Redação Publicado em 05/08/2021, às 15h30
Um grupo de pesquisadores da NYU School of Global Public Health (Estados Unidos) desenvolveu um novo modelo matemático que, para prever surtos de doenças infecciosas, incorpora o sentimento do medo – tanto da vacina como da enfermidade em si – com objetivo de entender melhor como as pandemias podem ocorrer em múltiplas ondas,como as que estamos vendo com a Covid-19.
Através do modelo – que é uma representação ou interpretação simplificada da realidade e foi publicado no Journal of The Royal Society Interface – os autores explicaram que os comportamentos humanos, como o distanciamento social (que evita a disseminação da doença) e a recusa da vacina (que a promove), moldaram a dinâmica de epidemias por séculos. Entretanto, os modelos tradicionais têm ignorado como o medo impulsiona a conduta das pessoas nesses contextos.
De acordo com os pesquisadores, emoções como medo podem substituir um comportamento racional e provocar mudanças comportamentais desconstrutivas. Ou seja, o medo de uma doença contagiosa é capaz de mudar a atitude das pessoas, que podem adotar formas de se proteger, mas, à medida que o medo diminui, tendem a abandonar essas ações precocemente.
Por exemplo, o medo de se contaminar com a Covid-19 pode fazer com que pessoas saudáveis se isolem em suas casas e usem máscaras, evitando a propagação da doença. Entretanto, com a disseminação reduzida, o medo pode “evaporar”, levando-as a pararem de se isolar e usarem máscaras prematuramente quando ainda há muitas pessoas infectadas circulando. O resultado disso é a explosão de uma nova onda de infecções.
O mesmo acontece com a vacinação. O medo da Covid-19 motivou milhões de pessoas a terem o desejo de se vacinar. Porém, à medida que a imunização avança e diminui a propagação - e, com ela, o medo da doença - as pessoas podem temer a vacina mais do que a própria infecção, renunciando à vacinação e produzindo uma nova onda.
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“Contágio triplo” foi o nome dado ao modelo matemático desenvolvido no estudo e que acopla essas dinâmicas psicológicas ao desempenho da doença, descobrindo novos mecanismos comportamentais para a persistência de uma pandemia e suas sucessivas ondas de infecção.
Em outras palavras, a análise considerou, fora os fatores comportamentais, a taxa de transmissão da Covid-19, o percentual de população vacinada e o índice de vacinação. Além disso, o modelo reconhece que o medo não é estático, ou seja, ele pode se espalhar pela população como resultado da desinformação ou desaparecer com o tempo ou devido às notícias tranquilizantes.
Os autores explicam ainda que a neurociência sugere que o próprio medo pode ser contagioso, bem como tende a sumir ou diminuir ao longo do tempo. Assim, o “contágio triplo” mostra que as pessoas podem superar seus medos de doenças e vacinas, seja com a queda da prevalência ou da interação com outras pessoas que se recuperaram ou foram imunizadas.
O modelo também sugere que os dois tipos de medo evoluem e interagem de tal forma que acabam moldando o comportamento da população em relação ao distanciamento social, à taxa de vacinação e, consequentemente, ao relaxamento dessas atitudes. Essa dinâmica, portanto, pode ampliar ou acabar com a transmissão das doenças.
De acordo com os pesquisadores, se o medo da Covid-19 exceder o da vacina, ele pode estimular a imunização e, assim, eliminar o vírus. Entretanto, se as pessoas acharem que a vacina é mais “perigosa” que a doença – ou por serem céticas sobre a gravidade ou pela desinformação –, esse comportamento é capaz de gerar um novo ciclo de infecções.
Inclusive, cenários como esse podem ser observados nos Estados Unidos. À medida que milhões de estadunidenses foram vacinados, os casos registrados caíram. Em contrapartida, nas regiões com taxas mais baixas de vacinação, onde a variante Delta têm se espalhado rapidamente, o número de infectados está aumentando.
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