Conforme o país envelhece, essa função familiar ganha diferentes nuances
Emily Schuler* Publicado em 20/08/2021, às 17h13
Quando imaginamos bisavós parece que logo nos vem à mente pessoas com idade muito avançada, possivelmente cabelos brancos e algumas ruguinhas, sentada numa bela cadeira de balanço, contando suas histórias e aventuras de vida. Considerando que o mundo está envelhecendo e que o Brasil segue esta tendência a passos largos, com números que crescem rapidamente, podemos muito bem imaginar que o Brasil também tem bisavós? Observa-se que a confluência da queda da taxa de mortalidade e consequente aumento na expectativa de vida, aliados aos avanços nos serviços de saúde e políticas públicas, inauguram a possibilidade de envelhecer cada vez mais no país.
O termo “bisavosidade” traduzido do inglês “great-grandparenthood” parece englobar o ser bisavós em suas diversas nuances. É interessante que ao brincarmos com o termo em português “bisavó-idade”, a palavra em si envolve a “idade”.
Nosso país mostra que não há momento certo para sermos bisavós. No contexto brasileiro, o papel não está necessariamente ligado a uma idade cronológica e pode ser desempenhado na velhice, ou antes. Também podemos pensar que os bisavós seriam talvez “mais que avós” (Rabinovich et al. 2014), tal como um prolongamento ou uma repetição do seu papel, como quando em uma apresentação musical o público pede bis. Como a palavra significa um pedido de repetição, por exemplo, de uma música, os bisavós são denominados popularmente avós duas vezes.
Isso indica que as tarefas que eles irão desempenhar dependerão de diversos fatores, tais como sua saúde física, mental, estrutura e necessidades familiares.
O estudo desenvolvido com os “bisas” aponta que eles apreciam finalmente ter tempo para fazer o que gostariam de ter feito com seus filhos e netos, isto é, brincar, conversar e simplesmente curtir a vida. Hoje se observa que o relacionamento entre bisavós e bisnetos se assemelha à antiga relação avós-netos, envolvendo um papel mais de cunho emocional e lúdico já que recai sobre eles certa responsabilidade parental.
Mesmo sabendo que há bisavós que criam seus bisnetos e ainda são chefes de seus lares, são necessárias mais pesquisas sobre esse papel. Nesse sentido, nota-se que devemos falar de bisavosidades (no plural), uma vez que o ser bisavós aparece no contexto brasileiro com diferentes matizes, tarefas e funções desempenhadas na família multigeracional.
Apesar das diversas formas de viver esse período da vida, o sentimento de continuidade da família parece ser algo comum a todas. A possibilidade de transcender à sua própria geração e ver algo de si continuar como legado. Por terem vivido mais idades que seus bisnetos, os bisavós ocupam um lugar especial de sabedoria que não necessariamente se encontra em livros, mas em experiências de vida que constituem um legado geracional.
Ainda há muito a ser explorado sobre a temática no contexto brasileiro e seu papel nas famílias que aguardam pesquisas sistemáticas sobre essa geração. Como disse um bisavô de 95 anos participante de uma pesquisa: “Quem sabe posso deixar algumas memórias nesses meninos!”
Sobre a autora:
*Emily Schuler é Doutoranda do Programa de Pós-graduação em Psicologia Clínica da Universidade Católica de Pernambuco (Unicap) com Bolsa Capes. No momento, está em período de sanduíche no Oxford Institute of Population Ageing na Universidade de Oxford. Possui Mestrado e Bacherelado em Psicologia Clínica pela Unicap. Atua na área de pesquisa de envelhecimento, família, intergeracionalidade e transgeracionalidade.
schuler.mily@gmail.com
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