvez possa acontecer é uma perda da eficiência. Não se deve tomar qualquer vacina se temos quadro clínico de infecção ativa, como febre, dores pelo corpo, coriza, tosse, entre outros. Apenas neste caso seria interessante fazer a pesquisa do PCR COVID para saber se a infecção acontece pelo coronavírus.
Mito. Todas cumprem o seu papel, que é reduzir a possibilidade de uma pessoa se infectar e principalmente desenvolver quadros graves, que necessitem de internações ou UTI. Cada uma é produzida com mecanismos diferentes, mas todas reduzem riscos individuais e têm impacto social, através da diminuição da pressão sobre o sistema de saúde. Novos estudos comparativos mostraram que o esquema vacinal completo com a Coronavac mantém seus efeitos protetores por menos tempo que a Aztra-Zeneca no grupo de pacientes idosos. Dados com Pfizer ou Janssen não estão disponíveis.
Dúvida. Não existem estudos conclusivos sobre esquemas de imunização que misturem dois tipos de vacinas e sua eficácia X efeitos colaterais. Atualmente o preconizado é usar a segunda dose exclusivamente da mesma vacina usada na primeira dose. Recentemente têm surgido estudos que sugerem que a aplicação de vacinas diferentes pode oferecer bons resultados.
Verdade. A doença é nova, mas já se pode concluir que a imunidade deverá ser estimulada novamente (como ocorre com a vacina da gripe) através de novas doses de vacinas.
Dúvida. Existem estudos que sugerem que a imunização pode ser conseguida com apenas uma dose de vacinas que originalmente demandem duas para que a imunização seja completa em pessoas que já tenham tido a doença. Teremos que aguardar estes resultados. Neste momento não devemos considerar esta afirmação como verdadeira.
Mito. As pesquisas que determinaram a eficácia das vacinas acima foram concluídas com os resultados referentes à aplicação de duas doses. Não se pode afirmar, com base nestes dados, que já temos imunidade com apenas uma dose.
Mito. Enquanto não se passarem ao menos 15 dias, idealmente quatro semanas, não temos a imunidade totalmente atingida. Mesmo quando isto acontecer, devemos nos lembrar de que as vacinas não têm a capacidade de “zerar” os casos de novas infecções, mesmo que menos sintomáticas. Desta forma, seja por nós, seja pela sociedade, devemos manter estes cuidados. Sabe-se que quando atingimos 70% da população completamente imunizada, existe segurança em relaxar estas medidas.
Mito. A imunidade contra a Covid-19 é complexa e não se limita à produção de anticorpos. Eles são detectados nas primeiras semanas após a exposição ao vírus, seja através da doença ou da vacina, e vão se reduzindo com o tempo. Isto não significa que tenhamos perdido a imunidade, porque existem outros mecanismos de defesa – a chamada imunidade celular – em que células de defesa combatem diretamente o vírus. Desta forma, não se considera necessária dosagem de qualquer tipo de anticorpos após a vacina ou a doença.
Verdade quanto à primeira pergunta. Ela é realmente mais infectante, consegue ser transmitida entre as pessoas com mais rapidez. Mito quanto à segunda questão. O aumento da infectividade não está se refletindo de forma significativa na gravidade dos casos. Não se sabe se isso é característica própria da cepa ou se reflete um momento em que já existe uma parcela significativa da população com imunidade adquirida pela vacinação.
Dúvida. O que se sabe é que as variantes surgem com muita frequência quando ocorrem infecções desenfreadas, contínuas, em grandes surtos. Com a vacinação em massa das populações e os cuidados para redução da circulação do vírus, a possibilidade de surgimento de novas mutações diminui drasticamente. Então, acredita-se que o surgimento destas novas variantes deverá diminuir com tais medidas.
Mito. Reações a vacinas podem ocorrer, mas não levam a complicações. Interromper a imunização sem completá-la é ter tido sintomas sem ter obtido o resultado esperado. Deve-se completar o esquema, mesmo que a 1ª dose tenha causado mal-estar.
Mito. Uma vacina não traz imunidade a doença diferente daquela à qual foi destinada. São necessárias vacinas contra gripe e contra a Covid.
Verdade. Os estudos têm mostrado que a imunidade adquirida com a imunização vai caindo com o tempo, sendo, portanto, necessário um novo estímulo através de uma nova dose para melhorar a eficiência da imunidade.
Mito. Outros países que iniciaram a vacinação antes do Brasil, como Israel e Estados Unidos, que usaram vacinas da Pfizer e da Astra Zeneca, estão reiniciando a imunização com doses extras, para todas as faixas etárias. Desta forma, acredita-se que este reforço deva ser oferecido a todos.
Verdade. As informações que os estudos trazem são de que, após o esquema vacinal preconizado ter sido completado – ou seja duas doses da Coronavac, Astra Zeneca ou Pfizer ou 1 da Janssen – o reforço deveria ser realizado com uma vacina diferente, o que, segundo as evidências, traria mais proteção por um prazo maior.
Mito. O tempo para que o teste se torne positivo após o contato com o vírus pode demorar até quatro dias. Desta forma, apesar de teoricamente diminuir a possibilidade de transmissão, não há garantia de que algum dos participantes não esteja incubando o vírus e transmitindo antes de o teste se tornar positivo.
Mito. Com os devidos cuidados preconizados para redução de contágio – adotando protocolos como uso de máscaras, distanciamento e higiene de mãos –podemos realizar atividades essenciais de forma segura. A opção de não se cuidar ou se privar de compromissos muito importantes que possam trazer repercussão na saúde, no aprendizado ou no trabalho por medo de contágio deve ser pesada com tranquilidade e isenção. A piora de condições crônicas de saúde, impactos negativos importantes no desenvolvimento intelectual e comprometimento financeiro têm ocorrido frequentemente durante a pandemia. Saber que há cuidados eficazes é essencial para que não haja este tipo de repercussão.
*Sobre os autores:
Elnara Negri - Graduada em Medicina pela Universidade de São Paulo (1990) e doutorada pela Universidade de São Paulo (1998). Livre Docente pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (2008). Atualmente é medica pesquisadora dos laboratórios de Investigação Médica da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo e pneumologista do Núcleo Avançado de Tórax do Hospital Sírio-Libanês e Colaboradora da Trevoo. Tem 30 anos de experiência clínica atuando principalmente nas seguintes especialidades: medicina intensiva, broncoscopia e pneumologia. Linhas de pesquisa: remodelamento pulmonar na insuficiência respiratória e mecanismos de defesa pulmonar, Coagulopatia da COVID 19.
Marcello Barduco - Cardiologista e Emergencista do Corpo Clínico do Hospital Sírio-Libanês. Pós- graduado em Geriatria pelo IEP – Hospital Sírio- Libanês. Gestor do Pronto Atendimento no Hospital Santa Cruz (2004 a 2009). Membro do Comitê de Ética do Hospital Sírio-Libanês (desde 2014). Responsável técnico pela Clínica Barduco há 25 anos. Membro do Conselho Editorial da TREVOO.
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