Relatório alerta que impacto da Covid-19 será duradouro, já que o problema já existia
Redação Publicado em 05/10/2021, às 14h30
Um em cada cinco jovens de 15 a 24 anos diz que, muitas vezes, se sente deprimido ou tem pouco interesse em fazer coisas. É o que mostra pesquisa da Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância) e do Gallup, que inclui o Brasil, cuja prévia foi divulgada em um relatório apresentado nesta terça-feira (5). Segundo o documento, o impacto da Covid-19 na saúde mental dos jovens ainda vai durar muitos anos, já que a pandemia foi apenas o agravante de um problema antigo.
Estima-se que mais de um a cada sete jovens de 10 a 19 anos de idade conviva com algum transtorno mental diagnosticado. Aproximadamente 46 mil adolescentes morrem por suicídio a cada ano, condição que está entre as cinco principais causas de morte nessa faixa etária.
Mas há muitas lacunas entre as necessidades dessa população e o financiamento de políticas voltadas a essa área, segundo o relatório “Situação Mundial da Infância 2021: Na minha mente: promovendo, protegendo e cuidado da saúde mental das crianças”.
De acordo com a diretora executiva do Unicef Henrietta Fore, o impacto do isolamento social e da distância das salas de aula é significativo, mas é apenas “a ponta do iceberg”, uma vez que problemas de saúde mental não resolvidos já eram uma sobrecarga. Ela critica a falta de atenção dos governos ao problema:
Muito pouco investimento está sendo feito pelos governos para atender a essas necessidades críticas. Não está sendo dada importância suficiente à relação entre a saúde mental e os resultados futuros na vida”.
O relatório informa que, globalmente, cerca de uma em cada sete crianças foi diretamente afetada por lockdowns, enquanto mais de 1,6 bilhão de crianças sofreram alguma perda relacionada à educação.
A ruptura nas rotinas, na educação, e a preocupação com a renda familiar e com a saúde estão deixando muitos jovens com medo, irritados e preocupados com seu futuro. O Unicef inclusive cita uma pesquisa online na China no início de 2020, segundo a qual cerca de um terço dos entrevistados relatou sentir medo ou ansiedade.
Entre os transtornos mentais diagnosticados, pode-se citar transtorno do déficit de atenção com hiperatividade (TDAH), ansiedade, autismo, transtorno bipolar, transtorno de conduta, depressão, transtornos alimentares, deficiência intelectual e esquizofrenia. Todos eles podem prejudicar significativamente a saúde, a educação, as conquistas e a capacidade financeira de crianças, adolescentes e jovens no futuro.
Uma análise da London School of Economics, incluída no relatório, estima que transtornos mentais que levam jovens à incapacidade ou à morte acarretam uma redução de contribuições para as economias de quase 390 bilhões de dólares por ano.
Confira:
Segundo o relatório, uma mistura de fatores genéticos, de experiência e ambientais desde os primeiros dias de vida, incluindo parentalidade, escolaridade, qualidade dos relacionamentos, exposição a violência ou abuso, discriminação, pobreza, crises humanitárias e emergências de saúde (como a própria Covid-19), molda e afeta a saúde mental das crianças ao longo da vida.
O relatório observa que há fatores capazes de proteger os pequenos do risco de transtornos mentais, como cuidadores amorosos, ambientes escolares seguros e relacionamentos positivos com colegas. Porém, “barreiras significativas, incluindo estigma e falta de financiamento, estão impedindo que muitas crianças tenham uma saúde mental positiva ou estejam acessando o apoio de que precisam.”
Para que atenuar o problema, o relatório Situação Mundial da Infância 2021 faz as seguintes sugestões a governos e parceiros dos setores público e privado:
- Investimento urgente em saúde mental de crianças e adolescentes em todos os setores, não apenas na saúde, para apoiar uma abordagem intersetorial, incluindo toda a sociedade para prevenção, promoção e cuidados.
- Investimento em serviços públicos de qualidade - integração e ampliação de intervenções baseadas em evidências nos setores de saúde, educação e proteção social - incluindo programas parentais que promovem cuidados responsivos e de atenção integral, e garantia de que as escolas apoiem a saúde mental por meio de serviços de qualidade e relacionamentos positivos.
- Preparar pais, familiares, cuidadores e educadores para abordar o tema da saúde mental como parte da saúde integral.
- Quebrar do silêncio em torno da saúde mental, fomentar a cultura da escuta sem julgamentos (escuta empática) promovendo uma melhor compreensão da saúde mental e levando a sério as experiências de crianças, adolescentes e jovens.
- Valorizar a rede de apoio entre pares - promovendo e valorizando esse diálogo entre os próprios adolescentes sobre saúde mental.
A saúde mental faz parte da saúde física - não podemos continuar a vê-la de outra forma. Por muito tempo, em países ricos e pobres, temos visto muito pouco entendimento e muito pouco investimento em um elemento crítico para maximizar o potencial de cada criança. Isso precisa mudar", diz Fore.
O Unicef lançou, no Brasil, o “Pode Falar”, um canal de ajuda virtual em saúde mental e bem-estar para adolescentes e jovens de 13 a 24 anos. O projeto foi criado em parceria com diversas organizações da sociedade civil e empresas com expertise na área, e funciona de forma anônima e gratuita por meio de um chatbot que pode ser acessado no site podefalar.org.br .
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