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Para a saúde cerebral, tudo bem ser atleta de fim de semana

Muita gente não consegue fazer exercício durante a semana, mas capricha nos sábados e domingos - iStock
Muita gente não consegue fazer exercício durante a semana, mas capricha nos sábados e domingos - iStock

Pesquisadores têm mostrado crescente interesse no fenômeno dos “atletas de fim de semana”, aquelas pessoas que concentram a maior parte de sua atividade física em apenas um ou dois dias da semana.

Seja devido ao trabalho ou a responsabilidades familiares, muita gente não consegue fazer exercício durante a semana, mas capricha nos sábados e domingos. Mas será que é possível obter os mesmos benefícios à saúde ao concentrar a atividade física dessa forma? Segundo diversos estudos, a resposta é sim, pelo menos no que se refere à saúde cerebral.

Menor risco de declínio cognitivo e demência

Uma nova pesquisa publicada em 29 de outubro no periódico British Journal of Sports Medicine descobriu que apenas uma ou duas sessões de exercício durante o fim de semana podem reduzir o risco de declínio cognitivo e demência. Os resultados entre os “atletas de fim de semana” foram semelhantes aos de pessoas que se exercitavam ao longo da semana.

O estudo observacional incluiu dados de uma pesquisa mexicana de 1998 a 2004, e de 2015 a 2019. A análise incluiu cerca de 10.033 pessoas com idade média de 51 anos, entre elas:
- 7.945 que relataram não se exercitar;
- 1.362 que se exercitavam várias vezes por semana;
- 726 que se exercitavam apenas nos fins de semana.

Durante um período de monitoramento de 16 anos, os pesquisadores identificaram 2.400 casos de comprometimento cognitivo leve (CCL), que frequentemente precede a demência. Entre os que não se exercitavam, a prevalência de CCL foi de 26%, comparada a 18,8% entre os fisicamente ativos e 14% entre os guardiões do fim de semana.

Efeitos sobre a saúde cerebral 

Embora sejam necessários estudos mais rigorosos para confirmar o efeito protetor do exercício sobre a saúde cerebral, os pesquisadores sugerem algumas explicações possíveis.

Uma delas é que o exercício pode aumentar as concentrações do fator neurotrófico derivado do cérebro [moléculas que apoiam o crescimento e a sobrevivência dos neurônios] e a plasticidade cerebral. A atividade física também está associada a um maior volume cerebral, melhor função executiva e maior capacidade de memória.

Os resultados sugerem que, do ponto de vista da saúde, o corpo pode não distinguir entre exercício diário ou atividade mais esporádica, desde que as recomendações semanais de atividade física sejam atendidas: pelo menos 150 minutos de atividade de intensidade moderada por semana.

“É realmente sobre o volume, não o padrão”, disse o médico Shaan Khurshid, do Massachusetts General Hospital, nos EUA, ao site Healthline. Khurshid não participou do estudo, mas publicou pesquisas sobre atletas de fim de semana e doenças cardiovasculares.

AVC, Parkinson, depressão e ansiedade

Enquanto estudos anteriores focaram em resultados como saúde cardiovascular e mortalidade, outro estudo recente, publicado na Nature Aging, concentrou-se nos benefícios para a saúde cerebral, incluindo riscos reduzidos para condições neurológicas como doença de Parkinson e condições de saúde mental como ansiedade e depressão.

Em todo o espectro de condições de saúde cerebral, os atletas de fim de semana mostraram benefícios semelhantes aos de uma rotina de exercícios tradicional, em comparação aos indivíduos inativos.

Esse estudo envolveu mais de 75.000 participantes com informações de saúde e estilo de vida disponíveis pelo banco de dados UK Biobank, do Reino Unido. Os participantes tinham, em média, 61 anos de idade, e cerca de 55% do grupo era composto por mulheres.

Embora alguns estudos sobre atletas de fim de semana tenham se baseado em dados autorrelatados, que tendem a ser menos confiáveis, os pesquisadores usaram dados de acelerômetros (rastreadores de atividade) para determinar os padrões semanais de exercício dos participantes.

Os pesquisadores subdividiram os participantes em três grupos com base nos padrões de exercício:
- Inativo: menos de 150 minutos semanais de atividade física moderada a vigorosa.
- Regularmente ativo: 150 minutos ou mais de atividade física moderada a vigorosa por semana.
- Atletas de fim de semana: 150 minutos ou mais de atividade física moderada a vigorosa por semana, concentrando mais da metade dessa atividade em um ou dois dias.

É importante notar que, embora a expressão “atleta de fim de semana” seja usada, a atividade física não precisa ocorrer necessariamente nos fins de semana. Pode ser apenas concentrada em algunas dias da semana. Esse grupo representou a maior proporção, cerca de 40% dos participantes.

Os pesquisadores dividiram a saúde cerebral em condições neurológicas e psicológicas. O grupo neurológico incluiu doenças de Parkinson, AVC e demência. As condições psicológicas incluíram depressão, ansiedade e transtorno bipolar.

Após mais de oito anos de acompanhamento, o grupo de atletras de fim de semana apresentou redução de risco comparável ao grupo regularmente ativo em todo o espectro de saúde cerebral. O transtorno bipolar foi uma exceção e não demonstrou associação significativa com padrões de atividade física.

Após ajustar para fatores de saúde e estilo de vida, os níveis de redução de risco para condições específicas entre os atletas de fim de semana foram significativos em todas as condições:
- demência: 23%
- AVC: 13%
- doença de Parkinson: 49%
- depressão: 26%
- ansiedade: 28%

Lado ruim de ser atleta de fim de semana

Para quem não consegue se exercitar várias vezes ao longo da semana, os resultados desses estudos são animadores. No entanto, para obter ainda mais benefícios, inclusive no que se refere à longevidade, o ideal é que as pessoas gradualmente aumentem suas atividades para 300 minutos por semana. Nesse caso, é melhor nem tentar concentrar tudo só em dois dias. 

Outra questão importante, destacada por especialistas, é que concentrar a atividade física em um curto período pode aumentar o risco de lesões. Por isso é importante ter orientação adequada.

Tatiana Pronin

Tatiana Pronin

Jornalista e editora do site Doutor Jairo, cobre ciência e saúde há mais de 20 anos, com forte interesse em saúde mental e ciências do comportamento. Vive em NY. Twitter: @tatianapronin