Uma pesquisa revela que realizar atos de bondade no dia a dia pode melhorar o bem-estar psicológico durante períodos desafiadores da vida, como a transição para a faculdade.
Pesquisas anteriores mostraram que estratégias focadas no autocuidado, como sono, nutrição, exercício e mindfulness, podem ser benéficas para estudantes que enfrentam dificuldades nesse período de transição.
No entanto, focar demais em si mesmo às vezes pode levar à ruminação e impactar negativamente a saúde mental.
Dado esse potencial efeito negativo do autocuidado, pesquisadores da Universidade Simon Fraser, no Canadá, buscaram investigar se estratégias focadas no outro, especificamente atos de bondade, poderiam proporcionar benefícios.
Estudos anteriores sugeriram que o comportamento pró-social pode aumentar a felicidade e o bem-estar, mas não estava claro se esses benefícios se manteriam durante fases mais estressantes na vida.
“Comecei a pesquisa nessa área porque estou profundamente interessada em como as pessoas enfrentam transições na vida”, comentou a autora do estudo Tiara Cash.
“Eu estava interessada em como a transição para a universidade poderia impactar o bem-estar dos alunos do primeiro ano e se as pessoas que ajudavam os outros durante esse momento crucial experimentavam um melhor bem-estar.”
O estudo, publicado no Social and Personality Psychology Compass, acompanhou 193 alunos do primeiro ano universitário ao longo de seis semanas, durante seu primeiro semestre.
A cada semana, os alunos completavam questionários que avaliavam seu bem-estar e documentavam seu envolvimento em várias tarefas diárias, com foco particular em comportamentos pró-sociais.
Os pesquisadores usaram uma lista detalhada de 47 ações pró-sociais comuns, como compartilhar anotações com um colega ou segurar a porta para alguém.
Os participantes relataram quais ações realizaram a cada semana e quantas vezes. O bem-estar foi medido usando várias escalas validadas, incluindo aquelas que avaliam felicidade, florescimento, prosperidade, resiliência, otimismo, ansiedade e solidão.
Os resultados do estudo revelaram que os novos alunos consistentemente realizaram comportamentos pró-sociais ao longo de seu primeiro semestre. Em média, os participantes relataram realizar aproximadamente sete tipos diferentes de atos pró-sociais a cada semana.
Os alunos relataram maior felicidade, prosperidade, florescimento, resiliência e otimismo, bem como níveis mais baixos de ansiedade e solidão, nas semanas em que realizaram mais atos de bondade.
Essas descobertas foram consistentes em várias medidas de bem-estar, sugerindo uma associação robusta entre comportamento pró-social e bem-estar psicológico.
“Nós medimos o bem-estar pessoal de sete maneiras diferentes em nosso estudo, e fiquei surpresa ao ver que as pessoas relataram se sentir mais positivas em todas elas nas semanas em que realizaram mais atos de bondade”, disse a pesquisadora ao site PsyPost.
Os efeitos positivos foram observados independentemente de os atos pró-sociais envolverem interação social ou serem mais solitários, indicando que ambos os tipos de bondade podem melhorar o bem-estar.
“Ajudar os outros pode ser uma maneira eficaz, embora muitas vezes negligenciada, de apoiar o seu bem-estar durante momentos desafiadores, como uma transição na vida”, disse Cash.
Em retrospecto, isso pode não ser surpreendente. Os humanos são uma espécie super-social, então estar em comunidade e ajudar aqueles em sua comunidade pode ser uma maneira de se sentir conectado e encontrar maior felicidade!”
Embora o estudo forneça evidências convincentes que ligam o comportamento pró-social a um bem-estar melhorado, ele tem algumas limitações. Primeiro, a natureza correlacional dos dados significa que a causalidade não pode ser estabelecida de forma definitiva. A própria pesquisadora está coletando dados para um novo estudo, a fim de determinar melhor a relação entre causa e efeito.
De qualquer forma, os resultados contribuem para um corpo crescente de evidências que sugerem que ajudar os outros pode ser uma estratégia poderosa para melhorar a felicidade pessoal e a resiliência, especialmente durante tempos de mudança e incerteza.
Dr. Jairo Bouer
Médico psiquiatra com formação na Faculdade de Medicina da USP (Universidade de São Paulo), biólogo pela UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina), e mestre em evolução humana e comportamento pela University College London, além de palestrante e escritor. Twitter: @JairoBouerDr