Marcello Barduco* Publicado em 23/11/2021, às 10h00
O coração é um órgão que trabalha incessantemente durante toda nossa vida. Com a função de bombear o sangue a todos os outros órgãos, funciona de forma automática, com um ritmo que varia conforme as necessidades do organismo. A frequência de batimentos varia dependendo do momento: no sono, ela é mais baixa, enquanto na atividade física a pulsação aumenta.
Para que isso funcione de forma adequada, o coração possui um "marcapasso natural" e um sistema de condução do estímulo elétrico que distribui de forma adequada esse estímulo por todo o músculo cardíaco, fazendo com que ele se contraia de forma efetiva (figura 1).
Situações que comprometam o funcionamento deste sistema de estímulo elétrico são chamadas de arritmias, e parte delas têm como melhor opção de tratamento o implante de um marcapasso cardíaco artificial. Este instrumento vem sendo desenvolvido cada vez mais com tecnologias avançadas e se aproximando muito da fisiologia normal do órgão, ou seja, funcionando como o coração normal.
Temos dois tipos, basicamente: aqueles que estimulam o coração quando a frequência cardíaca está muito baixa e os que interrompem uma arritmia cardíaca rápida, que por ter a frequência muito alta (muitas vezes acima de 200 bpm) comprometem a ejeção do sangue. Esses últimos são chamados de CDIs (cardiodesfribriladores implantáveis).
Confira:
Quais são as dúvidas mais frequentes sobre marcapasso? Citaremos algumas:
1. Marcapasso trata todo tipo de arritmia?
Mito. As indicações de marcapasso são específicas. Muitas arritmias podem ser tratadas com medicamentos. Quando esses são insuficientes para resolver o problema, os dispositivos devem ser considerados.
2. O implante de um marcapasso é sempre uma cirurgia cardíaca complexa?
Mito. Os eletrodos (fios) que conduzem o estímulo elétrico são implantados através de uma punção em uma veia calibrosa e posicionados no músculo cardíaco através da visualização por filmagem com Raio-X. O gerador normalmente é posicionado embaixo da pele, no tórax, próximo aos ombros. O cirurgião não precisa abrir o peito para implantar o sistema todo do marcapasso (figura 2).
3. Após o implante do marcapasso é necessário ficar internado?
Verdade. Em média se observa o paciente sob internação hospitalar de 24 a 48 h após o implante, se tudo vai bem. Analgésicos simples e gelo no local do implante costumam controlar a dor local.
4. Após o implante, é necessário algum tempo sem atividade física?
Verdade. A cicatrização do local onde foi colocado o aparelho gerador de estímulos, que tem a dimensão de uma caixa de fósforos, mas muito menos espessa, demora algum tempo. A formação da "loja" em que o marcapasso vai ficar demora no mínimo 30 dias. Este é o período mínimo preconizado de repouso do membro superior do lado em que foi colocado o gerador. Após este tempo podemos voltar a ter atividades como conduzir automóveis, carregar peso, sem restrições. Cuidados contra traumas no local do implante devem sempre ser adotados.
5. Meu coração fica totalmente dependente do marcapasso depois que eu sou submetido ao implante?
Depende. Para algumas doenças mais avançadas, isto pode acontecer. Para outras, intermitentes, pode ocorrer do dispositivo permanecer em "espera", ou seja, ele monitora os batimentos naturais do coração e, no momento em que existe uma "falha" da pulsação, o marcapasso passa a estimular o coração.
6. Quem tem marcapasso não pode entrar em bancos ou em lugares que possuem detector de metais?
Verdade parcial. É verdade que os detectores de metais "percebem" o marcapasso e podem bloquear a entrada. Comunicar aos responsáveis pelo sistema de detecção o implante e pedir para que portas alternativas sejam abertas resolve o problema.
7. Passar por campo magnético desregula o marcapasso?
Verdade. Quando o marcapasso é submetido a um local magnetizado, sua programação determinada pelo médico deixa de funcionar. O estimulador passa a funcionar com sua programação original de fábrica. Porém, este é um efeito passageiro. Assim que o portador de marcapasso sai do campo magnético, ele restaura a programação ajustada pelo médico. Desta forma, evitar campos magnéticos é interessante.
8. Como portador de marcapasso, posso utilizar forno de micro-ondas ou celular?
Verdade. Não há restrições, mas cuidados. Uma vez ativado o micro-ondas, é interessante evitar ficar muito próximo do mesmo. Ao falar ao celular, o ideal é utilizá-lo do lado oposto ao implante do marcapasso. Isso se deve ao princípio de campo magnético. Esses aparelhos podem criar um campo magnético que atrapalha o funcionamento do implante, da mesma forma que a porta do banco.
9. É preciso evitar viagens longas após ter implantado o marcapasso, verdade?
Mito. Desde que suas condições clínicas avaliadas pelo seu médico mostrem que você está bem e seu aparelho está ok, não há restrições a viagens. Levar a identificação de que se trata de portador de marcapasso, com suas características e o nome é contato do médico responsável é interessante.
10. Não é possível realizar alguns exames, como ressonância magnética, em portadores de marcapasso, certo?
Verdade. Como o aparelho e os eletrodos são de metal, pode haver contraindicação para a ressonância. Alguns aparelhos mais modernos já são compatíveis com a realização deste exame. Sempre se informe com seu médico antes de se submeter a este tipo de exame.
11. O marcapasso tem vida útil?
Verdade. A bateria do marcapasso dura acima de cinco anos e, dependendo da necessidade de estímulos durante seu uso, ela pode se esgotar após este período. Caso isso ocorra, basta trocar o gerador de marcapasso, procedimento mais simples que a primeira passagem.
12. Colocado o marcapasso, não há como regulá-lo, ele vai sempre funcionar da mesma forma, certo?
Mito. Os marcapassos têm um sistema de ajuste que se dá por ondas eletromagnéticas, que determina a maneira como vai atuar. A cada visita ao médico, o dispositivo pode ser avaliado e ajustado. Por isso é importante o acompanhamento médico depois de seu implante.
13. Tenho marcapasso e devo ser submetido a uma cirurgia. Preciso de algum preparo diferente por conta do implante?
Verdade. Na maioria das cirurgias é utilizado o bisturi elétrico, que trabalha através de descargas elétricas para cortar ou estancar sangramentos. Essa corrente pode atrapalhar o funcionamento do marcapasso durante o ato operatório. Desta forma, deve-se reprogramar o dispositivo antes do procedimento para que ele fique “blindado” a essas descargas, voltando à programação anterior à operação através de nova regulagem quando a mesma terminar.
14. Tenho que me preocupar com choques elétricos se for portador de marcapasso?
Verdade. Dependendo da descarga elétrica que o portador de marcapasso for submetido poderá haver dano no sistema. É importante uma reavaliação imediata após o choque.
15. Quando a bateria do marcapasso está no fim, posso ter sintomas como desmaio por falha do aparelho – ele para de funcionar de repente?
Mito. O marcapasso tem uma garantia de fábrica, que determina o tempo mínimo de funcionamento da bateria. Muitas vezes o período de funcionamento é maior que o pré-estabelecido. Ao final da vida da bateria, quando o marcapasso é avaliado pelo médico, é informada sua durabilidade futura. Desta forma, pode-se programar a troca do gerador. É muito raro o dispositivo deixar de funcionar de repente por exaustão da bateria.
Estas são, certamente, as dúvidas mais comuns quanto ao marcapasso. Este recurso ganha, a cada dia, mais funções e se torna cada vez mais "inteligente". Conte com ele, caso haja indicação, sem receio. Sem dúvida, haverá um ganho importante de tempo e de qualidade de vida!
*Sobre o autor: Marcello Barduco
Cardiologista e Emergencista do Corpo Clínico do Hospital Sírio-Libanês.
Pós-graduado em Geriatria pelo IEP – Hospital Sírio-Libanês. Gestor do Pronto Atendimento no Hospital Santa Cruz (2004 a 2009). Membro do comitê de ética do Hospital Sírio-Libanês (desde 2014).Responsável técnico pela Clínica Barduco há 25 anos. Membro do Conselho Editorial da TREVOO (desde 2021).