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Você ataca a geladeira de madrugada? Isso pode ser doença

A síndrome do comer noturno é diferente do sonambulismo e também da compulsão alimentar - iStock
A síndrome do comer noturno é diferente do sonambulismo e também da compulsão alimentar - iStock

Leo Fávaro* Publicado em 19/04/2022, às 10h00

De acordo com dados da OMS, 4,7% dos brasileiros apresenta algum transtorno alimentar. Uma dessas condições psiquiátricas é a síndrome do comer noturno (ou SCN), que é caracterizada por episódios recorrentes de ingestão de alimentos à noite depois do jantar ou da ceia, ou por meio do despertar do sono para comer.

Em geral, na raiz do problema está uma situação estressante que, por sua vez, causa alterações do ciclo circadiano, uma espécie de relógio biológico que controla os períodos de sono e de vigília e os hormônios liberados em cada uma dessas fases do dia. Com isso, algumas pessoas podem apresentar um “padrão de fome” diferente do usual, que é maior à noite ou de madrugada e as refeições podem corresponder de 25% a 50% da dieta diária.

Diferente do sonambulismo

Quem tem a síndrome sente grande necessidade de comer naquela parte do dia, a ponto de sentir que não conseguirá dormir se não fizer uma refeição “extra”. As comidas ingeridas, em geral, são lanches ou outros alimentos que estejam disponíveis. Diferente de condições associadas ao sonambulismo, pessoas com SCN têm consciência de que estão se alimentando naquele horário e também lembram-se disso no dia seguinte. Assim, apresentam sofrimento significativo (tristeza, melancolia, angústia) e/ou prejuízo funcional no desempenho de suas atividades, como comprometimento profissional ou escolar. Além disso, também pode haver ganho de peso, alteração do humor e dos hábitos intestinais. 

Para ser considerada síndrome do comer noturno, os episódios de alimentação noturna não ocorrem ou não são justificados por influências externas. Não há, por exemplo, mudanças no horário em que a pessoa vai dormir, como também não estão presentes hábitos culturais, sociais ou religiosos que levam a pessoa tanto a comer à noite quanto a mudar a rotina alimentar. Não há ainda um consenso entre os especialistas sobre a frequência com a qual ocorrem os episódios, mas considera-se SNC quando a urgência alimentar noturna ocorre pelo menos uma vez por noite e se estabelece por pelo menos três meses.

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Não é o mesmo que compulsão alimentar

Além disso, considerar a hipótese de SNC exige a exclusão de outros transtornos que podem causar o padrão desordenado de alimentação. O transtorno de compulsão alimentar, ou "comer compulsivo", por exemplo, pode ser confundido com a SNC. Contudo, enquanto no primeiro há alteração na dieta por meio da ingestão de quantidade excessiva de comida numa refeição regular (como almoço ou jantar) e sensação de perda de controle, na SNC há uma alimentação “extra”, necessariamente à noite ou de madrugada, feita após o que seria a última refeição do dia ou durante a madrugada, com despertar do sono para comer.

No comer noturno não se leva em conta necessariamente a quantidade de alimento ingerido, mas a necessidade de satisfazer a urgência alimentar. A SNC também não é considerada quando há outros problemas de saúde que justifiquem essas mudanças, ou quando estas são relacionadas à ingestão de medicamentos ou outras substâncias.

Outro sinal típico de SNC é anorexia matinal: como o ritmo circadiano está atrasado, a fome pela manhã é reduzida, não sendo incomum pular as refeições da primeira parte do dia. Isso acontece pelo menos quatro vezes na semana. Além disso, alterações na qualidade do sono, como dificuldade para dormir ou insônia, também podem indicar alguma relação com o problema. As alterações do humor acontecem ao longo de todo o dia, mas à noite, perto de quando acontecem os episódios de urgência alimentar, eles podem ser mais evidentes, com reações de ansiedade ou de tristeza.

Como tratar

Pessoas com síndrome do comer noturno devem ser avaliadas por médico, como psiquiatra ou médico do sono, para entender as causas e tratá-las adequadamente. Para isso, o especialista pode lançar mão de medicamentos, como antidepressivos inibidores seletivos de recaptação de serotonina, e de medidas para reduzir o estresse, se ele estiver associado à causa do problema. Além disso, o acompanhamento com psicólogo pode ajudar a lidar com as questões relacionadas ao transtorno e também com o estresse, melhorando a qualidade de vida. O apoio de nutricionista reforça o tratamento, elaborando uma dieta equilibrada conforme as necessidades específicas de cada um.

O Instituto Persono disponibiliza em seu site um teste para avaliar se você tem ou não SNC. Para acessá-lo, basta clicar neste link. O resultado do teste não exclui a necessidade de avaliação por um médico.

*Leo Fávaro é acadêmico de Medicina da Universidade Federal do Espírito Santo

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