Redação Publicado em 08/04/2025, às 10h00
Você já imaginou se existisse uma vacina capaz de reduzir ou adiar o risco de uma pessoa desenvolver demência? Todo mundo iria querer tomar, certo? Pois pesquisadores encontraram evidências de que a vacinação contra herpes-zóster, já aprovada para adultos, pode ter esse benefício extra.
Registros de saúde de mais de 280 mil idosos galeses revelaram que aqueles que receberam uma vacina contra herpes-zóster chamada Zostavax tinham 20% menos chance de serem diagnosticados com demência nos sete anos seguintes, em comparação com os que não foram vacinados.
O pesquisador Pascal Geldsetzer, da Universidade de Stanford, disse: “Pela primeira vez, podemos afirmar com muito mais confiança que a vacina contra herpes-zóster causa uma redução no risco de demência. Se esse efeito for realmente causal, temos uma descoberta de importância tremenda.”
Os pesquisadores aproveitaram a campanha de vacinação que ocorreu no País de Gales há mais de uma década. A política de saúde pública determinava que, a partir de 1º de setembro de 2013, pessoas nascidas em ou após 2 de setembro de 1933 estariam elegíveis para receber a vacina Zostavax, enquanto os mais velhos ficariam de fora.
Essa política criou um “experimento natural”, no qual a população idosa foi dividida em dois grupos, com base no acesso à vacina. Isso permitiu aos pesquisadores comparar as taxas de demência entre pessoas idosas nascidas com poucas semanas de diferença, mas em lados opostos da linha de elegibilidade.
Após considerarem o fato de que nem todos os elegíveis tomaram a vacina, os pesquisadores descobriram que a vacinação levou a uma redução de 20% no risco de demência, com o efeito mais forte observado em mulheres. Para Anupam Jena, professor de política de saúde da Faculdade de Medicina de Harvard, as implicações são profundas.
Uma em cada três pessoas desenvolverá demência ao longo da vida, e embora medicamentos que retardam a progressão da doença tenham sido recentemente aprovados, ainda não existe cura.
Quando uma pessoa contrai catapora, o vírus permanece dormente nas células nervosas por toda a vida. Com o envelhecimento do sistema imunológico, ou em indivíduos imunocomprometidos, o vírus pode se reativar e causar herpes-zóster.
O estudo, publicado na revista Nature, não é a primeira indicação de que vacinas contra herpes-zóster possam oferecer proteção contra a demência. Quando o Zostavax foi lançado nos EUA em 2006, vários estudos identificaram taxas menores de demência entre os vacinados.
No ano passado, pesquisadores de Oxford relataram um efeito protetor ainda mais forte com o uso do Shingrix, uma vacina mais recente. Geldsetzer agora busca financiamento de fundações privadas e filantrópicas para realizar um ensaio clínico randomizado que confirme os benefícios.
Ainda não está claro como as vacinas contra herpes-zóster poderiam proteger contra a demência, mas uma teoria é que elas reduzem a inflamação no sistema nervoso ao evitar a reativação do vírus. Outra hipótese é que as vacinas induzem mudanças mais amplas no sistema imunológico que são protetoras. Esses efeitos amplos são observados com mais frequência em mulheres, o que pode explicar as diferenças de gênero encontradas no estudo.
Julia Dudley, chefe de pesquisa da Alzheimer’s Research UK, no Reino Unido, disse que o estudo fortalece a relação emergente entre a vacinação contra herpes-zóster e a redução do risco de demência. “Embora estudos anteriores tenham sugerido uma associação, esta pesquisa oferece evidências mais fortes de uma ligação direta, com benefícios maiores observados em mulheres.”
“Ainda não está claro exatamente como a vacina contra herpes-zóster pode influenciar o risco de demência. Pode ser que reduza a inflamação, fortaleça o sistema imunológico de forma a proteger o cérebro, ou envolva outros mecanismos. É importante notar que o estudo analisou a vacina Zostavax, e não a Shingrix, que atualmente é mais amplamente utilizada.”
“Entender melhor essa ligação, incluindo as razões das diferenças entre homens e mulheres, pode abrir novos caminhos para a prevenção e o tratamento da demência”, disse ela.
Maxime Taquet, cujo estudo em Oxford encontrou uma redução no risco de demência após a vacinação com Shingrix, disse que os adjuvantes presentes nessa vacina — que tornam a resposta imunológica mais potente — podem ter um papel importante.
Ambos os estudos “fornecem forte apoio à hipótese de que a vacinação contra herpes-zóster reduz o risco de demência, sendo que a nova vacina recombinante oferece proteção superior”, afirmou. “A grande questão é se essa proteção aprimorada se deve à melhor prevenção do herpes-zóster ou aos efeitos imunológicos dos adjuvantes.”
Fontes: Universidade de Stanford e The Guardian