Atiradores em massa que mostram sinais de frustração sexual têm mais vítimas, em comparação com outros atiradores em massa, de acordo com uma nova pesquisa publicada no periódico Homicide Studies.
As descobertas trazem evidências de que a frustração sexual é um fator que contribui para a violência armada, e que esses criminosos diferem de outros atiradores em massa.
A motivação por trás do estudo foi investigar a relação entre frustração sexual e tiroteios em massa nos EUA. Eles se concentraram em crimes cometidos por homens involuntariamente celibatários, também chamados de “incels”. Embora a grande maioria dos incels não cometa atos violentos, os pesquisadores levantaram a hipótese de que a frustração sexual pode contribuir para um clima social que aumenta a probabilidade de assassinatos em massa.
“Assassinatos em massa cometidos por pessoas que afirmam ser involuntariamente celibatárias (ou seja, 'incels') receberam muita atenção nos últimos anos e parecem ser uma ameaça crescente”, explicaram os autores do estudo Adam Lankford, professor de criminologia na Universidade do Alabama, e Jason Silva, e professor assistente de justiça criminal na Universidade William Paterson.
“Como resultado, o Serviço Secreto dos EUA publicou um estudo de caso de 2021 sobre um homem que abriu fogo em um estúdio de ioga em Tallahassee, Flórida, e atirou em seis mulheres. Esse perpetrador se identificou com incel, reclamou do 'fardo da virgindade' masculina e tinha um histórico de má conduta sexual. Mas suspeitamos que o problema dos atiradores em massa sexualmente frustrados é muito mais extenso do que a maioria das pessoas imagina, então queríamos estudá-lo o mais rigorosamente possível”.
Para conduzir o estudo, os pesquisadores examinaram um banco de dados de atiradores em massa públicos nos EUA de 1966 a 2021, composto por 178 casos. Eles desenvolveram critérios para identificar atiradores que tinham problemas de frustração sexual, com base em indicadores como reclamações explícitas sobre frustração sexual, falha em encontrar um parceiro íntimo, solicitação de profissionais do sexo, perseguição ou assédio de parceiros desejados, e envolvimento em comportamentos sexuais ilegais ou inapropriados.
O estudo teve como objetivo responder a quatro questões principais de pesquisa. Primeiro, quão comuns são os problemas de frustração sexual entre atiradores em massa? Em segundo lugar, os atiradores em massa sexualmente frustrados têm um perfil diferente de outros atiradores em massa? Terceiro, atiradores em massa sexualmente frustrados se comportam de maneira diferente de outros atiradores em massa? E quarto, há uma diferença nas vítimas sexualmente frustradas que os atiradores em massa escolhem matar?
Os resultados do estudo revelaram que aproximadamente um terço dos atiradores em massa nos Estados Unidos tinha problemas de frustração sexual. Esses indivíduos exibiram vários indicadores de frustração sexual, como reclamações explícitas, perseguição, assédio, envolvimento em comportamentos sexuais ilegais e interesse por menores ou fetiches violentos. Atiradores em massa sexualmente frustrados tinham mais de seis vezes mais chances de ter um histórico de crimes sexuais e também tendiam a ter um desejo mais forte de fama.
“Ficamos surpresos ao descobrir que perpetradores sexualmente frustrados cometeram tantos dos tiroteios em massa mais mortíferos da história dos EUA, incluindo ataques em Columbine, Virginia Tech, Sandy Hook, Orlando, Las Vegas, Parkland e Uvalde. Esses casos já haviam sido estudados tão de perto que parecia difícil imaginar que houvesse algo novo a aprender”, disseram Lankford e Silva ao site PsyPost.
Os pesquisadores também descobriram que atiradores em massa sexualmente frustrados eram mais propensos a ser jovens, homens, solteiros, sem filhos, desempregados e misóginos em comparação com outros atiradores em massa. Eles exibiram comportamentos associados à busca de alívio, busca de poder, busca de vingança e frustração deslocada.
Em relação às vítimas, perpetradores sexualmente frustrados mataram mais vítimas totais em comparação com outros atiradores em massa. Eles também mataram uma proporção maior de vítimas do sexo feminino. Esta descoberta foi atribuída à sua misoginia, busca de poder e tendências de busca de vingança. Esses indivíduos também eram mais propensos a realizar ataques em escolas.
“Não existe um fator único que explique por que alguém comete um tiroteio em massa, mas a frustração sexual pode ajudar a explicar por que alguns homens que não estão lutando para sobreviver em nenhum sentido literal – eles não estão morrendo de fome, sem-teto ou desesperadamente pobres – estão tão insatisfeitos com suas vidas”, disseram os autores.
Há muitas coisas que as pessoas podem comprar para atender às suas necessidades, mas a satisfação sexual de longo prazo ou um relacionamento romântico significativo são mais difíceis de obter. Quando uma profunda frustração sexual é combinada com acesso a armas de fogo, problemas psicológicos, falta de empatia pelos outros e masculinidade tóxica, os riscos de violência em massa podem ser particularmente altos.”
As descobertas destacam a necessidade de pesquisas futuras para explorar mais o assunto, inclusive usando diferentes abordagens analíticas e incorporando medidas específicas de rejeição romântica. Pesquisas futuras também podem se concentrar em estratégias para reduzir a frustração sexual e seu impacto potencial nos índices de agressão e violência.
Os autores sugerem que a frustração sexual é muito mais complexa do que a maioria dos estudiosos reconheceu no passado, e pode ser experimentada até por pessoas sexualmente ativas. Segundo eles, também não é algo que depende de quanto tempo a pessoa ficou sem fazer sexo – é também algo psicológico e afetado pelas expectativas das pessoas, senso de direitos, adoção de normas de gênero saudáveis ou tóxicas e muito mais.
A frustração sexual é algo difícil de se medir, e a masturbação nem sempre é a solução. Para os autores, sempre que há uma lacuna entre o que as pessoas querem e o que elas têm, e isso pode criar insatisfação.
“Ser menos frustrado não significa necessariamente fazer mais sexo”, acrescentaram Lankford e Silva. “Se a sociedade pudesse fazer um progresso significativo na redução dos fatores tóxicos que levam alguns homens a supor que as mulheres são obrigadas a fazer sexo com eles, esses indivíduos poderiam ter expectativas mais realistas e, portanto, sentir-se menos frustrados.”
Também reconhecemos que os problemas de frustração sexual dos atiradores em massa podem interagir com outras variáveis difíceis de diferenciar, como seus desejos de amor e companheirismo ou suas experiências de rejeição ou isolamento”.
Tatiana Pronin
Jornalista e editora do site Doutor Jairo, cobre ciência e saúde há mais de 20 anos, com forte interesse em saúde mental e ciências do comportamento. Vive em NY. Twitter: @tatianapronin