Depois que a modelo Yasmin Brunet e outras celebridades mencionaram sofrer de lipedema, essa condição ganhou destaque na mídia. A doença, caracterizada pelo acúmulo de tecido gorduroso que também envolve inchaço, retenção de líquido, presença de nódulos e dor ao toque, tende a afetar 10% da população feminina. E o que é mais importante destacar: dietas da moda não curam o problema.
A cirurgiã vascular Aline Lamaita, membro da Sociedade Brasileira de Angiologia e Cirurgia Vascular, explica que é preciso ter um olhar crítico até mesmo em relação à qualidade dos estudos publicados sobre o tema.
“Recentemente, um estudo chegou à conclusão que a dieta pobre em carboidratos (low-carb) com restrição calórica reduz dor e melhora a qualidade de vida em mulheres com lipedema. No entanto, é um trabalho muito pequeno, que só avaliou comparativamente essa dieta com a restrição calórica, e temos que considerar que o padrão alimentar para o lipedema é muito mais qualitativo do que quantitativo. Uma dieta low-carb pode restringir o consumo de fibras e o efeito colateral é a piora do intestino. E o intestino é um dos fatores que estão relacionados com o lipedema”, descreve a cirurgiã.
“Há realmente muitos fatores envolvidos na fisiopatologia da doença, desde disfunções nas organelas produtoras de energia dentro da célula (as mitocôndrias) até a disbiose intestinal e o sedentarismo. Mas devemos ter muito cuidado com o corte de macronutrientes na dieta, porque podemos restringir alguns nutrientes importantes”, diz a médica.
O estudo recente apenas avaliou o efeito de uma dieta pobre em carboidratos (low-carb) em comparação com uma dieta controle sobre a dor em 70 pacientes do sexo feminino com lipedema. Ambas as dietas contavam com os mesmos termos de energia (1200 kcal/dia) – o que, para muitas mulheres é muito restrita.
“Em uma dieta restritiva low carb, todo mundo vai perder peso. A dor diminuiu porque elas perderam peso. Então a sobrecarga é menor, mas isso em absoluto não significa que a low-carb é a melhor estratégia para tratar o lipedema. Precisamos focar em uma alimentação com padrão anti-inflamatório, que é o objetivo maior quando falamos de paciente com lipedema”, continua a médica.
O quadro de lipedema, frequentemente confundido com obesidade, celulite e inchaço, quando não tratado, pode levar a dificuldades de locomoção, linfedema, disfunções circulatórias, como insuficiência venosa, e até problemas ortopédicos nos joelhos, seja pela sobrecarga ou alteração da própria articulação. Apesar de ter sido descrito há mais de 80 anos, foi só em 2022 que o lipedema foi padronizado como doença, passando a fazer parte da Classificação Internacional de Doenças (CID).
Segundo a cirurgiã, a adoção de uma alimentação anti-inflamatória e a prática regular de atividade física, além de algumas mudanças no estilo de vida, impactam no tratamento da doença, trazendo bons resultados para melhora clínica da paciente. Medicamentos e uso de meias de compressão também fazem parte da recomendação.
Apesar de ser uma doença crônica, isto é, sem cura, o lipedema pode ser controlado quando devidamente abordado, segundo a médica. “Um bom tratamento de lipedema começa pelo cirurgião vascular, mas o acompanhamento com nutricionista, fisioterapeuta e, eventualmente, ortopedistas e cirurgiões plásticos também é fundamental”, diz a médica.
“É essencial buscar ajuda especializada, pois a dieta low-carb, além de restringir o consumo de fibras e poder piorar a saúde do intestino, pode ser high-fat (alta em gordura) e dependendo do tipo de gordura consumida, principalmente no caso da saturada, pode ocorrer um aumento da inflamação", finaliza Lamaita.
Tatiana Pronin
Jornalista e editora do site Doutor Jairo, cobre ciência e saúde há mais de 20 anos, com forte interesse em saúde mental e ciências do comportamento. Vive em NY. Twitter: @tatianapronin