Bruno Branquinho* Publicado em 18/10/2021, às 10h00
Desde a década de 80, quando a epidemia do HIV surgiu, o debate e os estudos sobre o HIV e a Aids têm se aprofundado, focando principalmente em prevenção (como a camisinha e a PrEP - profilaxia pré-exposição - mais recentemente), e em tratamento e cura - é comum hoje vermos notícias em jornais e portais de notícias falando sobre pesquisas de vacinas e cura. Esses avanços são muito importantes e garantem esperança e uma significativa melhora na vida das pessoas que vivem com HIV, mas e a saúde mental dessas pessoas? Será que tem recebido a devida atenção?
Atualmente, realizando o acompanhamento médico e o tratamento de forma adequada, pessoas que vivem com HIV não desenvolvem a Aids, não transmitem o vírus e podem viver sem maiores restrições, com a mesma expectativa de vida média que o restante da população.
A saúde mental desses indivíduos, no entanto, é um ponto importantíssimo nessa discussão e recebe menor atenção do que deveria, trazendo algumas consequências graves para essas pessoas e sendo, talvez, um dos maiores desafios hoje em dia no atendimento e acompanhamento da pessoa que vive com HIV.
A saúde mental dos indivíduos é de fundamental importância quando pensamos no HIV e na Aids. Primeiramente, porque sofrer de algum transtorno mental grave (como transtorno bipolar, transtornos psicóticos, depressão recorrente, dependência química, entre outros) aumenta a chance da pessoa de contrair o vírus em 4 a 10 vezes. Isso se deve ao fato de que o transtorno mental pode fazer com que haja um aumento de comportamentos de risco e também pode interferir na adesão do indivíduo aos métodos de prevenção, como uso de camisinha e de PrEP.
Além disso, para as pessoas que já vivem com HIV, o tratamento em saúde mental também é imprescindível. Além de diminuir a qualidade de vida, problemas no campo da saúde mental, como já provado por diversas pesquisas, aumentam a chance de resultados negativos em cada etapa do cuidado da pessoa que vive com HIV, desde o diagnóstico mais tardio até maior dificuldade em conseguir atingir a carga viral indetectável no sangue, podendo aumentar inclusive a taxa de mortalidade dessas pessoas.
Confira:
Diversos estudos já mostram que as pessoas que vivem com HIV apresentam maiores taxas de prevalência de transtornos mentais que o restante da população, incluindo a depressão, os transtornos de ansiedade e o transtorno de uso de substâncias.
Isso se explica por diversos fatores biológicos, sociais e culturais, incluindo o estigma a que essa população é submetida. O preconceito em relação a pessoas que vivem com HIV, também chamado de sorofobia, causa impactos negativos importantes na saúde mental desses indivíduos, contribuindo para o desenvolvimento de transtornos mentais.
E por isso é importante a gente lembrar que falar da saúde mental de uma pessoa que vive com HIV não é apenas falar dos transtornos mentais e seus tratamentos. É também falar do estigma pelo qual ela passa todos os dias, da decisão de abrir ou não seu diagnóstico para seus parceiros, familiares e amigos, é lidar com o medo e a apreensão de possuir uma condição crônica e sem cura ainda, lidar com a culpa que muitas vezes essas pessoas carregam por terem contraído o vírus, entre muitas outras coisas.
Dessa forma, nosso papel, como profissionais de saúde, é duplo: reconhecer e acolher as questões de saúde mental das pessoas que vivem com HIV, garantindo um tratamento integral e adequado, e combater a sorofobia na sociedade como um todo, com informação e debate, para que as pessoas que vivem com HIV se sintam mais livres e tranquilas sem o peso do estigma sobre si.
*Bruno Branquinho é psiquiatra
Esta coluna não reflete, necessariamente, a opinião do Site Doutor Jairo