Entenda os métodos contraceptivos para pessoas trans e não binárias

Os contraceptivos, como os geralmente comercializados para mulheres cis, também são indicados para essas populações

Patrícia Carvalho Publicado em 27/07/2021, às 13h41

As pessoas trans e não binárias que estão fazendo tratamento hormonal para afirmação de gênero também devem ser orientadas a se protegerem de gestação não desejada - iStock

Recentemente, tive vontade de escrever sobre o espaço das pessoas trans no consultório ginecológico - e foi então que ficou clara a falta de informação disponível sobre cuidados nessa população. Poucos sabem, mas métodos contraceptivos que geralmente são produzidos e comercializados para mulheres cis, devem e são indicados para a população trans e não binarie. 

As pessoas trans e não binárias que estão fazendo tratamento hormonal para afirmação de gênero também devem ser orientadas a se protegerem de gestação não desejada.

Uma vez que haja relação sexual envolvendo um pênis e uma vagina, independente das identidades de gênero, há a necessidade de contracepção. 

Pessoas com vagina 

As pessoas que receberam atribuição do sexo feminino ao nascimento, mas se identificam com o gênero masculino, e no momento estão sob hormonização com testosterona, recebem doses hormonais não suficientes para inibir por completo a ovulação. Devendo, portanto, ser escolhido um método hormonal ou não hormonal como forma de proteção. 

Métodos hormonais locais, como Sistema Intrauterino (SIU), são ótimas opções, pois, além da sua alta eficácia, têm uma grande chance de suspender a menstruação, sendo um potente aliado no combate à disforia de gênero. 

Para homens trans que não estão passando por hormonização, além do SIU, o uso de pílula também pode ser uma outra opção. É sempre muito importante consultar um ginecologista que saiba tratar dessas questões e que avalie os critérios de elegibilidade para cada caso. 

A hormonização por si só ou qualquer questão relacionada à identidade de gênero não são contraindicações do uso de métodos contraceptivos. 

Para quem, por alguma contraindicação prévia ou agravo de saúde, não pode utilizar métodos hormonais, a utilização de Dispositivos intrauterinos (DIU cobre ou prata) é uma boa alternativa. O ponto negativo é que esse método traz uma chance de sangramento uterino maior e, em caso de disforia relacionada à menstruação, não é a melhor escolha. Mas, para quem, com o uso da testosterona, obtém um cessar do fluxo menstrual, é possível o uso do DIU e, então, observar como vai ser a resposta de cada corpo. 

Pessoas com pênis 

Aquelas pessoas que ao nascimento lhes foram atribuídas definições de sexo masculino, ainda que passem por hormonização com estrógeno, a produção de espermatozoides não cessa por completo enquanto tiverem os testículos. Dessa forma, é importante atentar quanto ao uso de algum método contraceptivo escolhido naquela parceria caso seja uma relação envolvendo pênis e vagina. 

Pensando no preservativo como indicação para proteção de ISTs em todas as relações, a eleição desse método, nesses casos, também pode ser uma escolha. 

Manutenção da fertilidade 

Para além dessa discussão, quando falamos de contracepção, estamos falando de planejamento familiar e famílias diversas têm, sim, o direito de se planejar como todas as outras. 

É importante que, antes do início da hormonização, tudo isso seja discutido com a pessoa que deseja o tratamento. Existe quem retome a fertilidade após três a seis meses de interrupção do tratamento hormonal. 

Confira:

No entanto, ainda que faltem estudos mais robustos sobre o tema, observamos que homens trans ou pessoas não binárias que passaram muitos anos sob uso de testosterona podem ter sua capacidade de ovulação permanentemente cessada, assim como mulheres trans ou pessoas não binárias podem não produzir mais espermatozoides a partir de um longo tempo de uso crônico de estrogênio. 

Dessa forma, oferecer a essas pessoas a possibilidade de congelamento de óvulos, tecido ovariano ou espermatozoides, antes do início do tratamento, pode ser uma garantia de constituição familiar com filhos se essas pessoas, no futuro, desejarem

Infelizmente, não se trata de um procedimento corriqueiro ou coberto pelo plano de saúde, tampouco pelo SUS. E sabemos que por um alto custo agregado limita muito o acesso a grande parte das pessoas. 

Ter acesso a essas informações e opções de cuidado faz parte do direito integral à saúde. Procure um ginecologista que te oriente conforme as suas necessidades e características individuais. Poder escolher é, também, um direito seu. 

* Patrícia Carvalho - Ginecologista Obstetra - Unifesp/EPM

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